Monday, 04 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1312

Até onde caminhar com nossa imbecilidade?

O primeiro mês do ano em que o mundo acabará teria tudo para ser algo insosso, comum aos janeiros. Entretanto, este janeiro ratifica que o fim do mundo está próximo ou é bem possível que o mundo já tenha até acabado e nós não nos demos conta disso.

Após Michel Teló ter sido elevado ao panteão da cultura brasileira pela revista Época, a sociedade tupiniquim passou a semana discutindo dois assuntos de suma importância para o crescimento e a soberania nacionais. O que será feito para as próximas chuvas não matarem mais pessoas? Não! Como serão as composições políticas para as eleições municipais de outubro já com a reforma ministerial prometida pela presidente Dilma Rousseff? Não! Como o Brasil crescerá economicamente diante da eurocrise? Não!

A sociedade nacional foi compelida a discutir sobre um possível estupro na casa do BBB e todos conhecemos Luíza, aquela que estava no Canadá. É bem provável que eu esteja ficando (ainda mais) rabugento devido à idade, mas fico imaginando como a mídia hegemônica tem a capacidade de criar fatos ou “memes” para desviar a atenção das pessoas sobre assuntos que efetivamente importam.

Híbrido de BBB e CSI

Alguns amigos perguntaram-me, ao longo da semana, o que eu achava do “suposto estupro” no BBB. Inicialmente, nego-me a falar sobre lixo, mas tudo é possível vindo da emissora que patrocina a atração. Para a Globo, que já manipulou eleições e que já derrubou ministros, o que seria um estupro para quem já f… (me perdoem a palavra) o país? Sua programação é voltada para a mumificação de pessoas e consequente extração do cérebro e da capacidade de raciocínio.

O episódio do estupro, em si, parece-me mais uma jogada de marketing. Caso o fato tenha sido consumado, deveria existir uma investigação dentro do que está escrito lá no Código Penal. E se aqui fosse um país sério, a atração teria sido tirada do ar, todos os participantes, o apresentador e os demais envolvidos seriam intimados a depor, inclusive e obviamente, o possível criminoso.

Parece, porém, ter sido tudo de mentirinha. Sabe como é: programa cansativo e repetitivo. Ibope em queda. O que fazer? Inventar algo escandaloso. O dinheiro paga tudo porque o Ibope sobe e depois aparecem aquelas desculpas esfarrapadas que evaporam na memória curta do povo brasileiro. Seja como for… com estupro ou sem estupro, espero que desta vez a “atração” global caia em desgraça e que nunca mais volte. Mas conhecendo nosso povo, “cultura”, costumes etc., é bem provável que criem um híbrido de BBB e CSI.

É este o país que queremos?

Nos anos 60, Andy Warhol, uma mistura de gênio e mago – que criou a seminal banda Velvet Underground – afirmou que todos teriam seus quinze minutos de fama. A personalidade instantânea da semana é Luíza Rabello. Quem? Luíza, aquela que estava no Canadá.

Uma adolescente, que estava no país da América do Norte fazendo intercâmbio, vira hit na internet por conta de um comercial protagonizado pelo seu pai Gerardo Rabello, um colunista social da Paraíba. Uma frase pinçada a esmo e totalmente fora do contexto do comercial dá fama e grana a uma bela moçoila no frescor dos seus 17 anos. Ela já voltou do Canadá para aproveitar. Tirou fotos, fez comerciais, foi entrevistada na TV e não duvido que, ao completar 18 anos, alguma revista masculina mostrará suas belas e viçosas curvas.

Todas as frases da semana, via Twitter, Facebook, TV, show, vinha com o pegajoso bordão: “Todos, menos Luíza, que está no Canadá.” É engraçado até certo ponto. Também não sejamos tão radicais. Eu mesmo fiz algumas ironias com o “meme”. Mas é preciso que se faça um exame de consciência para avaliarmos até onde é capaz de caminhar nossa sociedade. É este, enfim, o país que queremos?

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[Sylvio Micelli é jornalista]