Thursday, 28 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1316

>>Radiografando a Justiça
>>A mídia partidária

Radiografando a Justiça


O jornal O Estado de S.Paulo se dedica, desde o final de semana, a vasculhar os porões do Poder Judiciário e revelar os resultados de investigações feitas pelo Conselho Nacional de Justiça.


O retrato pintado pelo diário paulista é assombroso: criada há cinco anos, a Corregedoria que operacionaliza as decisões do Conselho abriu, só nos últimos doze meses, mais de 5.300 procedimentos para apurar desvios do sistema judiciário.


Foram encontradas irregularidades como a assinatura de sentenças escritas pelos próprios acusados e uma verdadeira indústria de decisões judiciais determinando o pagamento de somas milionárias por parte de bancos e órgãos públicos em ações suspeitas.


A situação descrita pelo Estadão é de tal modo grave que um dos entrevistados, o ministro do Supremo Tribunal Federal Marco Aurélio Mello, produziu uma frase lapidar: “Não são todos salafrários”, declarou o ministro.


Já o corregedor nacional de Justiça, Gilson Dipp, declarou que a ação do Conselho representa a “proclamação da República no Judiciário”.


A série de reportagens, intitulada “Dossiê Estado – Raio X do Judiciário”, prossegue nesta segunda-feira com mais revelações.


Um dos relatos revela os casos de juízes que praticavam uma espécie de estelionato judiciário.


Esses magistrados julgavam ações de indenização durante plantões de fim de semana, determinando o pagamento imediato, em espécie, aos reclamantes, o que levou até mesmo ao arrombamento de um banco para a retirada de dinheiro.


Segundo a reportagem, a maior punição administrativa que um juiz pode sofrer é a aposentadoria compulsória, com vencimentos proporcionais.


O esforço de reportagem do Estado de S.Paulo é tudo que se espera de um bom jornal.


A decisão de divulgar o pente-fino sobre as mazelas do Judiciário só pode merecer a admiração de seus leitores.


Convém apenas atentar para as motivações do jornal: será que o Estadão não estaria dando o troco para a demora da Justiça em suspender as restrições à publicação de reportagem sobre a família Sarney, que o Estadão considera censura?


A mídia partidária


Alberto Dines:


– Para  exibir sua isenção e objetividade, a grande mídia deu neste fim de semana bastante destaque ao conflito entre a Casa Branca e o canal de notícias americano Fox News. Algumas análises sobre o caso apareceram ao lado da ofensiva da Casa Rosada contra a mídia argentina como se se tratasse de episódios similares. Veja, como sempre, foi mais longe e classificou como “ridícula” a disposição de Barack Obama em enfrentar o magnata Murdoch.  Nossa imprensa mais uma vez exibe o seu potencial de simplificação e generalizações, sempre de olhos em comparações.


Em primeiro lugar é preciso ter em conta que a imprensa americana é muito diversificada, há veículos liberais e progressistas, há reacionários agressivos e há conservadores equilibrados. Portanto, se a Casa Branca reage à histeria de um canal de extrema direita está no seu legítimo direito. Ruim seria se o presidente americano investisse contra a mídia em geral como tem acontecido com muita freqüência no hemisfério sul.


O que está acontecendo neste momento na mídia brasileira no tocante a Obama é uma reação concatenada contra certas opções políticas adotadas pelo governo americano que o lobby brasileiro considera “esquerdistas”. Exemplo: as “intervenções brancas” na indústria automobilística e bancária e o novo sistema de saúde pública, ambos fortemente estatizantes. Mas qual seria a opção da grande mídia brasileira – deixar que os bancos e as montadoras de Detroit falissem? Quem teria condições de reverter o caos dos serviços médicos americanos, os planos de saúde privados?


É evidente que a Casa Branca não está minimamente interessada na reversão das posições da mídia brasileira que trocou rapidamente o entusiasmo anterior por um ceticismo militante contra Obama. Esta reversão, porém, interessa a nós, leitores, ouvintes e telespectadores brasileiros condicionados por critérios originários no mundo de ontem. O principal aporte  do presidente americano é a sua disposição de abandonar os parâmetros da Guerra Fria que vigem há 64 anos, desde 1945. Nossa mídia ainda aposta neles: além de conservadora, está muito atrasada.