Uma enorme dor de cotovelo
A última pesquisa do Ibope sobre a popularidade do presidente Lula da Silva e o índice de aprovação do seu governo tem mais destaque na mídia internacional do que na imprensa brasileira.
A Folha de S.Paulo simplesmente ignorou a informação, enquanto o Estado de S.Paulo a omite na primeira página e, nas páginas internas, prefere destacar a expectativa dos brasileiros em relação ao futuro governo de Dilma Rousseff.
O Globo usa o mesmo artifício e deixa em segundo plano o fenômeno de popularidade do presidente: ele é visto favoravelmente por 87% dos brasileiros.
O Estadão abre a reportagem sobre o assunto afirmando que “os brasileiros encerram este ano safisteitos com o presidente Luiz Inácio da Silva e otimistas em relação ao governo de Dilma Rousseff”.
Além da popularidade pessoal do presidente, os números do Ibope mostram que o atual governo é considerado ótimo e bom por 80% dos entrevistados. Em outubro, esse número era de 77%. Levando-se em conta que 16% o consideram regular, o que, na análise do resultado, é considerado como uma avaliação positiva, deve-se concluir, em termos práticos, que 96% aprovam o desempenho de Lula como presidente e apenas 4% consideram seu governo ruim ou péssimo.
Considerando que 44% dos eleitores votaram contra sua candidata na última eleição, é de se observar também que não apenas o atual governo se encerra com indicadores históricos e dificilmente superáveis, como o futuro governo deve nascer sob o signo do otimismo, com 62% de expectativa favorável.
Com todos os defeitos que se possa atribuir ao presidente, pessoalmente ou em termos políticos, ignorar esses atributos é demonstração de profundo desprezo pela essência do jornalismo.
Interessante observar que o resultado da pesquisa havia sido publicado nas edições eletrônicas da imprensa brasileira, como o UOL, da Folha, e o G1, do Globo, mas é desprezado nas edições de papel.
É como se a imprensa considerasse que jornal, jornal mesmo, é só de papel, enquanto todo o resto do mundo sabe que, no futuro, os pesquisadores irão procurar as notícias do nosso tempo nos arquivos eletrônicos.
Vão encontrar o retrato de um fenômeno político e uma imprensa com dor de cotovelo.
A saga de Fidel Castro
Wikileaks na vanguarda do retrocesso
Alberto Dines:
– “O Wikileaks é uma nova fronteira de democratização da comunicação usando a internet como meio’, explica a jornalista Natália Viana, representante da badalada ONG no Brasil, em entrevista republicada por este Observatório da Imprensa. A colaboradora brasileira de Julian Assange não foi muito clara, em compensação foi prudente e evitou apresentar o site como veículo jornalístico. Fez bem: o Wikileaks neste momento é um colossal tambor voltado para a divulgação de informes confidenciais. Convém reparar: informe não é informação tanto no aspecto filológico como estratégico. Informe é algo rudimentar, sem forma, estágio anterior à informação, conjunto de dados analisados e acabados.
Os documentos revelados por El País na quarta-feira sobre a fortíssima hemorragia intestinal que quase tirou Fidel Castro do rol dos vivos em meados de 2006 ilustram perfeitamente o tipo de material distribuído pelo Wikileaks. No dramático episódio Fidel recusou submeter-se a uma colostomia que o obrigaria a usar por tempo indeterminado uma bolsa externa para aeliminação das fezes. É o que consta do informe do Departamento de Estado.
A verdade é que, entrementes, Fidel resignou-se, usou a bolsa durante três anos (sempre disfarçada por roupas largas, tipo jogging), até que re-operado livrou-se dela, passou a alimentar-se, vestir-se e atuar como antes. O Wikileaks ofereceu um semi-fato (ou factóide) — esgarçado, diminuído, superado pelo tempo, que nas mãos de uma entidade verdadeiramente jornalística teria produzido uma detalhada e emocionante página da história contemporânea.
Com a ajuda dos Cinco Grandes, o Wikileaks está na vanguarda de um retrocesso distraindo o mundo com um ersatz* de jornalismo, híbrido do cruzamento de velocidade com irrelevância.
(*) Ersatz, do alemão, sucedâneo inferior; termo criado durante o bloqueio Aliado na 1ª Guerra Mundial que obrigou os alemães a criar substitutos sem qualidade.