Cerca de duas horas depois da divulgação dos atentados de terça-feira (22/03) em Bruxelas, apareceu um vídeo no YouTube, sob a alegação de que seriam imagens do circuito fechado de televisão (CCTV), mostrando uma explosão no aeroporto Zaventem, da cidade. As imagens rapidamente se espalharam pelas redes sociais e foram divulgadas por alguns dos principais sites de notícias. Depois desse, surgiu outro vídeo, supostamente mostrando uma explosão na estação de metrô Maelbeek, próxima ao Parlamento Europeu, e ainda um outro, alegando ser do aeroporto.
Entretanto, nenhum dos vídeos era o que alegava ser. Os três vídeos eram gravações de 2011, dois de um atentado ao aeroporto Domodedovo, de Moscou, e um de uma bomba que explodiu numa estação de metrô de Minsk, capital da Belarus. Veja abaixo o video original do aeroporto de Domodedovo divulgado agora como se fosse no aeroporto de Bruxelas:
https://youtu.be/t2HwfqKMaSM
As imagens distorcidas dos clipes do circuito fechado de televisão foram convertidas de cor em preto e branco, horizontalmente invertidas, novamente etiquetadas e postadas como se tivessem surgido dos acontecimentos do dia. Embora a conta do YouTube que compartilhou as imagens com falsos objetivos tenha sido rapidamente tirada do ar, outros veículos as reproduziram dizendo que eram de Bruxelas.
Os vídeos ilusórios são exemplos de um fenômeno que vem se tornando cada vez mais comum em quase todas as matérias importantes que tratam de acontecimentos violentos e que ocorrem rapidamente. Reportagens falsas ou ilusórias espalham-se rapidamente pelas redes sociais e são acessadas por organizações jornalísticas respeitáveis, confundindo ainda mais um quadro já incrivelmente confuso.
Outro exemplo ocorreu apenas alguns dias antes em reportagens sobre um homem-bomba em Istambul, quando vários veículos publicaram uma foto que circulava no Twitter e dizia tratar-se do suspeito Mehmet Ozturk, quando na realidade nenhuma foto fora divulgada. Alguns veículos chegaram a incluir uma foto de uma carteira de identidade, a qual identificava a foto da pessoa no tweet, acertadamente, como Mohammed Zana, um suposto militante do Estado Islâmico.
Durante os atentados de Paris no mês de novembro, circularam fotos que alegavam ser da cena dos ataques e, na realidade, eram dos tiroteios na redação do Charlie Hebdo, em janeiro de 2015. Imagens de um espetáculo realizado dois dias antes, em Dublin, Irlanda, pelo grupo Eagles of Death Metal foram compartilhadas sob a alegação de serem do espetáculo da noite que militantes do Estado Islâmico atacaram a sala de espetáculos Bataclan, matando 89 pessoas morreram.
As pressões são muitas
A disseminação e divulgação de falsas informações não têm nada de novo, mas a internet tornou mais fácil plantar matérias e provas falsas e ilusórias, que serão amplamente compartilhadas pelo Twitter e pelo Facebook.
Alastair Reid, editor administrativo [ou subeditor] do site First Draft, que é uma coalizão de organizações que se especializam em checar informações e conta com o apoio do Google, disse que parte do problema é que qualquer pessoa que publique em plataformas como o Facebook tem a capacidade de atingir uma audiência tão ampla quanto aquelas que são atingidas por uma organização jornalística. “Pode tratar-se de alguém tentando desviar propositalmente a pauta jornalística por motivos políticos, ou muitas vezes são apenas pessoas que querem os números, os cliques e os compartilhamentos porque querem fazer parte da conversa ou da validade da informação”, disse ele. “Eles não têm quaisquer padrões de ética, mas têm o mesmo tipo de distribuição.”
Nesse meio tempo, a rápida divulgação das notícias online e a concorrência com as redes sociais também aumentaram a pressão sobre as organizações jornalísticas para serem as primeiras a divulgar cada avanço, ao mesmo tempo em que eliminam alguns dos obstáculos que permitem informações equivocadas.
Uma página na web não só pode ser atualizada de maneira a eliminar qualquer vestígio de uma mensagem falsa, mas quando muitas pessoas apenas se limitam a registrar qual o website em que estão lendo uma reportagem a ameaça à reputação é significativamente menor que no jornal impresso. Em muitos casos, um fragmento de informação, uma fotografia ou um vídeo são simplesmente bons demais para checar.
Alastair Reid disse: “Agora talvez haja mais pressão junto a algumas organizações para agirem rapidamente, para clicar, para ser a primeira… E há, evidentemente, uma pressão comercial para ter aquele vídeo fantástico, aquela foto fantástica, para ser de maior interesse jornalístico, mais compartilhável e tudo isso pode se sobrepor ao desejo de ser certo.”
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Jasper Jackson é editor-assistente da versão eletrônica do jornal The Guardian