Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

>>Projeções viram manchete
>>Embromação estatística

Projeções viram manchete


O grau de politização das projeções de crescimento do PIB tornou-se tão patente que as previsões do Banco Central viraram manchete nos quatro jornais mais importantes do país – Folha e Estado de S. Paulo, Globo e Jornal do Brasil –, mas não nos dois especializados em economia, Valor e Gazeta Mercantil.


Os jornais se prendem ao jogo dos números. Embora tenham apontado fatores que contribuíram para uma diminuição do crescimento do Produto em 2005, como a forte retração da agroindústria, não foram capazes de explicar que diferença prática existe entre um crescimento de 5%, como o que o presidente Lula “garantiu”, e os 4% das previsões do BC. Nem foram capazes de relativizar a importância dessas previsões, o que não seria difícil. Bastaria recapitular o que aconteceu em anos passados. Mas se a dança dos números fosse encarada com distanciamento, onde iriam parar as manchetes?


Embromação estatística


O Alberto Dines critica o uso de pesquisas nebulosas para ocupar espaço na entressafra do período natalino.


Dines:


– Neste intervalo entre o Natal e o Ano Novo os jornais quase desaparecem de tão mirrados e mesmo que a presidência da República faça o impossível para garantir algum espaço nas primeiras páginas percebe-se o esforço dos colunistas políticos, sobretudo os diaristas, para produzir fatos. Ou pseudo-fatos, os famosos factóides. Na quarta-feira apareceu nas colunas um ranking elaborado por uma empresa chamada Macroplan que periodicamente ouve 100 jornalistas e personalidades da mídia. O resultado foi desastroso para o governo Lula, mas não é isso que importa. Mesmo numa enquête em círculos próximos ao PT os resultados não seriam muito diferentes. O que preocupa é a proliferação deste tipo de aferição e a acolhida que recebe na mídia. Quem são estas personalidades da mídia – são empresários, futebolistas, atrizes globais ou narcotraficantes? Afinal, cada uma destas categorias pode ser legitimamente considerada mediática. Compreende-se que os responsáveis por esta embromação estatística não queiram revelar os nomes destes “formadores de opinião” mas os leitores deveriam saber se são presidentes de empresas, operadores do mercado de capitais, professores universitários ou apenas clientes da Daslu. E os jornalistas? É claro que seus nomes não podem aparecer, seriam demitidos no dia seguinte pelos irados patrões, mas os leitores ao menos deveriam ser informados a respeito das posições que ocupam – são colunistas políticos, repórteres de polícia, comentaristas de futebol ou editores de cadernos de classificados? Prepare-se, leitor: quando a temporada eleitoral começar mesmo, você vai ser afogado em sondagens de opinião ainda mais capciosas.


O circo dos salários no Congresso


O deputado Carlito Mers, do PT, criticou ontem a doação de salário da convocação extraordinária feita a uma entidade beneficente pelo deputado Raul Jungmann, do PMDB. Disse que se trata de um investimento que poderá render votos a Jungmann nas eleições de 2006. Hoje, o Painel da Folha de S. Paulo noticia que também o presidente da Câmara, Aldo Rebelo, do PC do B, doará o salário a uma instituição de caridade, como já fizera na convocação anterior. Será que o petista Mers também condena Rebelo, fiel aliado do governo?


A mídia, que sofre crise de abstinência de manchetes paroxísticas, cria ondas em torno de determinados assuntos. O resultado é uma exploração circense de atitudes sinceras ou marotas, quer dizer, tomadas por convicção ou para fazer bonito no noticiário.


Trilha mineira


A Folha informa nesta quinta-feira, 29 de dezembro, que um laudo pericial confirma documento sobre o suposto uso de caixa dois, de 91,5 milhões de reais, durante a campanha derrotada da reeleição do hoje senador Eduardo Azeredo ao governo de Minas Gerais, em 1998. A assessoria do senador Azeredo disse que ele nega ter recebido 4,5 milhões desse total.


A trilha mineira de caixa 2 aberta pelo empresário Marcos Valério, que viria a ser usada pelo PT, ainda não foi devidamente apurada pela imprensa. Muita coisa ficou na sombra. Mas com a diminuição do ritmo em Brasília, essa cobertura, que é da maior relevância para se entender o que aconteceu, poderia ter sido reforçada.


Pinochet fichado


O fichamento do ex-ditador Augusto Pinochet pela polícia chilena tem um valor simbólico de enorme importância. Cabe notar que Pinochet “tocou piano”, como se diz ou se dizia na gíria policial, devido a acusações de assassinato e tortura, não de corrupção. É o crime de sangue, que põe as preocupações e o noticiário numa esfera mais grave.