O ‘novo paradoxo do jornalismo’ reportado no relatório anual The State of the News Media 2006, do Project for Excellence in Journalism, ligado à Escola de Jornalismo da Universidade de Colúmbia – segundo o qual cresceu em 2005 o número de títulos, que no entanto estão cobrindo menos assuntos e com menor profundidade – coloca diante de nós, fazedores e observadores da imprensa, uma questão crucial: estamos, afinal, caminhando para o fim do jornalismo que conhecemos, e que ajudou a construir as modernas democracias do Ocidente?
Os elementos dessa equação estão postos. As antigas famílias proprietárias dos meios estão deixando a gestão de suas empresas, quando não as estão entregando para os credores. Os grandes conglomerados de mídia, que nos últimos dez anos se revelaram autênticos predadores, engolindo redes inteiras de jornais, cadeias de rádio e TV, portais e tudo que parecia apetecível ao capital, estão se defrontando com a dura realidade. (Leia a manifestação do anticristo do jornalismo, Rudolph Murdoch, neste Observatório, sobre o jornalismo fast-food).
Os lucros continuam caindo, o público migra para o ambiente digital, onde não há receita suficiente para saciar o apetite do capital, os leitores mais fiéis, concordes com a natureza humana, envelhecem e morrem.
Quem vai fazer?
Nesse rumo, o capital se desinteressa daquilo que costumamos chamar de jornalismo. Já é muito claro que os grandes conglomerados praticam com mais gosto aquilo que em inglês se chama infotainment – a mistura de informação e entretenimento que usa jargões do jornalismo para se revestir de certa seriedade. Em escalas variáveis, encaixam-se nesse padrão o Programa do Jô, o Programa do Ratinho, a revista Veja, os programas de ‘debates’ sobre futebol, as publicações voltadas para o consumo de luxo. Sem a presença das tradicionais famílias, que aos poucos perdem espaço nesse ambiente, e com as gigantes do setor se desinteressando do jornalismo de qualidade, onde ele irá acontecer?
Os blogs, salvo algumas exceções, ainda são território para autolustração de egos mais ou menos bem equipados de conteúdo. Os jornais gratuitos ainda se prendem a funções de serviços e não aceitam o desafio do jornalismo de maior risco, aquele que também implica maior responsabilidade social. As emissoras comunitárias de rádio e TV resistem a buscar um padrão profissional aceitável; as emissoras universitárias não têm recursos nem mentalidade, nem mesmo estão vocacionadas para esse papel.
Estamos vendo crescer e se consolidar uma mídia cada vez com menos jornalismo. Com tantos demônios para exorcizar, a sociedade humana talvez nunca tenha necessitado tanto de uma imprensa séria, independente, socialmente engajada e intelectualmente ambiciosa como a sociedade contemporânea. Quem vai fazer esse jornalismo essencial? Quem ensinará os futuros profissionais de imprensa? Haverá ainda uma imprensa que possamos qualificar como tal?
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Jornalista