O fantasma do fascismo
A imprensa internacional dedica atenção especial ao perigoso viés que começam a tomar as políticas de combate à crise econômica internacional.
O fantasma do protecionismo, que se materializou no Senado dos Estados Unidos durante a votação do plano de emergência proposto pelo presidente Barack Obama, repete suas aparições em outras partes do mundo e se manifesta na forma de preconceito social através de uma iniciativa do governo italiano.
Por enquanto, a imprensa brasileira apenas observa, reproduz comentários mas evita entrar firme no assunto.
A cláusula inserida pelo Senado americano na proposta original de Obama, que ficou conhecida como ‘Compre América’, impunha restrições ao uso de aço e outros produtos de origem estrangeira em obras e projetos financiados pelo pacote de ajuda do governo.
Após os protestos de Obama, que alertou os parlamentares para o risco da deflagração de uma guerra comercial, o Senado abrandou o texto, adequando-o aos termos dos acordos internacionais dos quais os Estados Unidos são signatários.
Mas a norma ainda provoca muitas restrições ao comércio entre nações, prejudicando o Brasil e outros países.
Um dos riscos das práticas comerciais protecionistas é que elas estimulam a xenofobia, rompem a corrente de solidariedade sem a qual não se poderá superar a crise econômica e despertam os piores instintos da sociedade.
Tem esse sentido a greve realizada por empregados de uma refinaria na Inglaterra, que pretendiam impedir a contratação de funcionários estrangeiros.
Mas o caso mais grave acontece na Itália, onde o governo do primeiro ministro Silvio Berlusconi quer estimular os médicos a denunciar pacientes que sejam imigrantes em situação irregular.
Pior: o governo italiano autoriza a criação de ‘patrulhas de cidadãos’ para supostamente controlar a segurança nas ruas.
Tudo muito parecido com as milícias fascistas que perseguiam opositores, judeus, homossexuais e outros desafetos do regime de Mussolini.
A imprensa brasileira ainda não deu muita atenção a esses sinais de deterioração das relações entre as nacionalidades.
Eventualmente, quando cidadãos brasileiros são maltratados em aeroportos da Europa, os jornais levantam a questão do preconceito, mas de modo geral evitam aprofundar o debate sobre a origem desses abusos.
Quando o Brasil tem disputa com países mais pobres, como aconteceu com o Equador e a Bolívia, a imprensa se enche de nacionalismo e cobra ações enérgicas.
Quando a disputa ocorre com países da Europa, a imprensa brasileira encolhe o rabo e assume o complexo de vira lata.
O senhor do castelo
A imprensa farejou escândalo e encontrou o deputado Edmar Moreira, misto de parlamentar e senhor feudal.
Alberto Dines:
– O deputado-corregedor da Câmara Federal está encalacrado: corre o risco de perder o cargo de Vice-Presidente, perder a legenda e até de perder o mandato recém iniciado. Edmar Moreira, do DEM-MG, imaginou que nossa imprensa continua adormecida ou entretida com assuntos mais apaixonantes do que a cobertura do Legislativo. Arrogante e mal informado, Edmar Moreira achou que jamais seria cobrado pelo que dissesse. Não vacilou em afirmar que a função de Corregedor deveria ser extinta, que a Câmara não tem poder de polícia e não pode punir transgressões de parlamentares.
Ao explicar que os deputados são boa gente, admitiu que têm um único vício, o ‘vício da amizade’. Os jornalistas que cobrem o Congresso perceberam que havia um novo Severino Cavalcanti na Mesa Diretora da Câmara: registraram a estapafúrdia declaração e ontem O Globo revelou na primeira página a extensão do vício da amizade do deputado Edmar Moreira: um enorme castelo compartilhado com o filho, Leonardo Moreira, deputado estadual, avaliado em 25 milhões mas declarado na Justiça eleitoral como valendo 17.500 reais.
Em 18 anos, o deputado só apresentou 14 projetos, menos de um por ano, sendo que dois deles favorecendo a privatização dos serviços de segurança em presídios, o que ampliaria substancialmente os seus negócios nesta área.
O caso é exemplar, surgiu no inicio de uma nova sessão legislativa, no momento em que o Congresso tem as piores avaliações e a escolha dos presidentes das duas casas foi recebida com desagrado. Nossa imprensa anda desatenta, desnorteada, mas ao revoltar-se contra o ‘vício da amizade’ talvez reencontre a vocação esquecida.