Silvio Santos assustou o Brasil em julho de 2003. Em uma entrevista concedida à revista Contigo, afirmou estar muito doente e ter vendido o SBT. Dias depois, desmentiu as informações. Sua intenção foi apenas brincar com a repórter, não acreditando que ela pudesse vir a publicar as bobagens reveladas. O homem do Baú (mesmo tendo vendido o Baú!) não acredita em jornalistas, esquiva-se de entrevistas, não frequenta nem os programas de sua emissora. Confiança mesmo só nas suas colegas de trabalho e no seu público.
O pouco que sabemos do homem Silvio Santos se revela no artista que há 60 anos anima os domingos brincando, dançando, cantando e, o mais importante, ofertando a ilusão da felicidade ao alcance de todos. É assim que o animador e empresário alimenta o seu público: oferece a possibilidade de ser feliz e ter acesso a bens simbólicos, a chance de ganhar uma geladeira, um tênis ou um milhão de reais. Sua figura simpática simboliza sorte e alegria. Ele é o mais competente comunicador da televisão brasileira mesmo aos 90 anos e dizendo bobagens.
De camelô a dono de uma das maiores redes de televisão da América Latina, construiu para si um estilo próprio e inconfundível. Resolve os problemas por conta própria, não perde a voz de comando nos negócios nem no palco. Se a novela está com índices ruins na audiência, ele encurta os capítulos e tira do ar. Se o artista contratado a peso de ouro não se sai bem, coloca na geladeira. Num mercado competitivo em que cada passo é planejado, o jeito que Silvio encontrou para dirigir sua emissora parece descabido. Mas não é.
Silvio Santos tem duas paixões: audiência e lucratividade. São dois desejos compreensíveis, visto ser um comerciante nato e um apaixonado pelo grande público. Silvio busca a audiência, quer o público animado, feliz com aquilo que assiste na televisão. Por isso sua figura é tão popular. Busca dar ao povo o que pensa que este deseja. Por outro lado, nem sempre aquilo que se deseja é o ideal, especialmente em se tratando de uma força de comunicação social como a televisão.
O espírito de Silvio Santos e o seu legado para a televisão brasileira estão expressos há muitos anos nos versos da canção de abertura de seu programa dominical, que de tão eternizado no imaginário sequer sabemos se ainda está no ar ou não: “Agora é hora de alegria, vamos sorrir e cantar. Do mundo não se leva nada, vamos sorrir e cantar. Silvio Santos vem aí”.
A simplicidade dos versos reflete a simplicidade de Silvio, sua espontaneidade e vínculo com a cultura popular. Contudo, será fácil fazer sorrir milhões de brasileiros por seis décadas todos os domingos? Essa façanha exige competência, criatividade e paixão pelo que se faz. Enquanto houver paixão, alegria por brincar e sonhar, haverá Silvio Santos aos domingos, na memória dos brasileiros e na história da televisão.
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Alexander Goulart é jornalista e doutor em comunicação pela PUCRS