Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

O choque da transição da imprensa para o digital

(Imagem de Victoria por Pixabay)

Os tempos mudam. Houve uma época em que um ciclista passava diante das casas e jogava o jornal do dia para os assinantes, enrolado com um elástico. Me lembro de meu pai saindo para buscar o leite e o pão e voltando com o jornal do dia, enquanto minha mãe preparava o café.

Isso acabou. A quase totalidade dos que leem jornal utilizam o celular ou o computador. Uma enorme economia de papel com a desativação das enormes impressoras, seguida de demissões no setor gráfico. Uma realidade mundial, cuja consequência é o fechamento de jornais ou, numa fase inicial, a diminuição de suas tiragens.

Essa transição acaba de ocorrer aqui na Suíça com o grande grupo de imprensa Tamedia. Iniciado em 1893, o grupo cresceu e se estendeu pelos cantões suíços, criando e editando os jornais mais lidos do país. Para se entender sua importância cultural e mesmo política, deve-se lembrar que a população suíça tem uma excelente formação escolar proporcionada pelo país. O hábito da leitura, não só de jornais como de livros, faz parte do cotidiano da população.

Dentro desse quadro favorável à expansão, o grupo criou três grandes centros gráficos abastecendo a Suíça em jornais, livros e impressos. Até chegar à transição digital, implicando na redução para um só centro gráfico e diminuição de tiragens dos jornais, mesmo porque muitos assinantes preferem ter acesso à edição online. Para se ter uma ideia, estão ligados direta ou indiretamente aos produtores impressos do grupo Tamedia cerca de 5,5 milhões de pessoas, num total de cerca de quase 9 milhões de habitantes.

As economias com essa transformação devem ser direcionadas para o futuro digital, mas fazem vítimas entre os gráficos e entre os jornalistas e o pessoal ligado à imprensa tradicional. O primeiro corte é da ordem de 20% no pessoal. Os mais jovens saberão se adaptar e encontrar variantes no mundo digital, os outros sofrerão o choque. Esse choque será mais doloroso para os profissionais da Suíça francesa, onde a transição do papel para o digital é mais lenta que na Suíça alemã.

É difícil de se imaginar, mas dois importantes centros de impressão serão desativados e terão suas rotativas imobilizadas, enquanto cerca de 150 gráficos perderão seu emprego, seguidos por mais 50 trabalhando nas redações dos jornais com páginas e tiragens diminuídas. Felizmente essa transição não será imediata e está prevista para ser concluída em 2026.

Com a existência de um único centro de impressão em Berna, os jornais da região de Zurique e Genebra terão que concluir suas edições diárias, fechar mais cedo, no jargão jornalístico, para assegurar o transporte e distribuição dos jornais para os assinantes e centros de venda de venda de jornais, revistas e impressos em geral. Como já ocorre, os assinantes dos jornais online já têm acesso à edição atualizada depois do fechamento da edição destinada à impressão.

A direção de Tamedia, junto com seu plano de transição, assegurou seu objetivo de seguir as inovações da mídia no mundo digital sem perder em termos de jornalismo de qualidade. Depois de 20 anos de adaptações aos modelos de informação, a direção de Tamedia diz ter chegado o momento de mudanças radicais.

Em todo mundo, os grandes grupos de mídia vão se adaptando à transformação digital de seus veículos de informação. Isso também inclui a edição de livros em versões digitais. As salas de cinema sofrem igualmente o impacto da individualização da visão dos filmes por streaming, com consequências num redimensionamento e na importância dos festivais.

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Rui Martins é jornalista, escritor, ex-CBN e ex-Estadão, exilado durante a ditadura. Criador do primeiro movimento internacional dos emigrantes, Brasileirinhos Apátridas, que levou à recuperação da nacionalidade brasileira nata dos filhos dos emigrantes com a Emenda Constitucional 54/07. Escreveu Dinheiro sujo da corrupção, sobre as contas suíças de Maluf, e o primeiro livro sobre Roberto Carlos, A rebelião romântica da Jovem Guarda, em 1966. Foi colaborador do Pasquim. Estudou no IRFED, l’Institut International de Recherche et de Formation Éducation et Développement, fez mestrado no Institut Français de Presse, em Paris, e Direito na USP. Vive na Suíça, correspondente do Expresso de LisboaCorreio do Brasil e RFI.