O recente comportamento do apresentador William Bonner chama a atenção negativamente. Após ser justamente criticado e questionado por sua postura autoritária, atropelada e – diz-se – tendenciosa na condução da entrevista com a presidenta Dilma Rousseff, no Jornal Nacional, reagiu de forma descontrolada no Twitter, chamando os críticos de “robozinhos partidários”, “blogueiros sujos” e outros impropérios. Em vez de explicar a sua conduta com argumentos e brindar seus seguidores com um debate útil, demonstrou extremo descontrole e descortesia, arranhando sua imagem – que, convenhamos, para muitos comunicólogos, já não se apresentava tão intacta assim.
Com ou sem a pitoresca resposta do âncora global, uma coisa ficou evidente: as entrevistas do Jornal Nacional com os presidenciáveis foram – assim como é a maioria das entrevistas televisivas, notadamente nas emissoras de sinal aberto – superficiais e atropeladas, onde não foi possível de fato aprofundar o debate sobre o que interessa para o Brasil. E a situação vai além: é muito comum vermos a imprensa inquirir o candidato sobre “suas propostas”, não formular questões que abranjam o caráter estrutural dos problemas sociais e nem fomentar – ou dar tempo ao candidato para fazê-lo, se considerarmos que ele tem preparo para isso – debates mais apurados.
O eleitor pega carona na mesma onda. Procura-se saber, na imortal e simplória dicotomia entre “sim” e “não”, qual é a posição do candidato a respeito de temas como privatizações, aborto, redução da maioridade penal, legalização da maconha, investiga-se de forma superficial a existência de “podres” que o comprometam, observam-se alguns trechos recortados de discursos desconexos e pronto: pensa-se ter aí receita infalível para descobrir em que candidato votar.
Comportamento conveniente
O jornalismo alimenta isso. Quantas vezes temos oportunidade de ver, na televisão, rádio ou mídia de massa impressa, debates sérios e aprofundados sobre questões estruturais? Aliás, sobre qualquer questão? Pouquíssimas. Tomemos como exemplo a reforma política: temos tido a oportunidade de ver, na grande mídia, discursos apurados sobre os problemas do atual sistema político brasileiro, possibilidades de mudança e formas de viabilizá-las? Não. Matérias de dois ou três minutos, infográficos mágicos e o resultado disso é a desinformação absoluta sobre o tema por parte da população, que, em sua maioria, ainda não teve oportunidade de entender a fundo o sistema político brasileiro e as possibilidades de mudança estrutural que se lhe apresentam. Não à toa, grande parte dos brasileiros provavelmente será incapaz de discutir mais do que cinco minutos sobre o assunto – isso quando não se cai na mesmice de ficar citando bons e maus exemplos que pouco ajudam na compreensão do tema, dizendo que “a reforma política é um golpe” ou implodindo o assunto ao dizer que “são todos ladrões e pronto”.
Seria possível citar dezenas de outros temas onde ocorre situação similar. Um bom exemplo de como a grande mídia – e por conseguinte, parte significativa da população – tem abordagem pontual e profunda como um pires é a questão da maioridade penal. Cada vez que um menor de idade comete um crime de repercussão nacional, o assunto volta à tona, e alguns (ditos) profissionais da Comunicação abordam publicamente o tema de forma exageradamente caricata e estreita, dizendo que “se pode votar, pode ir preso”, que estamos “passando a mão na cabeça de vagabundos” e assim por diante. Um exemplo claro desse tipo de contribuição tão raivosa quanto rasa é o apresentador José Luiz Datena, da Bandeirantes, provavelmente o maior defensor da redução da maioridade penal no nosso país. No seu discurso não são consideradas questões de extrema relevância para esse debate, como possibilidades de recuperação e requalificação das instituições de atendimento ao menor infrator (cujas deficiências têm direta relação com a criminalidade entre menores), consequências de uma eventual redução no sistema carcerário já precário e superlotado, redução drástica das possibilidades, já parcas, de recuperação social do menor infrator e assim por diante. Independentemente da posição final a ser tomada, é impossível balizar adequadamente uma opinião sobre o tema sem considerar cautelosamente questões como estas.
O jornalismo tem – como toda área do conhecimento – uma função social a cumprir; os veículos de comunicação de massa tem um compromisso inerente com a formação cidadã da sociedade. De maneira geral, entretanto, o que faz a grande mídia no campo jornalístico é trazer fatos e temas de forma extremamente superficial, contribuindo muito pouco – ou até negativamente – para a formação de opinião da sociedade. Entrementes, tal comportamento, para quem o adota, parece ser extremamente conveniente.
******
Lucca Fróes é estudante de Comunicação