Thursday, 28 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1316

>>Lição de (mau) jornalismo
>>Para ficar como está

Lição de (mau) jornalismo


Um interessante exercício para entender como funciona a imprensa, ou parte dela, é recortar notícias sobre um determinado tema e comparar sua evolução ao longo da semana ou de algumas semanas.


Nesta segunda-feira, dia 28, o jornal Valor Econômico publicou reportagem afirmando que 32% dos poços perfurados pela Petrobras na camada de pré-sal na Bacia de Santos são pouco viáveis.


Se fosse verdadeira, essa informação derrubaria todas as previsões otimistas divulgadas até o momento sobre o potencial das novas reservas brasileiras.


No longo prazo, se comprovado, tal fato deveria exigir uma mudança na estratégia nacional com relação ao petróleo.


No médio prazo, poderia afetar as projeções de crescimento da eocnomia brasileira.


E, no curto prazo, mesmo sem confirmação, a notícia derrubou o valor das ações da Petrobras.


Acontece que a notícia foi desmentida imediatamente pela Petrobras.


Os dados divulgados pela empresa no dia seguinte, terça-feira, afirmavam que, nos onze poços em que opera na região da Bacia de Santos, objeto da reportagem do Valor Econômico, houve 100% de sucesso. E que na área mais ampla do pré-sal, com 30 poços perfurados, revelou-se uma taxa positiva de 87%, dentro das expectativas mais otimistas que vinham sendo analisadas, dadas as dificuldades técnicas da exploração.


No intervalo entre a notícia negativa do Valor Econômico e o desmentido da Petrobras, a Bolsa de Valores oscilou fortemente, com repercussão na imprensa internacional.


Nesse período, o tema também foi motivo de especulações negativistas de analistas econômicos em emissoras de rádio e na televisão, com destaque para a Rádio CBN e a GloboNews.


Com rapidez impressionante, o esquema foi parar no Congresso Nacional, onde assessores parlamentares correram a preparar pronunciamentos sobre um suposto fracasso da Petrobras na exploração das reservas do pré-sal. 


Como se sabe, um dos principais confrontos entre as forças políticas do País se desenrola em torno da CPI da Petrobras.


Da mesma forma, sabe-se que um dos grandes obstáculos à consolidação do desenvolvimento econômico é a oscilação dos preços do mercado acionário, que afasta os investidores.


Nesta quarta-feira, o Valor Econômico, que pertence à Folha de S.Paulo e ao Grupo Globo, publica os dados corretos da Petrobras mas não reconhece erro ou má-fé, insistindo em que a taxa de sucesso no pré-sal não é de 100%.


Acontece que quase nunca é de 100% nos novos campos de exploração e existe muita controvérsia sobre o que seria uma taxa de sucesso aceitável no caso da camada de pré-sal.


A imprensa já divulgou avaliações de especialistas sobre a viabilidade de sucesso com uma taxa de 20% a 30% de poços produtivos, se o preço médio do barril de óleo não for inferior a 40 dólares.


O leitor continua sendo induzido a erro.


Para ficar como está


Luiz Egypto, editor do Observatório da Imprensa:


Está entrando areia na 1ª Conferência Nacional de Comunicação, prevista para ocorrer no início de dezembro deste ano. Anunciada com pompa e circunstância pelo presidente Lula em janeiro passado, durante o Fórum Social Mundial, em Belém (PA), a conferência mobilizou movimentos sociais ligados à luta pela democratização das comunicações, entidades empresariais preocupadas com seu futuro num cenário de intensa convergência digital, e áreas do governo às quais caberia a responsabilidade de formular políticas públicas de comunicação modernas e socialmente legitimadas.


O plano original, como nas outras conferências desse tipo, previa a convocação de encontros municipais, depois ampliados para reuniões regionais e, finalmente, a conferência propriamente dita, realizada durante três dias, em Brasília.


Ainda no primeiro semestre, foi definida uma verba de 8,2 milhões de reais para a realização do evento. Em maio, por restrições orçamentárias, esse montante caiu para 1,6 milhão de reais, o que na prática inviabilizaria a conferência. Um projeto de lei para recompor a dotação não havia sido apreciado até o início do recesso parlamentar. E agora o enrosco se dá na definição do regimento interno da conferência, processo no qual há um misto de boicote e intransigência por parte dos setores empresariais – que não querem nem ouvir falar em novos modelos regulatórios para o setor – e uma relativa inação do governo – leia-se ministério das Comunicações, Secretaria de Comunicação Social e Secretaria Geral da Presidência, incapazes de construir as condições políticas necessárias para a pronta definição do regimento. Uma reunião para esse fim, convocada para ontem, foi adiada para a semana que vem.


A ver no que tudo isso vai dar. Se não for realizada neste ano, só será possível pensar em nova conferência depois da posse do sucessor do presidente Lula. Enquanto isso, permanece como está a estrutura perversa em que se assenta a comunicação social no país.