Na semana passada, falamos do novo jornal que elimina o distanciamento de 24 horas do leitor, utilizando-se da tecnologia da internet não como versão eletrônica do veículo impresso, mas como sua extensão, a partir da chegada às bancas [ver remissão abaixo]. Seria como uma Folha de S. Paulo que está na banca continuando indefinidamente a atualizar os assuntos nela contidos – e outros que dela não constam – num processo de seqüência que eliminaria o distanciamento dos leitores, que neste momento sofrem todos os jornais.
O grande problema, hoje, é a queda nas vendas dos jornais brasileiros (da mesma forma que no mundo todo): 18% somente de 2000 a 2003. A previsão funesta do professor americano Philip Meyer é de que os jornais morrerão no ano de 2043. Se no Brasil vendemos 45 jornais para cada grupo de 1.000 habitantes e nos Estados Unidos, 196 leitores para 1.000, conforme estudo do jornalista Caio Túlio Costa, apresentado aqui no OI [ver remissão abaixo] está claro que superando este distanciamento inadmissível, hoje, de 24 horas dos leitores, teremos compradores de jornais a conquistar.
Um exemplo é o da Reuters, pequena agência internacional de informações nos anos 60 e 70, que hoje virou um complexo de comunicações que inclui a Reuters Know Now. Enquanto a United Press International, gigante do mercado, se preocupava apenas em ampliar a cobertura mundial, a Reuters foi muito além: preocupando-se também e principalmente com a expansão do telejornalismo, fez grandes investimentos em filmes e vídeos noticiosos; mais recentemente voltou-se para a informática, tornando-se também uma das principais fornecedoras de sistemas informativos, como o de bolsa de valores e mercado de ações. A Reuters domina o mercado noticioso internacional e atua não só no fornecimento de notícias, fotos e filmes, mas na área de sistema de informação.
O jornal O Globo embarcou na aventura da televisão, em 1965, criando a TV Globo, no Rio de Janeiro, depois em São Paulo, precursora da atual Rede Globo. Depois, nos anos 90, veio a TV a cabo e a por satélite e a Globo entrou de cabeça, pensando que o novo sistema avançaria rapidamente, o que não aconteceu. A Folha de S.Paulo viu na internet o futuro, e não só criou um dos primeiros provedores no país, como deu início a um processo de consolidação, fundindo-o com o similar da Editora Abril, criando o UOL que hoje conhecemos.O UOL, a cada ano, para manter a liderança, precisa se expandir mais e mais, necessitando de centenas de milhões de dólares. Foi por esta razão que a Folha foi buscar um parceiro forte nos últimos anos, a Portugal Telecom. A única certeza para os próximos anos é a necessidade de novas expansões e novos investimentos. Até o dia em que a internet explodir de vez como sucessora dos meios de comunicação ora existentes e os investidores serem premiados com os altos lucros que o negócio promete.
Visão de futuro
Enquanto as empresas jornalísticas apostam no ramo televisivo e na internet, os jornais vivem apenas o dia-a-dia. Não se tem notícia de que estas empresas de mídia estejam desenvolvendo algum projeto futurista para os jornais, a não ser mudanças gráficas e editoriais, projetos do cotidiano. O investimento no futuro próximo está sendo relegado.
Investir nos jornais para que recuperem os leitores perdidos nos últimos anos e avancem ainda mais neste sentido, senão mais justo, com certeza mais seguro e vantajoso seria. Em primeiro lugar, porque os jornais já têm leitores consolidados e em número suficiente que fazem dele um negócio rendoso. E qualquer aposta não seria uma aventura e sim a consolidação e expansão (razoalmente possível) de leitores. Em segundo, estaria combatendo de forma efetiva o problema da queda de vendas dos jornais e, em última instância, salvando a própria ‘galinha dos ovos de ouro’. E ainda haveria uma terceira razão: o investimento no jornal traz menos riscos que em áreas desconhecidas, que são as mídias novas que as empresas estão desenvolvendo. Não estamos, evidentemente, apregoando o cancelamento dos investimentos em televisão e internet, mas demonstrando que para serem coerentes estas empresas jornalísticas não podem deixar de lado o carro-chefe atual, que é o jornal.
O jornal impresso parece estar perfeitamente sintonizado com nosso tempo, não só pelo parque industrial das empresas que os editam, como pelos avanços éticos, amplamente aceitos pelas redações. Ao contrário, gostaríamos de mostrar aqui o quanto os jornais estão fora de época, do ponto de vista do time e posicionamento do veículo em seu contexto. Começando por entender que as diferenças de qualidade de um jornal para outro, seja de impressão, de corpo editorial, de distribuição e atendimento de clientes são apenas ‘os ingressos para entrar no baile’. O que resta, portanto, é a visão de futuro do empresário e sua disposição de segui-la. Veja o que aconteceu com os bancos neste mesmo período: o caixa eletrônico, depósito e saque eletrônicos, pagamento de contas eletrônico e todas as operações pela internet. Outras empresas também entraram nesta revolução. E sabemos que no futuro praticamente tudo será movido a eventos, ou seja, cada ocorrência terá uma resposta online da empresa.
