Thursday, 26 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Diário da serialidade alienante

Independente das regras, dos participantes, das mudanças estruturais e arquitetônicas da casa, o Big Brother Brasil navega sobre o mar da serialidade, bem como os repetitivos enlatados americanos, os badalados filmes da indústria cinematográfica e as novelas brasileiras; além disso, a intrínseca particularidade do programa é a alienação. Ao longo dos anos, poucas peculiaridades do Big Brother foram tão peremptórias para o aumento da audiência quanto a propagação de um modus vivendi não pertencente ao povo brasileiro e a valorização excessiva do corpo como mercadoria. Enquanto se faz um discurso apregoado deixando claro, segundo os produtores, que a casa é uma casa normal, diferenciada apenas pelas câmeras e microfones captadores de tudo o que se faz e diz, o público maravilha-se com rostos e corpos bonitos, construtores de um elenco da “vida real” capaz de causar inveja a qualquer agência de modelos.

Os produtores, embora tentem demonstrar todos os anos que a atual edição traz novidades, na verdade prezam pela manutenção da produção de sentido que salta aos olhos dos telespectadores e faz pinchar maiores rendimentos na conta dos anunciantes. Se repetir consiste um tesouro nas mãos da emissora, se o departamento de marketing usufrui positivamente desta ação, e se o maior interesse é ganhar dinheiro em vez de exibir programas educativos de alta qualidade, contentar o povo com esta balela chamada Big Brother para a TV Globo é e sempre será interessante.

Programa do “horário nobre”

Mulheres e homens dotados de pouco senso crítico, que entram na casa sabendo perfeitamente o que devem fazer – e quem acerta dosar o temperamento e as atitudes ao sabor do público geralmente vence –, compõem um catálogo de futuras capas de revista, nobres desconhecidos e agregados das menores emissoras. O desejo de estar em evidência punge a dignidade das participantes que não contentes com a exposição de partes íntimas promovem momentos que ruborizariam qualquer messalina. E não diferem dos homens, masmarros arrogantes que através de atitudes pensadas manobram com cavalheirismo ou brutalidade a massa espectadora.

O Big Brother é um retrato do Brasil pintado pela TV Globo que cabe perfeitamente no imaginário dos brasileiros. Aceitar que programas como este povoem a televisão, é compactuar com um modelo de cultura alienante que transforma os cidadãos em homens indiferentes aos problemas sociais e políticos do país. Em janeiro, enquanto se deveriam discutir os rumos do país, da economia, o aumento dos preços do material escolar, os frequentes homicídios por motivo banal, os brasileiros contentam-se em assistir às festas do sábado, às bem montadas edições, às brigas e gafes e finalmente passar horas e horas votando pela eliminação de algum participante do Big Brother, o famoso paredão, mais uma marca indelével da serialidade estampada no programa global do “horário nobre”.

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[Mailson Ramos é estudante, Salvador, BA]