O crime e a direita
A onda de grampos telefônicos contra parlamentares provavelmente está sendo feita por marginais ex-integrantes dos serviços de segurança da ditadura, ou discípulos desses. É a extrema direita com métodos de extrema direita. Os meios políticos e intelectuais brasileiros, mídia incluída nas duas categorias, têm dificuldade para entender que no Brasil de hoje uma vertente importante da direita são criminosos que convivem há décadas com a polícia, dos dois lados da lei. As ameaças à deputada Ângela Guadagnin provêem da mesma fonte.
Elogio do diálogo
O Alberto Dines diz que o governo reduz o grau de tensão da crise sempre que se dispõe a dialogar civilizadamente. Fala, Dines.
Dines:
– Mauro, o presidente Lula não gostou da insistência dos repórteres que, de longe, tentavam obter algumas respostas sobre as questões do momento. Chamou-os de mal-educados. O presidente e seus assessores precisam entender que a obrigação do jornalista é perguntar. Perguntar sempre, perguntar muito, quanto mais, melhor. O repórter não pergunta em nome pessoal, pergunta em nome dos leitores, ouvintes ou telespectadores. A participação do presidente Lula no Roda Viva da próxima semana é uma boa notícia: mostra que o presidente da República disposto a reencontrar-se com o velho Lula, o líder sindical que fez uma meteórica carreira política graças à mídia.
Uma coisa é certa, Mauro: o clima de animosidade que reina neste momento na esfera política tem muito a ver com atitudes, digamos, impacientes do governo. Na terça-feira, na edição do Observatório da Imprensa na TV, o ministro Ciro Gomes mostrou que o seu famoso pavio curto está muito maior e soube discutir sobre a transposição do S. Francisco com calma. Uma crise política, por mais acirrada que seja, não resiste a uma boa dose de civilidade.
Eleição é meu bem, meu mal
A Folha simplifica na manchete desta quinta-feira, 3 de novembro, a determinação do presidente Lula para que seja cobrada dos ministérios mais eficácia. Diz o título: “Lula pede que ministros gastem mais”. Certamente o móvel do presidente é político. Está de olho na reeleição. Mas há um subproduto valioso. Na medida em que a ministra da Casa Civil, Dilma Roussef, aperta os ministérios para que sejam menos ineficientes, a gestão pública pode avançar.
A motivação eleitoral de Lula tem seu lado claramente daninho, como mostra Ricardo Balthazar no jornal Valor de hoje. Balthazar compara o discurso realista de Lula no lançamento do Bolsa-Família, em 2003, quando admitiu falhas no governo, com a retórica atual, na qual o presidente recomenda aos assessores que levem a sério as críticas mas não o faz ele mesmo.
Só petróleo
Em entrevista no programa Roda Viva, há um mês, o presidente Hugo Chávez falou que seu governo se empenha em diversificar a economia da Venezuela para torná-la menos dependente do petróleo. Ninguém perguntou como. Em entrevista à IstoÉ desta semana, o economista Luiz Gonzaga Belluzzo ecoou a declaração de Chávez. O repórter de economia Omar Colmenares, do vespertino Tal Cual, de Caracas, informa que não há nenhum plano de diversificação nem a curto, nem a médio prazo. Todos os projetos estão ligados à área petrolífera, com exceção de iniciativas relacionadas ao gás e à mineração na bacia do Rio Orinoco, leste da Venezuela.
Definição do chavismo
O jornal Tal Cual é dirigido por Teodoro Petkoff, ex-guerrilheiro, ex-candidato à presidência, ex-deputado, fundador do extinto MAS – Movimiento Al Socialismo –, dissidência do Partido Comunista da Venezuela. Petkoff foi ouvido ontem pelo Jornal Nacional da Globo sobre a situação na Venezuela. Será candidato contra Hugo Chávez em 2006. Na visão de Petkoff, o fenômeno chavista engendrou um movimento e um governo “essencialmente personalista, com fortes rasgos de militarismo, messianismo, caudilhismo e autoritarismo”. [Artigo que resume o livro Dos Izquierdas, lançado recentemente por Petkoff, está em http://www.nuevasoc.org.ve/
upload/anexos/actualidad_61.pdf.]
Cardápio monótono
Quer ver os segundos cadernos darem a mesma capa, leitor? É sair lançamento de editora importante. No sábado passado, o novo livro de José Saramago estava nas capas da Folha, do Estado e do Globo. Com direito a entrevista na Época e resenha na Veja. Só a IstoÉ escapou, sabe-se lá por quê. [O Jornal do Brasil se antecipou e deu na sexta-feira.]
Hoje, nos jornalões paulistas, pontifica Caetano Veloso, que lança um livro. Os dois jornais dão chamada na capa. O Estado destaca os 40 anos de carreira do compositor. Mas a Folha acha mais importante o que ele tem a dizer sobre política.