Um novo logotipo, que entrará no ar no domingo, com o “Fantástico”, é apenas um dos sinais das mudanças pretendidas pela direção da Globo. Criado por Hans Donner, ele “foge ao modelo metálico e representa uma transformação profunda de conceito” nas palavras de Carlos Henrique Schroder. O diretor-geral da emissora abriu sua fala no “vem_aí” – evento de lançamento da programação de 2014, na noite de anteontem – fazendo referência a “movimento” e “arriscar”. No dia seguinte, numa conversa com um pequeno grupo de jornalistas, voltou a reforçar a intenção de incentivar o ambiente criativo e de investir em segunda tela e em formatos inéditos:
– A gente acha que tem que ousar. Vamos, por exemplo, avançar na produção de séries semanais com ganchos fortes, algo a que o público americano está acostumado, mas que aqui ainda é novidade. Nossa cultura é a das novelas diárias. “A segunda dama” e “O caçador” vão ao ar uma vez por semana, e suas tramas não se encerram num só episódio. Cada capítulo terá um gancho forte chamando para o próximo. As temporadas serão curtas, e teremos, em vez de 12 produções, como no ano passado, 16.
Mexer em formatos, ele diz, é algo que vai alcançar até as novelas, produto mais tradicional da emissora. “Meu pedacinho de chão”, que estreia na segunda-feira, terá pouco mais de cem capítulos, ou seja, será mais curta do que a média, de cerca de 160. A ideia, no caso da faixa das 18h, é driblar as estreias durante o horário de verão, que afeta a audiência.
– Tais mudanças são resultado de fóruns de discussão internos que foram criados no ano passado para uma ampla reflexão sobre a programação. Desde o ano passado instituímos esses grupos polivalentes, com autores e diretores, que contam com cerca de oito pessoas. Já promovemos debates sobre seriados e atrações de variedades. Vamos fazer um sobre formatos brasileiros, outro sobre novelas.
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Schroder detalha algumas das mudanças no produto mais tradicional da emissora:
– A conta tem que fechar, é claro. Uma trama com cem personagens é mais cara, mas uma história com 30 pode ser mais curta. E também pensamos num texto inédito para a faixa das 23h, que até agora tem sido ocupada com remakes. E estamos investindo em novos autores. Vêm aí novelas escritas por Rui Vilhena e Daniel Ortiz. No horário das 21h, que é uma produção mais robusta, o cuidado é grande, mas esse também será um caminho natural. O Walcyr Carrasco não é estreante em novelas, mas estreou na faixa. É só um exemplo.
A ideia, na linha de shows, é oferecer temporadas mais curtas para que a grade possa receber um número maior de gêneros. Mas essa vontade de avançar em novos terrenos se estende a outras plataformas. A recém-criada parceria com a Globosat é uma delas:
– Queremos testar novos programas, mas não temos espaço para a exibição de tudo. Então, o fato de a Globosat ter “Animal” (série que vai ao ar no GNT e já entrou em produção no Rio Grande do Sul, em parceria com a Accord) é uma maneira de oxigenar nossos talentos. O Edson Celulari, um ator de primeira linha, quis estrelar o programa. Achamos ótimo que isso aconteça. Mas a TV aberta continua sendo a nossa prioridade. Toda a nossa discussão de conteúdo é para garantir a liderança dela.
Para essa ampliação na cartela de formatos, vale também fazer parcerias. Uma delas, já acertada, será para a primeira minissérie aprovada para 2015, “Felizes para sempre”, que será escrita por Euclydes Marinho, autor da Globo, mas dirigida por Fernando Meirelles, da O2. A trama será ambientada num spa e deverá ir ao ar em janeiro.
Indagado se a aventura por novas linguagens pode trazer riscos para a audiência, Schroder diz que esta é importante, mas que “o desejo de bons números não pode ser uma meta única”:
– Não trabalhamos mais com trilho. O produto tem que ter relevância, cativar, ter abrangência. E aí a audiência vem, é consequência. A qualidade é o principal. Costumo fazer uma analogia com o futebol. O técnico não pode exigir do time um número de gols num jogo. Mas o time tem que jogar bem. Não queremos recuar por causa de audiência.
O desejo de promover o ambiente criativo não significa, afirma Schroder, deixar de ouvir as pesquisas. Elas, no entanto, não são determinantes. Há momentos em que a decisão de ousar prevalece. Foi o caso, afirmou, do beijo gay em “Amor à vida”:
– Não tínhamos pesquisa. Mas foi algo amadurecido. E o Walcyr propôs. A empresa não interfere no texto do autor, não existe isso. O autor tem liberdade para fazer o que quiser com a sua história, sabendo das limitações da Classificação Indicativa, que não são internas. O beijo foi bonito, foi construído. Saiu naturalmente. Depois que foi ao ar, tivemos uma resposta muito positiva no CAT (Central de Atendimento ao Telespectador): 95% das pessoas que ligaram falaram que aprovaram a cena. É muito.
Perguntado sobre o futuro de “Malhação”, há mais de uma década no ar, respondeu que acredita no fôlego do programa para muito tempo ainda. O mesmo vale para o “Big Brother”. E, sobre o “Vídeo Show”, que sofreu uma recente reformulação e enfrenta problemas de audiência, voltou a mencionar a ideia de “movimento”, tão frisada no “vem_aí”:
– Estamos fazendo avaliações constantes do “Vídeo Show” e achamos saudável que vários diretores passem pelo programa. São visões diferentes para uma atração longeva.
Novas tecnologias ocupam os planos com a mesma força da inovação de conteúdo. Perguntado se existe o desejo de se criar um serviço de streaming, Schroder contou que, em Minas, a Globo lançou um projeto piloto intitulado Globo TV +. Por R$ 12,90, o espectador pode assistir, no computador, à programação da emissora com uma margem de apenas poucas horas de distância da exibição na TV. Esse projeto deverá ser estendido a outras praças em breve. Ainda no terreno das novas tecnologias, há uma aposta forte em segunda tela. Em maio, durante o Brasileirão, a emissora vai lançar um aplicativo que permitirá, por exemplo, que o espectador aposte com um amigo quantos gols, cartões ou pênaltis acontecerão na partida. Aplicativos que pretendem “carregar” o freguês que está nas redes sociais para a televisão já existem para “The voice”, “BBB” e “Malhação”.
– Vamos trazer o sujeito que gosta de ambientes complementares – resumiu ele.
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Patrícia Kogut, do Globo