Crise nos aeroportos
Alberto Dines:
– Qualquer que seja o nome adotado para designar o problema em nossos aeroportos, a verdade é que este problema não foi resolvido mesmo que ontem não tenha se repetido o caos da última quinta feira. Os operadores de vôo designam o seu movimento como “operação padrão”, alguns jornais preferem o apelido dramático, “apagão aéreo”, numa alusão ao black-out no governo FHC e os comentaristas políticos examinam o episódio como uma crise político-militar.
Convém não esquecer que tudo começou imediatamente depois da tragédia do Boeing da Gol. Enquanto parte da mídia embarcava um tanto ou quanto levianamente no pré-julgamento dos pilotos do Legacy, ninguém reparou que um controlador de vôo que servia na torre de Brasília na hora da tragédia pediu para ser internado, vítima de uma crise nervosa. Depois, dez outros recusaram-se a depor no inquérito sobre o desastre alegando razões médicas e, em seguida, começou a “operação padrão”.
A Folha de S.Paulo antecipou-se aos demais jornais e sugeriu claramente que a queda do Boeing tem relações diretas com o movimento dos controladores. Uma coisa é certa: aqui não cabem ilações nem cabem suposições. São 150 famílias que ainda não tiraram o luto. Melhor esperar pela opinião dos técnicos.
O poder de criação dos leitores
– O diretor de Redação da revista Época, Helio Gurovitz, fala dos desafios trazidos por mudanças tecnológicas para a mídia tradicional.
Helio:
– O que aconteceu nos últimos anos é que houve um barateamento muito grande na produção de conteúdo. Hoje qualquer um, em casa, pode fazer, se quiser, uma revista, um jornal, um blog, um pequeno clipe, botar na internet. Isso representa um desafio enorme para a mídia tradicional. E ao mesmo tempo é uma oportunidade. O cidadão, que antes se limitava a consumir o produto, pode hoje participar da produção desse produto. E talvez o grande desafio diante do qual estão os meios de comunicação hoje é como aproveitar esse poder de criação, de geração de conteúdo que hoje está disseminado entre milhares de pessoas. Existem vários exemplos positivos de coisas que estão feitas hoje. Talvez o mais eloqüente seja a Wikipedia, que é uma enciclopédia feita na internet com a colaboração de milhares de pessoas, e que tem uma qualidade excepcional. Virou uma fonte de consulta de referência. No futuro a mídia vai ser bem diferente do que é hoje, e acho que essa transformação só começou.
Mauro:
– Helio Gurovitz apresenta os atributos que a equipe sob seu comando procura seguir.
Helio:
– A gente costuma falar aqui na Época em três is: independência – a gente tem que ser independente das correntes políticas, a gente tem que contemplar todas as correntes de opinião, ser o mais pluralista possível; inovador e interativo. Interativo significa não uma noção tecnológica, mas significa trazer o leitor para dentro da revista. A gente tenta seguir essas três coisas, e evidentemente a principal é a inovação. Porque o que tem cheiro de pão adormecido ninguém quer. Ninguém quer comer. E inovar significa enxergar coisas novas que não necessariamente foram vistas. Não significa ter idéias geniais ou revolucionárias.
Mauro:
– Acima de tudo, para o diretor geral da Época, existe o desafio de fazer um trabalho de qualidade, desde as grandes linhas até os menores detalhes. Nem sempre o que vigorou nas redações nos últimos anos.
Helio:
– Um outro grande desafio para todo jornalista e para todo produtor de conteúdo, hoje, é o desafio da qualidade. O leitor é muito inteligente. E ninguém deve querer enganá-lo. A gente tem que procurar fazer as melhores matérias, textos primorosos, fotos excelentes, excepcionais, legendas, títulos, pautas, procurar sempre pautas originais. E qualidade também no que se refere à independência. Independência de qualquer tipo de interesse, inclusive dos interesses da área comercial da empresa. O que existe hoje no mundo é um retorno àqueles valores básicos, aquilo que se chamava de “separação entre a Igreja e o Estado”. É fundamental que não tenha nenhuma interferência no conteúdo que é produzido. Porque o leitor não é burro. Ele percebe. Ele é dotado de um saber às vezes muito maior do que o nosso. Tem que ser humilde, e respeitoso, e estabelecer uma postura de diálogo com o leitor.