Um Brasil menos desigual
O Estado de S.Paulo produziu um caderno especial, o Globo destacou quatro páginas ao assunto e a Folha de S.Paulo dedicou um caderno extra de Cotidiano para falar da nova edição da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio, divulgada ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.
‘Um Brasil menos desigual’, o título escolhido pelo Globo, é o que melhor reflete os dados apresentados na pesquisa, que revela a queda recorde da diferença entre pobres e ricos no País.
No entanto, os três jornais destacam que os indicadores sociais e econômicos evoluem lentamente.
O interesse da imprensa pelo retrato do Brasil, na pesquisa divulgada hoje, apresenta algumas diferenças em relação às versões anteriores.
Os dados são apresentados sem a conotação política que marcou outras edições, como se os jornais estivessem se rendendo às evidências de que as notícias são realmente boas.
Os relatos que as edições de hoje oferecem mostram um quadro de evolução em todos os indicadores, mas observam que o avanço social ainda é tímido em relação às necessidades do País.
Mas os jornais ainda se prendem ao Produto Interno Bruto como principal indicador de desenvolvimento social.
A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio, que desde 2004 cobre todo o território nacional, é considerada como a fonte mais confiável para a análise dos resultados sociais do desenvolvimento da economia.
Por exemplo, os dados sobre a persistência das grandes diferenças de renda nas regiões de forte predominância da atividade agropecuária podem estar apontando a necessidade de mudanças na economia rural.
O problema é que a imprensa só dá atenção a esse retrato do Brasil no dia em que ele é divulgado.
Se os editores mantivessem à mão esse mapa, poderiam utilizá-lo como uma fonte rica para pautas interessantes durante todo o ano.
A mãe de todas as crises
Os jornais especializados começam a enxergar os vícios que conduziram a economia global à sua grande crise.
Mas ainda falta analisar a responsabilidade da imprensa.
Alberto Dines:
– Não são muitos os países que exibem em seus quadros de altos executivos um jornalista-banqueiro. O Brasil tem este privilégio e Alcides Amaral, ex-presidente do Citibank, diplomado em jornalismo pela Cásper Líbero, mostrou ontem na página A-12 de Valor Econômico, os seus duplos atributos com uma análise contundente da crise financeira.
Fala-se muito em crise sistêmica, mas o nosso jornalista-banqueiro aponta as falhas humanas, como principal responsável pela catástrofe. Segundo Alcides Amaral, as falhas começaram com as agências de ratings – os radares do sistema que não conseguiram entender o que se passava antes e depois do estouro da bolha hipotecária em fevereiro de 2007.
A principal acusada por Alcides Amaral é a ‘a filosofia do bônus que imperou de forma irresponsável por todo o sistema financeiro. Bônus de milhões de dólares para aqueles mágicos que estavam gerando expectativa de lucros fabulosos para as suas instituições’.
A irresponsável ‘filosofia do bonus’ subverteu as normas de trabalho, salários eram ínfimos se comparados com as bonificações, ninguém pensava no ano seguinte apenas no balancete do fim do mês. O bônus criou uma euforia que se ajustava muito bem ao ciclo de prosperidade da economia mundial.
Nosso colega, porém, não discute o papel da mídia na crise. Nós podemos dizer que a mídia falhou ao abandonar sua função crítica, preferiu pegar carona na bolha imobiliária. Para vender ou comprar imóveis é preciso anunciar imóveis, financiamentos e créditos generosos.
Qual o jornalista americano que teria a coragem de ligar o alarme no meio do fantástico faturamento do seu veículo com publicidade imobiliária? O resultado é esta reprise do crash de 1929.
Alcides Amaral foi presidente do Citibank S/A, da ABBI -Associação Brasileira de Bancos Internacionais e é jornalista formado pela Faculdade de Jornalismo Cásper Líbero. É autor do livro ‘Os limões de minha limonada’