O folclore da campanha
Os jornais continuam cobrindo as campanhas dos candidatos a prefeito nas grandes cidades como quem relata curiosidades e fatos pitorescos.
Um dia depois de iniciada a campanha na televisão, não há questionamentos sobre programas de governo e, principalmente, de onde virão os recursos para as pirotecnias anunciadas em todas as eleições.
Desde a pitoresca visita do ex-governador Geraldo Alckminn a uma favela até a declaração do ex-prefeito e eterno candidato Paulo Maluf sobre sua temporada na prisão, tudo é noticiado como se não passasse de um espetáculo de variedades.
As declarações são simplesmente reproduzidas, quase sempre sem qualquer contextualização, e as invenções dos marqueteiros e improvisações dos candidatos se reproduzem por todos os meios.
Na campanha do Rio de Janeiro, a chacina de sete pessoas é relacionada a uma candidata a vereadora que pertence a uma família de políticos acusada de chefiar um grupo criminoso.
O Globo cita um delegado de polícia como fonte da informação, mas não parece ter feito um esforço adicional para esclarecer tão grave acusação.
A não ser que venha a oferecer aos seus leitores, nos próximos dias, alguma informação adicional ao que foi publicado, o jornal poderá estar fornecendo à acusada argumentos capazes de convencer os eleitores de que não tem nada a ver com as milícias chefiadas por sua femília.
Dessa forma, perpetuam-se certos vícios na política, que normalmente começam com a oferta de favores a líderes comunitários e podem terminar com bairros inteiros submetidos à tirania de grupos criminosos.
Além disso, o sistema desestimula o surgimento de líderes realmente comprometidos com os interesses dos moradores e cria empecilhos ao desenvolvimento de associações realmente comunitárias.
Com a decisão do Supremo Tribunal Federal, segundo a qual a Justiça Eleitoral não poderá negar o registro a candidatos que não tenham sido condenados definitivamente, a sociedade tem que correr o risco de ver eleitos representantes que apenas representam a si mesmos e a seus cúmplices.
Se a imprensa não pode impedir que isso aconteça, pelo menos pode alertar os cidadãos sobre antecedentes e práticas que tornam alguns candidatos menos recomendáveis.
Caminhos da reportagem
A notícia de que na Polícia Federal prendeu uma quadrilha que havia fraudado licitações em pelo menos 40 municípios da Paraíba foi publicada no meio dos fatos gerais da política ou nas sessões de notícias nacionais.
As investigações começaram em 2004, e se assemelham em tudo a práticas do mesmo tipo já desmanteladas em outros Estados.
Em geral, as quadrilhas preparam as licitações para os prefeitos e montam empresas de fachada para receber o dinheiro destinado a obras e aquisições.
Uma leitura rápida nas notícias envolvendo corrupção de prefeitos revela que o modelo de golpe se repete por todo o País e se instala nos municípios, sempre em início de gestão.
A observação dessas práticas é a maneira como a polícia se aproxima das quadrilhas, e também é uma das técnicas de investigação dos jornalistas especializados.
Mas o fato de essa notícia ser publicada sem vinculação com o noticiário sobre a campanha eleitoral mostra como os jornais não fazem a relação necessária entre as evidências de que as fraudes são planejadas já no lançamento das candidaturas.
Falando sobre técnicas de investigação, a Folha de S.Paulo vem anunciando o livro intitulado ‘Anatomia da Reportagem’, do jornalista Frederico Vasconcelos, que de longe se destaca entre os outros profissionais por sua dedicação ao trabalho investigativo.
Talvez a Folha e os outros jornais devessem presentear seus repórteres e editores com um exemplar.
Ou exigir que, pelo menos, os repórteres acompanhassem os 28 passos de um bom trabalho que o autor recomenda como um bom modelo de reportagem.