Apenas adequação
Tendência dos tempos atuais, o leitor está ávido de participação, em forma de sugestão e comentário, e não pode ser frustrado. Determina a regra do marketing que a empresa deve se antecipar aos anseios dos clientes. E a empresa jornalística tem que recuperar o tempo perdido, com investimentos para permitir a participação efetiva dos leitores na realização do jornal. Uma reclamação na seção do ‘direito do consumidor’ deveria estar publicada em 2 ou 3 horas, e não entrar na fila para sair depois de dias. Além de estar publicada em seguida, a resposta da autoridade deveria também ser dada logo após a publicação, dando chance mesmo ao reclamante de fazer sua contra-resposta, dinamizando totalmente esta prestação de serviço. É o mínimo que se pode esperar da imprensa dos tempos atuais, em conformidade com o sistema bancário. Vale lembrar que o jornal, que sempre lidou com sistemas de informações, na era da informação não poderia ficar na posição em que está, na retaguarda do mercado.
É um mal das empresas de comunicação investir no futuro fantástico, mas não no futuro dos seus próprios veículos? A Rede Globo é outro exemplo: saiu na frente, na década passada, implantando a TV a cabo e sua concorrente direta, a TV por assinatura no sistema antena. A resposta ao lançamento foi um grande número de assinantes, mas o crescimento esperado não veio, comprometendo planos de expansão e de investimentos, criando uma dívida para a Globo que alcançou a casa dos bilhões de dólares. Enquanto isso, a própria Globo, empresa lucrativa e líder no segmento de televisão no país, não teve o mesmo tratamento.
Lembrando mais uma vez que investimento no futuro não é aquisição de novos equipamentos, mesmo os digitais, nem investida em projetos do cotidiano. O futuro da mídia é o público, leitores e espectadores, seu comportamento de aquisição de mídia e o que isto representa para estes veículos e as oportunidades que estão aí embutidas. Pesquisas e adaptações em função das respostas não é futuro, apenas adequação. O importante é subir a escada de 90 graus, e não uma simples rampa de 15%. O futuro é novo veículo de comunicação, com base neste atual e não na tecnologia apenas. Esta última inclusive é suporte para este futuro.
Mais veloz
O leitor que vê estampado em seu jornal o resultado do jogo da seleção brasileira, ontem à noite, e os detalhes da partida, agora pode estar querendo saber dos jogadores na manhã de hoje, como estão, para onde foram, quais são suas atividades programadas etc. Ele vai encontrar tudo isso na seqüência do jornal, em tempo real na internet (além daquela versão do jornal impresso, que praticamente todos os grandes títulos têm na internet). Porque a cada minuto a realidade muda e muda também na cabeça do leitor (assim como do espectador), e a notícia de ontem está velha demais, embora possa estar sendo curtida ainda. O leitor quer mais, quer as últimas informações sobre o assunto, quer agora, quer em tempo real ou no mínimo próximo a isso. Quanto vai custar para o jornal chegar a este ponto?
O grande obstáculo que veículos novos, como a internet, encontram em sua plena aceitação é a questão cultural. A internet traz sem dúvida um canal de pesquisa e de informações cada vez mais aceito pelos usuários. Entretanto, quando se trata de jornal, revista, livro e mesmo televisão, a cultura que estes veículos tradicionais criaram representa um obstáculo muito grande para a internet se consolidar totalmente. Quando a rede passa a ser um instrumento do jornal, na comunicação deste com o leitor após a saída da edição impressa, também vai encontrar esta barreira cultural.
Entretanto, o leitor também terá uma opção para se satisfazer plenamente: imprimir ele próprio as notícias que lhe vão interessando. Evidentemente, não estamos falando mais na forma que se imprime hoje o que queremos tirar da internet. Mas um modelo próprio deste projeto futurista. Um modelo que se compatibilize plenamente com esta idéia de seqüência do jornal impresso. Este conceito muda totalmente a situação – o jornal continuará um meio impresso, só que aqui quem imprime é o próprio leitor. Temos um jornal impresso de 50 páginas e uma série de outras páginas, que saíram da redação e chegaram ao leitor pela internet e que este se dispôs a imprimir. A edição internet-impresso pode ser uma boa saída para vencer a resistência de barreiras culturais e ao mesmo tempo manter o princípio do jornalismo impresso. Agora, muito mais veloz.
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Jornalista