Wednesday, 27 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

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Jornalismo, o retorno


Nesta semana que sucede uma das mais disputadas e agressivas campanhas presidenciais desde a redemocratização, os grandes jornais brasileiros, aqueles considerados de maior influência, lembram pacientes recém saidos de um surto psicótico.


Os leitores que viajaram durante o feriado prolongado e não acompanharam o noticiário pós eleitoral, encontram os jornais alguns tons abaixo da estridência que marcou a imprensa até o domingo, dia 31 de outubro.


Os repórteres acompanham o dia-a-dia da presidente eleita, tentam selecionar o material aproveitável entre a excessiva oferta de especulações de todos os tipos, como normalmente ocorre em períodos como este, por conta dos eternos candidatos a alguma coisa na máquina do governo.


Também procuram entender o que se passa pelos lados da oposição, onde se ensaiam mudanças de papéis e onde também se apresentam novos candidatos a liderança para o mandato que se inicia em janeiro.


O discurso de vitória da presidente eleita serviu para desarmar algumas bombas preparadas pela imprensa, como a questão do controle social da mídia.


Aparentemente, os jornais se tranquilizaram com a enfática defesa, por parte de Dilma Rousseff, da liberdade de imprensa.


Nada com que se surpreender, uma vez que o fantasma do controle estatal e da censura foi uma invenção da própria imprensa.


Então, que seja a imprensa a exorcizá-lo.


Outro aspecto a destacar com a volta da normalidade no trabalho jornalístico, depois da histeria eleitoral, é a recuperação da capacidade de informar.


O Estado de S.Paulo desta quarta feira revela, por exemplo, que aquela pane no metrô paulistano, ocorrida no dia 21 de setembro, não foi causada por sabotagem de militantes petistas, como chegou a ser noticiado.


Foi resultado de uma falha técnica nos equipamentos das portas do trem.


Mais alguns dias e os jornais haverão de esclarecer que a futura presidente não devora criancinhas.


Qualidade dá lucro


Luiz Egypto, editor do Observatório da Imprensa:


– Sob a retranca “O futuro da imprensa”, a edição de domingo passado do jornal espanhol El País trouxe alentada entrevista com Giovanni di Lorenzo, diretor de Redação do semanário alemão Die Zeit. Filho de mãe alemã e pai italiano, di Lorenzo, de 51 anos, emigrou para a Alemanha no início dos anos 1970 e começou no jornalismo escrevendo para um jornal de Hannover. Há seis anos dirige o Die Zeit, publicação que tem como presidente honorário o ex-chanceler alemão Helmut Schmidt.


O que mais chama a atenção na entrevista não é a história de vida de Giovanni di Lorenzo, mas as suas ideias sobre a sobrevivência do jornalismo – e do negócio da imprensa – em uma era de acentuada digitalização e de convergência de meios. O título da matéria, retirado de uma declaração sua, é provocativo por si só: “O jornalismo digital faz de tudo, menos dinheiro”. Com esse mote, di Lorenzo explica à repórter Laura Lucchini como conseguiu, durante sua gestão, incrementar o faturamento em 70%, aumentar a circulação semanal para 500 mil exemplares e contabilizar receita de 123 milhões de euros em 2009.


Embora não tenha renunciado à plataforma digital – o Zeit tem uma redação online onde trabalham 60 pessoas –, o pulo do gato para os bons resultados da versão impressa foi a opção por matérias longas e bem documentadas, produzidas a partir de pautas que não fazem concessão alguma às facilidades do jornalismo trivial. Afirma di Lorenzo: “Fazemos textos muito grandes, não nos adaptamos às modas e seguimos fazendo um periódico difícil”. E continua: “Creio que esta foi uma das razões do nosso êxito. No momento em que as pessoas precisam de orientação, elas se dirigem aos meios que não cederam em seus compromissos”.


Ele aproveita para criticar o fato de que, em geral, na mídia impressa fazemos jornais para nós mesmos e nos esquecemos do público que paga por eles. O caminho, em suma, é investir pesado na qualidade jornalística como motor da surpresa e do encantamento. Só assim os impressos deverão garantir o seu lugar – e sua sobrevivência – na economia digital ora em construção.