Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Sócrates para prefeito

Como não me apaixonar por Sócrates? Quero Sócrates para prefeito, governador e presidente. Inteligente, irônico, ótimo papo, tolerante e ao mesmo tempo inflexível. Nunca fazia promessas. Queria apenas uma oportunidade para pensar em diálogo.

O filósofo ateniense era homem simples. Pessoa normal (tão normal que todo mundo estranhava). Não fez milagres, não solicitou seguidores, não fundou religiões. Sequer tinha a pretensão de escrever um best-seller. Se Sócrates fosse ao programa do Jô Soares, crivaria o entrevistador de perguntas, pois perguntar era seu passatempo preferido.

Dizem que Sócrates era parecidíssimo com o ator suíço Michel Simon (1895-1975). Vale a pena contemplar o rosto do possível sósia do maior pensador ocidental em (http://amichelsimon.free.fr). Porque Sócrates também atuava no palco da vida cotidiana. Interpretava o papel de um homem sábio que nada sabia.

Sócrates se casou duas vezes, e teve três filhos. Nietzsche dizia que nenhum genial filósofo havia se casado (Heráclito, Platão, Spinoza, Leibniz, Kant, Schopenhauer, ele mesmo, Nietzsche…), mas que Sócrates, o ‘malicioso’ Sócrates, uniu-se a uma mulher para mostrar o que um grande filósofo jamais deveria fazer.

Cidade arrependida

Sócrates veio quatro séculos antes de Cristo, seu irmão. Erasmo, o renascentista, o considerava um santo. Tomás de Aquino afirmava que Sócrates recebera a inspiração divina.

Sócrates foi soldado exemplar. E se tivesse nascido entre nós talvez gostasse de jogar futebol, como o seu xará, exímio cobrador de pênaltis. O filósofo também chutava, mas era o balde da arrogância, e goleava quem se considerasse invencível.

Sócrates, na prefeitura, não saberia administrar tão bem quanto conversar, mas em compensação sairia pelas ruas todos os dias, perguntando o que é a justiça, o que é o amor, o que é o que é, experimentando as nossas convicções, cutucando a nossa consciência.

Julgamento de Sócrates. No primeiro escrutínio, 220 votos o inocentavam, 280 o condenavam à morte. Houve uma segunda chance. O réu não se rende, irrita até mesmo os que o tinham livrado da sentença capital. Segunda votação: 360 contra, apenas 140 a favor de sua inocência. O filósofo morrerá de morte filosófica, pensando numa vida pós-túmulo na companhia de Homero e Hesíodo.

Sócrates pouco se interessava pelos negócios públicos. Por isso daria um ótimo político. A cidade que o matou se arrependeu dias depois e promoveu luto oficial. Atenas sacrificou seu mais ilustre filho, como quem assassina um profeta, ou um excelente prefeito.

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Doutor em Educação pela USP e escritor