Multinacional Brasil
A imprensa brasileira não fez as conexões devidas, mas a notícia de que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social vai financiar a produção de etanol na África cria um novo viés na onda de declarações de todo tipo contra o projeto dos biocombustíveis.
O anúncio feito em Acra na noite de segunda-feira teve grande repercussão na Suécia, destino do álcool combustível a ser produzido em Gana.
O governo sueco anunciou há poucos meses um plano de substituição da matriz de combustíveis até 2020, no qual o etanol cumpre um papel central.
A presença do BNDES na África representa não apenas a consolidação de um novo projeto de alternativas para o petróleo, mas também um sinal de que o governo não pretende repetir os erros do velho Proálcool.
Ao expandir e diversificar as fontes de produção, o governo cria condições para assegurar o fluxo de produção e dar confiabilidade aos consumidores e à indústria automotiva.
Ao licenciar em território nacional usinas de pequeno porte, estimula a competição e evita que o poder se concentre nas mãos dos grandes usineiros, como ocorreu com o Proálcool.
Outro aspecto importante da notícia, que não está destacado nos jornais, é o fato de o projeto etanol permitir ao Brasil estabelecer com a África relações de negócios de longo prazo, que inclui transferência de tecnologia – uma novidade no processo de desenvolvimento africano, até aqui baseado nas velhas práticas do colonialismo.
Além de Gana, outros cinco países africanos já iniciaram negociações com equipes técnicas e de negócios coordenadas pelo BNDES.
O resultado pode surpreender os analistas prediletos da imprensa brasileira, que tradicionalmente condenam qualquer esforço diplomático e de relações comerciais que não seja dirigido aos países desenvolvidos.
Além de se apresentar como alternativa para substituição dos combustíveis fósseis, o etanol se oferece agora como meio de afirmação do Brasil no cenário internacional.
Boa notícia também é notícia.
Entrevista fria
A entrevista do casal Nardoni ao programa Fantástico, da Rede Globo, no domingo, foi uma lição de mau jornalismo.
As razões pelas quais o entrevistador não parecia interessado nos entrevistados é o tema do comentário de Luiz Egypto, editor do Observatório da Imprensa:
– Ensina-se – ou pelo menos ensinava-se – nas boas escolas de jornalismo que a entrevista não foi feita para levantar a bola de ninguém. O entrevistador está ali, diante do entrevistado, para fazê-lo falar aquilo que ele não quer dizer. Os métodos para conseguir isso são vários, mas a base é uma só: o jogo de perguntas e respostas é como uma partida de xadrez, na qual o jornalista provoca sua fonte a dizer aquilo que ela preferiria manter em segredo.
Não foi o que se viu na edição de domingo (20/4) do Fantástico. Anunciada a partir do meio da tarde – com muita discrição, para não atiçar a concorrência – a revista dominical da Rede Globo exibiu matéria de 36 minutos com uma exclusiva de Alexandre Nardoni e Anna Carolina Jatobá, pai e madrasta da menina Isabella, assassinada três semanas atrás.
Embora se tratasse de um repórter experiente, a falta de apetite do entrevistador, que em momento algum confrontou o casal com perguntas mais incisivas, deixou nos telespectadores um inefável gosto de ‘armação’. Restou a impressão de matéria jornalística pautada pelos advogados de defesa dos indiciados pelo crime. Uma ótima aula sobre como não conduzir uma entrevista.