Wednesday, 27 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

>>Perigo no ar
>>De olho em 2010

Tudo resolvido

O Brasil vai sediar a Copa do Mundo de 2014 e a imprensa embarca no ufanismo.

O Estado de S.Paulo e o Globo produziram cadernos especiais para contar como foi a solenidade de anúncio da escolha, na sede da Fifa, na Suíça.

A Folha engordou a sessão de esportes com seis páginas a mais, e nehum deles explicou tudo que precisa ser feito até lá.

Todos deram mais destaque à ausência de Pelé do que às dificuldades que o Brasil vai encontrar para organizar o evento.

O orçamento inicial apresentado pelo economista Carlos Langoni, coordenador do projeto Copa 2014, é de 6 bilhões de dólares, o equivalente a mais de 10 bilhões e meio de reais.

No mesmo dia em que foi anunciada a escolha, o deputado Silvio Torres e o senador Alvaro Dias procotolaram no Congresso o pedido de criação de uma CPI para investigar crimes de lavagem de dinheiro no futebol.

Mas só o Estadão deu espaço para eles.

Falta tudo

Em meio às comemorações, o Globo foi mais realista. ‘A Copa é nossa’, diz o título no alto da primeira página. ‘Agora só faltam os aeroportos, as rodovias, os trens, os metrôs, os estádios…’.

O jornal carioca lembra que em 1950, o ano em que o Brasil sediou uma Copa do Mundo, os torcedores podiam viajar de trem entre o Rio, São Paulo e Belo Horizonte.

Hoje, esses trens não existem mais. Além da congestionada Via Dutra ligando o Rio a São Paulo, não há uma rodovia decente para a capital mineira e a ponte aérea faz parte do chamado caos aéreo.

Os três principais jornais do País balançaram entre o nacionalismo e o necessário senso crítico.

A Folha lembra que as obras de restauração dos estádios necessários para o Brasil sediar a Copa só podem ser feitas com investimento privado, mas ninguém imagina o que fazer com eles depois da festa.

O PAC da Copa

Carlos Langoni, que ganhou mais espaço no Globo do que nos outros jornais, observa que o evento será mais uma oportunidade para atrair investimentos para o Brasil.

Ele acha que a Copa vai criar, entre 2008 e meados de 2014, um novo setor na economia do Brasil.



Entusiasmado, o ex-presidente do Banco Central chegou a defender a criação de um Plano de Aceleração do Crescimento para a Copa 2014.

Os jornais parecem concordar que trata-se de uma grande oportunidade para o País. Mas nenhum deles explica aos leitores o que aconteceu nos outros países depois da festa.

As edições de hoje dos jornais lembram finais de Copa do Mundo com vitória do Brasil.

E é apenas o começo.

Perigo no ar

A Folha deu o alerta ontem, o Globo retoma o assunto hoje.

E os jornais voltam a prestar atenção à falhas das empresas de aviação, que podem comprometer a segurança dos vôos.

Até aqui, os jornais só tinham interesse na disputa entre o ministro da defesa, Nelson Jobim, e o presidente da Agência Nacional de Aviação Civil, Milton Zuanazzi, que se negava a deixar o cargo.

Dines:

– Nem tudo está perdido na Folha de S.Paulo. Apesar da recaída apelativa, há uma banda boa atenta ao interesse público. Na edição de ontem, terça-feira, a repórter Leila Suwwan revelou uma denúncia da Aeronáutica contra as empresas aéreas que estão escondendo as panes dos seus aviões. Isso mesmo: alguns comandantes não avisam a torre de controle a respeito de emergências, alegando que não querem assustar os passageiros, mas esquecem que assim colocam em risco as suas vidas. Evidentemente cumprem ordens das empresas aéreas, que não querem prejudicar ainda mais suas já abaladas imagens. A ANAC, procurada pelo jornal, não quis comentar.  Se os jornais deixassem os escândalos e apelação por alguns momentos e cuidassem daquilo que lhes compete, a vida dos seus leitores seria muito melhor.

Luciano:

CPMF e eleições

As negociações entre o governo e a oposição em torno da prorrogação da CPMF chegaram a tal complexidade, que a leitura de um só jornal não basta para entender toda a história.

O Globo afirma que o governo discute uma redução simbólica da alíquota, o Estado de S.Paulo adianta que a base aliada aceita uma redução de 0,38% para 0,36% já em 2008, e a Folha diz que a redução poderia ser entre 0,01 e 0,02 ponto porcentual.



Os detalhes sobre o valor da possível redução encobrem o que está de verdade em negociação: o governo tem pressa em ver o assunto encerrado, para entrar em 2008 com o Orçamento previsto. A oposição quer mais verba para os Estados e municípios onde tem mais força.

De olho em 2010

No ano que vem teremos eleições municipais. Reforçar as bases será fundamental para todos os partidos, como preparação para as sucessão presidencial de 2010.

Será provavelmente a primeira eleição presidencial sem a participação de Luiz Inácio Lula da Silva desde 1989, e provavelmente a disputa terá muitos candidatos em primeiro turno.

Com as chances divididas, o partido que tiver emplacado mais prefeitos em 2008 aumentará suas possibilidades em 2010.

Se o leitor tiver em mente esse pano de fundo, todo o noticiário sobre as negociações da CPMF passa a ter outra dimensão.

Os prefeitos que forem eleitos em 2008 serão beneficiados, por exemplo, com as obras dos diversos Planos de Aceleração do Crescimento.

Trata-se do maior pacote de investimentos em obras públicas já montado no País.

Empregos e verbas

Ontem, um dos detalhes da negociação era o PAC da Saúde: o governo quer ampliar de 27 mil para 40 mil as equipes do programa Saúde da Família, que foi criado há doze anos.

Segundo os cálculos do ministro José Gomes Temporão, serão gerados 3 milhões de empregos.

Trata-se de um verdadeiro manjar para prefeitos e governadores.

Os jornais não devem fazer especulações sobre como serão usadas essas verbas, mas não custa lembrar que, ainda nesta semana, foram noticiados casos de fraudes em 479 municípios, com a contratação em duplicidade de médicos e enfermeiros.

O noticiário sobre as negociações entre políticos é pitoresco.

Mas convém não desgrudar o olho do dinheiro público.