O crime nas urnas
A série de reportagens intitulada Favela S/A, que vem sendo publicada pelo Globo desde domingo, merecia ser replicada por toda a imprensa nacional.
O jornal carioca vem investigando e revelando, há dias, o assombroso nível de envolvimento do crime organizado com a política do Rio.
Pode-se afirmar, com base nas reportagens, que os criminosos já constituem um partido com chances de compor a maioria na Câmara Municipal.
As organizações criminosas estão corroendo o sistema legislativo em um corte transversal, ocupando postos em praticamente todos os partidos.
Na edição de hoje, o Globo traça o perfil do deputado petista Jorge Hauat, que ontem foi indiciado por associação com um tenente-coronel da Polícia Militar para a exploração do potencial eleitoral e venda criminosa de serviços clandestinos na Zona Oeste do Rio.
Hauat chegou a ser afastado das decisões da bancada, mas segue filiado ao partido.
A reportagem informa que, dos 70 deputados estaduais atuantes na Assembléia Legislativa do Estado do Rio, 33 estão sendo investigados, ou seja, praticamente metade dos parlamentares tem dívidas com a Justiça.
Os crimes de que são acusados vão do estelionato ao homicídio e formação de quadrilha.
Todos eles compõem o sistema que tenta consolidar seu poder nas eleições municipais, o que está transformando a disputa eleitoral em guerra de gangues.
Assim como costuma ditar moda e influenciar os costumes, por ser a matriz da indústria do entretenimento, o Rio de Janeiro também pode estar revelando o padrão de contaminação da política nacional pelo crime organizado.
O número de crimes envolvendo cantidatos às eleições municipais neste ano já é um recorde, segundo a imprensa, e existem muitos indícios de que a ação criminosa na política se estende por todo o País.
Está na hora de os jornais dos outros Estados prestarem o mesmo serviço que o Globo está oferecendo aos seus leitores no Rio.
As eleições na internet
Alberto Dines:
– Sábia a decisão do TSE de adiar por alguns dias o julgamento do mandado de segurança impetrado pelo iG sobre o uso da Internet nas eleições. O assunto não estava suficientemente debatido e mais alguns dias de exposição serão extremamente úteis para tirar as dúvidas. Agora ninguém poderá dizer que a decisão foi tomada às escondidas.
É válida a premissa de que a Internet representa um formidável reforço na participação pública, não faz sentido embargar a livre circulação de idéias e opiniões justamente no momento em que é mais necessária. É bem verdade que Internet é nova, os efeitos da sua atuação eleitoral não foram suficientemente testados, mas é melhor que as avaliações sejam feitas em ambiente de plena liberdade do que em testes de laboratório, sempre artificiais. Quando no século XVII a fabricação de prensas tornou-se universal, os governos absolutistas tentaram impor a obrigação de registrar e licenciar o equipamento tipográfico. Era o fim da liberdade de imprimir, negação do avanço propiciado pelo invento de Gutenberg e felizmente evitado graças a atuação de figuras como John Milton (seu discurso sobre a liberdade, Areopagitica, de 1644, entrou para a história do pensamento ocidental).
Tal como a mídia impressa, a Internet não depende de concessões do Estado e não pode ser constrangida por regulamentos como acontece com o rádio e a TV. O meio termo entre liberdade e libertinagem será rapidamente encontrado por todos os que se beneficiam da Internet.
Tal como a imprensa, que estabeleceu seus códigos de ética, a Internet rapidamente criará os seus.
A única reivindicação dos provedores e usuários ainda sujeita a questionamentos refere-se à inserção de propaganda eleitoral paga. Ela vai na contramão dos esforços mundiais para coibir as distorções do poder econômico sobre o processo político.
Legítima é a possibilidade da coleta, através da rede, de doações para os partidos, facilmente controláveis, antídoto para a aberração do Caixa Dois. Valeu a pena manter o debate, funcionará como ensaio geral.