Pioneiros da retaguarda
A Folha de S.Paulo informa, em nota curta, que especialistas em ambientalismo foram convidados a ministrar um curso compacto sobre o tema ao novo secretário do Meio Ambiente do Estado de S.Paulo, o jovem deputado Bruno Covas.
Todos sabemos que os cargos de confiança de todos os governos são usados para satisfazer as alianças políticas que vencem eleições.
Não deveria ser sempre assim, principalmente nos postos onde a especialização ou o notório saber são condições essenciais para decisões equilibradas.
Mas o secretário, como se disse, é jovem e pode aprender rapidamente algumas noções suficientes para não promover um desastre ambiental.
Da mesma forma, alguns colunistas da imprensa, que até muito pouco tempo consideravam exageradas as previsões sobre mudanças climáticas e adoravam fazer piadas sobre os “ecochatos”, são agora ecologistas de carteirinha.
Assim caminha a humanidade: uns têm a vocação para contestar o status quo e se posicionam na vanguarda, correndo os riscos do pioneirismo. Outros seguem atrás, cautelosos mas sempre atentos às oportunidades.
Mal ou bem, as preocupações com o patrimônio ambiental vão ganhando espaço nos meios de comunicação.
Nesta sexta-feira, por exemplo, há reportagens sobre o aquecimento dos oceanos, sobre a seca no Sul do Brasil, sobre a polêmica da licença ambiental para a usina de Belo Monte.
E há também, no Estado de S.Paulo, a notícia de um estudo patrocinado pela ONU, informando que as mudanças no Código Florestal em curso no Congresso Nacional, se forem aprovadas, podem prejudicar a competitividade das empresas brasileiras de base agrícola e florestal.
Dirigido a investidores internacionais, o texto interessa a empresas de papel e celulose, pecuária e alimentos em geral, madeira, biocombustíveis e outros setores.
Trata-se de um exemplo claro de como, muitas vezes, aqueles que contestam hábitos danosos à coletividade estão na verdade protegendo os predadores de si mesmos.
Empresários e executivos que não atentam para os princípios da sustentabilidade estão apostando no curto prazo e encurtando a longevidade de seus empreendimentos.
Da mesma forma, um jornalismo que não exercita a visão de futuro corre o risco de envelhecer antes de fechar a edição.
Memória curta
Alberto Dines:
– Articulistas embasbacados e desprovidos de qualquer senso crítico afirmaram nos quatro cantos do mundo que o Wikileaks mudava tudo. A diplomacia, a política internacional e o próprio jornalismo jamais seriam os mesmos. O sucesso do site de vazamentos criado pelo hacker Julian Assange foi tamanho que dois dos três jornalões nacionais (a Folha e o Globo), não se vexaram em pegar carona no grupo dos cinco veículos globais que a ele se associaram. Exatos dois meses depois, nesta pátria dos modismos ninguém quer mais ouvir as fofocas com data de validade vencida. Prova disso são os documentos vazados na última terça-feira contendo a opinião da ex-presidente chilena, Michelle Bachelet, a respeito de governos e líderes latino-americanos. Sobre a ex-colega argentina Cristina Kirchner, a chilena disse que ela “tende a acreditar nos rumores e textos caluniosos publicados na imprensa e faz comentários desastrosos em público”. Para ela, a democracia argentina “não é robusta e suas instituições são frágeis”. A respeito do nosso país foi ainda mais incisiva: “O Brasil goza de uma fama desproporcionada como mediador em conflitos regionais”. Para ela, Lula é um zorro (raposa), inteligente e encantador mas sua candidata, Dilma Roussef, distante e formal. Publicadas com grande destaque pelo espanhol El País na quarta-feira, as candentes opiniões de Bachelet vazadas pelo Wikileaks ficaram de fora do noticiário de ontem. A torneira giratória de Julian Assange já não tem charme, breve estará apenas nas colunas sociais. A imprensa brasileira adora badalar e adora esquecer. Sobretudo as tragédias: duas semanas depois do maior desastre já acontecido no país, a tromba d’água na região serrana do Rio há dois dias só consegue produzir uma chamadinha na capa do Globo. Na paulicéia nem isso.
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