Thursday, 26 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

>>Pede-se serenidade
>>Triunfo contraditório

Pede-se serenidade


O governo Lula, ao cometer sucessivos erros políticos e de comunicação, e o PT, devido a uma arrogância descrita com pena certeira pelo deputado de Minas Gerais Paulo Delgado, um de seus fundadores, transformaram a simpatia inicial, no mínimo a neutralidade da mídia, em antipatia, em alguns casos oposição sistemática.


Ontem o governo obteve uma vitória política usando meios fisiológicos aos quais parece agora condenado e que o igualam a todos os governos antecedentes, salvo os da ditadura, que usavam o porrete do autoritarismo. Mas foi uma vitória, dá fôlego ao presidente Lula, o que pode ser bom para o país, se Lula aproveitar a oportunidade. E produziu uma melhoria no comando da Câmara dos Deputados, embora, é claro, sem mexer nos seus defeitos estruturais.


Cabe à imprensa manter a serenidade e não se comportar como torcida de Fla-Flu. Mesmo à vista da comemoração eufórica em plenário do deputado José Dirceu, destacada hoje na capa da Folha de S. Paulo.


Antes de mais nada, crimes e irregularidades devem ser apurados e punidos, porque a população não aceita outra coisa. Não aceita que a eleição de Aldo Rebelo seja uma vitória de “mensalistas”. Ao mesmo tempo, a pauta de reformas precisa ser retomada caso o país não queira continuar perdendo a corrida da competitividade.



PT sempre precisou da oposição


Encontra-se hoje em jornais como a Folha de S. Paulo o argumento de que o governo tem agora pela frente a dificuldade de lidar com uma Câmara dividida. Sempre teve essa dificuldade. As reformas importantes aprovadas em 2003 contaram com o apoio explícito da oposição. Não é da tradição do parlamento brasileiro opor-se a medidas percebidas como de interesse do país. O único partido que fez isso sistematicamente foi o PT, desde quando pôs para fora deputados que votaram em Tancredo Neves no Colégio Eleitoral, em 1985, se recusou a assinar a Constituição de 1988, e em 1999 impediu Fernando Henrique de fazer uma reforma previdenciária sob o argumento de que era uma exigência do FMI.


Dirceu se convence da própria inocência


O Estado de S. Paulo chama a atenção em editorial nesta quinta-feira, 29 de setembro, para a frase inacreditável dita pelo deputado José Dirceu em depoimento no Conselho de Ética da Câmara: “Volto ao Conselho de Ética cada vez mais convencido da minha inocência…”


As palavras traem mesmo o mais controlado dos oradores.


Triunfo contraditório


O Alberto Dines chama a atenção para a natureza contraditória da vitória do governo na eleição do presidente da Câmara.


Dines:


– Mauro: importa quem ganhou, não importa o placar. Este, pelo menos, é o raciocínio dos torcedores, dos cronistas desportivos e, sobretudo dos jogadores. Mas em política é um pouco diferente, não é assim ? Também nas guerras, com a famosa vitória de Pyrro, com sabor de derrota. De qualquer forma, ontem, pela primeira vez desde fevereiro quando Severino Cavalcanti foi eleito, o presidente Lula foi dormir mais tranqüilo.


Hoje, quando acordou, não deve ter gostado das manchetes e comentários dos jornais sobre os mirrados 15 votos de diferença, sobre a Câmara perigosamente dividida e sobre os prognósticos de uma oposição ainda mais assanhada com a sua quase-vitória. Terminada a comemoração, além de contar os mortos e feridos, convém prestar atenção no sinal emitido pela votação de ontem: de agora em diante, vai ser tudo muito sofrido. Exemplo: o governo contava empolgar o país com o projeto mirabolante da transposição das águas do São Francisco e não foi por casualidade que ultimamente o presidente andou lembrando JK. Mas, de repente, além do veemente protesto da CNBB contra o projeto, temos a greve de fome do bispo da diocese da Barra, D. Luiz Cáppio. Este tipo de protesto só acontecia no tempo da ditadura. Agora será culpa da mídia?



Bispo ignorado


Dines, ontem à noite, em entrevista ao Observatório da Imprensa, o jornalista e ex-deputado federal Marco Antônio Coelho criticou o fato de que o Jornal Nacional apresenta desde segunda-feira uma série sobre o Rio São Francisco e não informou sobre a greve de fome do bispo. Marco Antônio, que vai lançar um livro sobre o São Francisco, é contra a transposição.


Marco Antônio:


– Acho interessante que no próprio Jornal Nacional, desde segunda-feira, eles nem sequer noticiaram essa greve de fome do bispo de Barra. Estranho, isso. Uma greve de fome de um bispo, que pode levá-lo à morte, e a verdade é que não está repercutindo. Não há o devido destaque na imprensa aqui de São Paulo.


Mauro:


– Esse foi Marco Antônio Coelho. Dos jornais de hoje, só o Globo noticia o protesto.


Restituição para Meirelles


A Folha de S. Paulo dá hoje um belo furo sob a rubrica equivocada “Escândalo do Mensalão”: a receita federal passou dez meses examinando declarações de imposto de renda do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, e chegou à conclusão de que ele tem direito a restituição de R$ 148.500, referente à declaração de 2002. Meirelles, que havia tomado a iniciativa de pagar 20 mil reais de multa relativa a 2003, já avisou que vai cobrar o dinheiro.