O Brasil dos jornais
É manchete no Estado de S.Paulo desta sexta-feira o anúncio da reunião do G-20, marcada para o final de semana no Canadá.
Observe-se que a notícia explica porque o Brasil e os Estados Unidos estão alinhados em torno da proposta de estimular a economia, contra a escolha da Europa, de priorizar o aperto fiscal.
A informação também é contemplada na Folha de S.Paulo, embora com menos destaque.
Apesar de o tema ser complexo, a manchete do Estadão elabora com clareza o dilema que se apresenta diante dos líderes mundiais: buscar primeiro o equilíbrio das contas ou ampliar as chances de retomada do crescimento.
O modelo proposto por Brasil e Estados Unidos é o que vem dando certo para a economia brasileira, com algumas variáveis.
Quando a crise financeira internacional eclodiu, em setembro de 2008, o Brasil organizava o ingresso no mercado dos milhões de cidadãos resgatados da miséria pelos programas sociais de transferência de renda.
Esse resgate também foi beneficiado pela estabilidade que se vinha consolidando, o que permitiu os investimentos privados e públicos que estimulavam os negócios.
Diante da crise, o governo brasileiro procurou acelerar esse processo, e como resultado tivemos o reaquecimento rápido da economia, após apenas um trimestre de dificuldades.
Quando o presidente Barack Obama declarou que seu colega brasileiro era “o cara”, episódio que a imprensa tratou de maneira folclórica, os dois países vinham promovendo uma série de encontros bilaterais para discutir como enfrentar a crise global.
É desse período o alinhamento entre Brasil e Estados Unidos em torno da proposta que é defendida agora no G-20.
Depois disso, houve o episódio do Irã, no qual o Brasil exerceu sua soberania, contrariando a opinião dos americanos.
Passado o desencontro, ocorrência trivial entre nações independentes, outra vez os dois países voltam ao mesmo lado da mesa.
A lembrança serve para observar como, muitas vezes, ao se prenderem excessivamente ao fato do dia, os jornais perdem a perspectiva histórica, podendo induzir o leitor a tirar conclusões equivocadas.
A imprensa brasileira precisa engolir, de uma vez por todas, o fato de que o Brasil se tornou protagonista importante no conjunto das nações justamente porque não se alinha automaticamente com os Estados Unidos.
O que é boa notícia
Alberto Dines:
– Na capa da edição de ontem, a Folha de S. Paulo voltou a badalar a retranca da “Boa Notícia”. Há poucas semanas, quando fez a ruidosa modificação no seu visual, o jornalão prometeu que este tipo de matéria passaria a ser destacado na primeira página, o que já aconteceu um par de vezes.
A Folha não explicou, mas trata-se de uma nova tática adotada pela ANJ, Associação Nacional de Jornais, para mostrar que a mídia não é “do contra”: além de denunciar, ela também sabe ser otimista e pró-ativa. Então cabe perguntar: o que é uma boa notícia?
Também ontem, nosso companheiro de Observatório e editor da versão radiofônica, Luciano Martins Costa, escancarou o relativismo das boas notícias mostrando como os principais jornalões trataram e maltrataram os últimos dados da Pesquisa de Orçamentos Familiares.
No entanto, a Boa Noticia apregoada ontem pela Folha referia-se ao novo sistema adotado pela Receita Federal para retificar as declarações do Imposto de Renda em favor dos contribuintes. Ora, porque só essa é uma boa notícia – os demais assuntos da capa de ontem não poderiam ser classificados como positivos, favoráveis?
Não é animador saber que o Metrô paulistano indenizará os proprietários de imóveis abalados pelas escavações? A denúncia do jornalista Jânio de Freitas de que 57% da verba federal para prevenir catástrofes climáticas foi destinada exclusivamente à Bahia não serve ao cidadão?
Toda notícia é, em princípio, boa. Saber é muito melhor do que ignorar. Esta é a base do jornalismo moderno, democrático. O ditado em inglês, “no news are good news” – nenhuma notícia é boa notícia – vai na contramão do conhecimento e da participação. A imprensa é sempre otimista mesmo quando critica; apontar erros e malfeitorias é sinal de excelência. A busca da verdade é a suprema prova de confiança na humanidade.