Rei morto, rei posto
Renan está fora do jogo e segue a vida.
Esse é o tom que os jornais de hoje dão à notícia do afastamento do presidente do Senado, Renan Calheiros, que finalmente aceitou se licenciar do cargo.
Rei morto, rei posto, como se diz, e o pragmatismo da política se revela nas apressadas composições com o vice-presidente do Senado em exercício, o petista Tião Viana.
Até a oposição já avisa que prefere o petista Viana a outro peemedebista como Renan.
Provavelmente, essa preferência retrata a dificuldade de negociar com um aglomerado de oportunistas, como se revelou o PMDB nos últimos meses, sempre procurando obter vantagens para se posicionar na crise.
Renan fica na sombra
Mas os jornais talvez estejam subestimando a capacidade de sobrevivência de Renan Calheiros.
Mesmo fora da cadeira de presidente do Senado, ele ainda guarda consigo muitos segredos daqueles que irão julgá-lo por quebra do decoro parlamentar.
Longe das atenções da imprensa, Renan tem mais espaço para negociar cada voto.
E em cada decisão individual deverá pesar a culpa de cada um.
Nas suas edições de hoje, tanto o Estado de S.Paulo como a Folha e o Globo fazem um retrospecto da crise, observando que a demora de Renan em se licenciar acabou contaminando seus aliados, alguns dos quais começaram também a ser investigados.
Debandada geral
Para quem gosta de novelas, os jornais trazem relatos detalhados das conversas e negociações que convenceram Renan a pedir uma licença de 45 dias.
A conclusão geral é que ele teria apenas vinte votos a seu favor num próximo julgamento. Vinte e seis daqueles que o apoiaram no primeiro processo simplesmente se desvaneceram e não aparecem nem na fotografia de sua retirada.
Ao seu lado, apenas a figura do cabeludo senador Wellington Salgado, aquele que está sendo processado no Supremo Tribunal Federal sob acusação de se apropriar do dinheiro do imposto de renda.
Volta à rotina
Renan será julgado novamente na próxima semana.
No mesmo período, governo e oposição retomam os debates sobre a proposta de prorrogação da CPMF.
Os aliados de Renan, que aproveitaram a crise para pressionar o governo por cargos e verbas, parecem saciados.
É possível que a política venha a merecer outra vez as páginas de política.
Mas, para quem não suporta mais o noticiário sobre escândalos, vem aí o processo do chamado mensalão, no capítulo mineiro, que envolve figuras importantes do PSDB e do PMDB.
Além disso, o ex-banqueiro Salvatore Cacciola deve desembarcar do seu doce exílio com a mala cheia de velhas novidades.
Hora da limpeza
Afastado Renan Calheiros, e crescentes as possibilidades de sua cassação, os poderes da República precisam passar por um trabalho de limpeza.
A contaminação das instituições, no longo processo da crise, é uma questão a ser encarada com seriedade.
Dines:
Renan sitiado
A situação do senador Renan Calheiros, descrita hoje nos jornais, é de total isolamento. Sem a sua ‘tropa de choque’, que ontem não compareceu ao plenário para defendê-lo, o presidente do Senado tem ainda contra si a indicação do senador amazonense Jefferson Peres como relator do próximo processo. A culpa é da mídia? Ao longo de cinco meses o Senado Federal ficou paralisado, o processo político engarrafou, o Legislativo desmoralizou-se, o Executivo entrou em pânico e aumentou a distância entre o país real e seus dirigentes. A imprensa é a culpada por este colapso institucional de quase um semestre? As primeiras suspeitas sobre as relações do senador Renan com o lobista da empreiteira Mendes Jr. foram divulgadas de forma visivelmente açodada pela revista Veja através de uma acusação sem provas, veiculada pela ex-namorada do parlamentar. A imprensa errou neste início, mas três semanas depois, uma exaustiva reportagem da Rede Globo comprovou a falsidade dos documentos que Renan Calheiros apresentou para justificar a sua renda. A partir deste momento, sentindo-se desmascarado, o presidente do Senado apelou para a violência e a perfídia, numa sucessão de desmandos jamais vista desde o tempo da ditadura. Quem resistiu à tentativa de implantar a lei do cangaço no Senado da República foram os pares de Renan; a imprensa apenas acompanhou esta valente cruzada dos senadores do bem. Muitos estilhaços atingiram o Executivo. Não poderia ser diferente: ao adotar uma atitude a-crítica na relação com o seu aliado e estimular o seu discurso anti-mídia, o governo acabou demasiadamente identificado com Renan. Precisará de muito mais do que 45 dias para desinfetar-se.
Luciano:
O relógio de Huck
A revista Época antecipou para ontem a sua edição desta semana e traz
na capa reportagem discutindo a repercussão do caso do apresentador
Luciano Huck, que teve roubado um relógio Rolex de 40 mil reais e
reagiu com um artigo indignado na Folha de S.Paulo.
Época ouviu especialistas em comportamento para analisar a reação violenta de muitos leitores à queixa do apresentador da Rede Globo.
E aproveita para reforçar o ‘merchandising’ do filme ‘Tropa de Elite’.
Nada muito além de velhos clichês de sociólogos, cientistas políticos e palpiteiros em geral que desfilam diariamente na imprensa.
A questão tributária
A melhor contribuição da revista para a reflexão dos seus leitores é um texto sobre a questão tributária no Brasil.
A reportagem cita um estudo do economista Jorge Simino, responsável pelos investimentos da Fundação Cesp, o fundo de pensão das empresas de energia paulistas.
A surpresa: Simino afirma que, ao contrário do que diz a imprensa todos os dias, repetindo as queixas de empresários, a carga tributária não aumentou nos últimos anos.
O economista levou em conta as projeções dos indicadores usados para visualizar o crescimento futuro da economia e concluiu que o que aumentou não foi a carga tributária, mas o lucro das empresas.
As companhias do setor de telefonia móvel, por exemplo, deverão chegar ao final deste ano com uma receita de 3 bilhões e 500 milhões de reais, quase o triplo do seu faturamento de quatro anos atrás.
Mais lucro, mais arrecadação
Essa é a realidade constatada por Jorge Simino, que parece se encaixar no senso comum.
Além disso, o estudo citado pela Época desfaz o mito de que a dívida pública brasileira cresce como bola de neve.
Na verdade, afirma o economista citado, mesmo que o governo aumente um pouco seus gastos, a dívida tende a diminuir nos próximos anos, por conta da consolidação da estabilidade econômica e a queda dos juros.
É o tal do círculo virtuoso.
Prêmio Nobel e a imprensa
O ex-vice-presidente dos Estados Unidos Al Gore divide o Prêmio Nobel da Paz com os cientistas que produziram o relatório sobre mudanças climáticas da ONU.
A notícia não chegou a tempo de entrar nas edições de hoje dos jornais, mas está na internet.
A decisão deve indicar à imprensa que certos paradigmas da globalização estão mudando.
O relatório sobre o aquecimento global foi publicado em fevereiro deste ano.
Depois de muito barulho e de notícias mais alarmistas do que informativas, a imprensa segue na mesma.
De vez em quando, publica-se uma nota sobre enchentes e ondas de calor, ou sobre nevascas e tempestades, mas os jornais não conseguem ligar os pontos.
O Nobel da Paz para o tema ambiental é mais uma chance para a imprensa entender que a questão da sustentabilidade é o principal desafio da humanidade.