Friday, 27 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

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O que fere Palocci


Nos jornais, o ministro Antonio Palocci começou a ser demitido na sexta-feira. A compulsão do furo jornalístico fez com que colunistas se antecipassem aos fatos e pusessem sua colherzinha no caldeirão fervente.


Nas manchetes desta segunda-feira, 14 de novembro, Palocci aparece ora objeto de defesa pelo presidente Lula, ora já derrubado. Surgem listas de possíveis sucessores na Fazenda.


O maior problema do ministro não é o chamado fogo amigo do PT, nem pressão oposicionista, por sinal muito branda. É que não param de surgir problemas no seu quintal.


Companheiros de infortúnio


Além do ex-ministro Anderson Adauto, réu confesso, complica-se a situação do ex-ministro Luiz Gushiken e a do publicitário Duda Mendonça. De um modo ou de outro, como José Dirceu, todos artífices da vitória de Lula em 2002.


Internacionalização


Mais um país aparece na rota das finanças do PT: Angola. Aqui e ali já se ouviu falar também na Venezuela.



O alerta francês


O Alberto Dines destaca que a cegueira em face da desigualdade social não é só francesa. Fala, Dines.


Dines:


– Mauro, se a imprensa francesa ainda não entendeu exatamente o que está se passando na periferia de suas grandes cidades fica fácil perceber o grau de confusão que reina aqui, nestas bandas diante do mesmo fenômeno. Se a rebelião ocorresse na América, em poucas horas já teríamos opiniões firmes e convicções inabaláveis. Em grande parte, por causa do preconceito antiamericano ainda anterior à chegada de Bush Jr. à Casa Branca. Mesmo quando a França tem um governo de direita, como agora, ela parece estar imunizada e protegida por uma espécie de hábeas corpus que impede os analistas e acadêmicos de enxergarem as suas mazelas.


De qualquer forma, para nós é importante não perder de vista o fato de que, apesar das diferenças entre a sociedade brasileira e francesa, o mundo é um só. E cada vez mais parecido. Nós soubemos receber e integrar as diversas ondas imigratórias desde o fim do século XIX, mas, como os franceses, não sabemos perceber a miséria ao nosso lado. Os políticos franceses usam a retórica e com ela imaginam-se livres dos perigos. Os políticos brasileiros usam a demagogia para esconder a realidade. Está na hora de perceber as simetrias e as semelhanças. Pode evitar muitos dissabores.


País colonizado por dentro


Dines, anos atrás recebi a visita de um amigo francês. Chocado com o fato de que no Brasil a classe média ainda dispõe do trabalho de empregadas domésticas, ele comentou: o Brasil é um país colonial peculiar, em que a metrópole está dentro do próprio país.


No dia em que o Nordeste e certas áreas de Minas Gerais reduzirem seu grau de pobreza, deixando de funcionar como amortecedores sociais, a periferia de São Paulo e do Rio, se não houver políticas eficazes de integração, vai causar surpresas.


A palavra rejeitada


O historiador brasileiro Luiz Felipe de Alencastro, que vive há muitos anos na França, relata no Estadão de ontem que, num debate na televisão, uma jornalista interrompeu a fala de um franco-árabe assim: “De todo jeito, ninguém está entendendo o que você está falando!” Alencastro chama a atenção para uma cifra: neste ano, até outubro, foram queimados na França 28.000 carros, média de 90 por dia. Quase sempre em silêncio.


Enquanto a revista The Economist compara favoravelmente a situação da Inglaterra com a da França, no Estado de S. Paulo de hoje o historiador inglês Timothy Garton Ash procura desfazer a ilusão de que a integração plena de imigrantes seja um problema apenas francês. Lembra a gravidade das explosões de 7 de julho em Londres e diz que o problema com os imigrantes é da Europa inteira.



Os ricos também burlam


O Globo, que há dois meses denuncia agressões à lei e à ordem em favelas do Rio de Janeiro, demorou, mas chegou ontem às irregularidades urbanas praticadas pela classe média na Barra da Tijuca, na Gávea e na Lagoa Rodrigo de Freitas.


Alguém tem alguma dúvida de que no Brasil o mau exemplo vem de cima?


Gesto extremo


É preocupante que um ambientalista tenha se matado com fogo em Mato Grosso do Sul para tentar barrar a construção de usinas de álcool no Pantanal. Ele era presidente da Fundação para Conservação da Natureza no estado e usou esse caminho para protestar. Francisco Anselmo Barros, segundo o Estadão de hoje, era jornalista, ou seja, uma pessoa treinada para usar a palavra.