Hugo Chávez faz mais barulho
Os jornais de domingo e as revistas de fim de semana se ocuparam, entre outras coisas, com o ruidoso presidente venezuelano, Hugo Chávez.
Mas, lidos cuidadosamente, os textos nada acrescentam ao que já havia sido publicado nas semanas anteriores.
Até mesmo o grotesto episódio em que o rei Juan Carlos de Espanha mandou o presidente da Venezuela calar a boca foi requentado nas revisões do final de semana, sem qualquer acréscimo que ajude o leitor a entender o que se passa naquela república do Caribe.
Há muito tempo a imprensa está devendo uma reportagem sobre o governo do verborrágico presidente bolivariano e as razões pelas quais ele se mantém há nove anos no poder e pode ficar lá por muito mais tempo.
Chávez chegou ao governo pela via democrática, em duas eleições que venceu por larga vantagem.
Sua popularidade, principalmente entre os mais pobres da Venezuela, se mantém graças aos resultados de sua política econômica e alguns projetos sociais. Tudo muito parecido com aqueles que fazem a base do apoio a Lula no Brasil.
O problema com Chávez parece ser de nomenclatura.
Desde que resolveu chamar de república socialista bolivariana seu projeto de governo, ele desatou contra si os demônios da mídia tradicional e os temores da classe média.
Mas, a rigor, pouco se sabe sobre o que seria esse tal socialismo bolivariano.
Das 33 emendas aprovadas pela Assembléia Nacional da Venezuela, e que vão a referendo dia 2 de dezembro, as únicas que mexem na ordem econômica são as propostas de limitação do tamanho das propriedades rurais e de proibição dos monopólios.
O maior risco para a democracia, segundo alguns analistas, seria a criação de artifícios para a interferência direta da população em mudanças legislativas, o que poderia anular o Congresso venezuelano e deixaria a política à mercê da capacidade de Chávez de mobilizar a maioria da opinião pública.
E isso ele sabe fazer com o estilo atabalhoado e ruidoso que o mantém nas manchetes em todo o mundo.
Isso quer dizer que ele cria as confusões na mídia, como aquele outro Chaves, o comediante, ‘meio sem querer querendo’.
Se nem o rei da Espanha conseguiu diminuir a verborragia de Chávez, não é a imprensa que vai calar sua boca.
Enquanto isso, os jornais e revistas bem que poderiam fazer jornalismo e mostrar o que realmente acontece na Venezuela por trás da retórica chavista. Por enquanto, o noticiário ainda vem mais recheado de declarações do que de informações.
Cisco na política
A Folha de S.Paulo foi o único dos grandes jornais que não abandonou o caso da multinacional Cisco, a empresa de tecnologia da informação envolvida em um escândalo de fraude em importações e remessa ilegal de dinheiro ao exterior.
Nas edições de domingo e de hoje, o jornal paulista traz um material mais consistente, mas ainda depende de vazamentos das investigações.
Dines:
O noticiário sonolento do feriadão foi interrompido ontem pela Folha de S.Paulo com a manchete sobre a doação ao PT, Partido dos Trabalhadores, de 500 mil reais pela multinacional Cisco através de ‘laranjas’. O partido contestou imediatamente e com veemência. É evidente que a notícia foi produzida por um vazamento da Polícia Federal na Operação Persona. Mas, pergunta-se, por que razão nossa polícia judiciária precisa vazar uma notícia para a imprensa antes de concluída uma investigação — para impedir que o caso seja engavetado por interesses políticos superiores? Mas a divulgação de uma investigação incompleta não pode produzir injustiças? E por que a razão um veículo da importância da Folha aceita divulgar investigações que ela não conduziu? Se a denúncia for desmentida quem será o responsável pela difamação? Este caso vai dar o que falar, é grave e emblemático. Ele nos remete aos surtos denuncistas que dominam nossa imprensa há dez anos. Assim como o governo não pode interferir nos procedimentos da mídia, a mídia não deveria sujeitar-se a interesses ocultos, às vezes escusos. Se a Polícia Federal teme que o governo abafe as investigações quem deve colocar a boca no trombone é a Polícia Federal.