Os detetives do seriado policial “Tatort” talvez sejam desconhecidos para a maioria dos telespectadores dos Estados Unidos e do Brasil, mas não para os da Alemanha, onde o programa é transmitido há décadas e atrai muito mais público do que, por exemplo, o sucesso americano “House of Cards”. Isso representa um desafio para a Netflix, que está querendo entrar na Europa.
Em quase mil episódios desde 1970, “Tatort” mudou pouco: descobrem-se cadáveres, inocentes se tornam suspeitos e, depois de uma investigação obstinada, uma prisão é realizada no último minuto. No entanto, o programa ainda atrai regularmente mais de dez milhões de telespectadores nas noites de domingo. A Netflix está tentando conseguir uma licença para o programa da emissora pública ARD, de acordo com duas fontes do setor, que solicitaram anonimato porque as negociações são confidenciais.
Enquanto a Netflix estreia em seis países nesta semana, o maior serviço de streaming de vídeo do mundo está começando a perceber o que terá que enfrentar. Pesquisas nos maiores mercados televisivos da Europa indicam que o conteúdo local – muitas vezes disponível em canais gratuitos durante o horário nobre – supera regularmente os grandes sucessos dos Estados Unidos. O Netflix contará com alguns programas locais, mas resta saber se eles serão suficientemente bons para conseguir fazer com que as pessoas paguem por eles.
– Os espectadores vão procurar os programas que eles conhecem e se não conseguirem encontrá-los nunca vão assinar o serviço – prevê Gilles Fontaine, analista na empresa de pesquisa Digiworld em Montpellier, França.
Batalha de Marselha
“House of Cards”, o suspense político ganhador de vários prêmios, que colocou a Netflix no mapa das potências em conteúdos de vídeo, não conseguiu ultrapassar a marca de um milhão de espectadores na Alemanha e, no ano passado, foi retirado da programação do canal principal Sat.1 da ProSiebenSat.1 Media AG. A segunda temporada teve uma média de cem mil espectadores no canal ProSiebenMAXX.
A Netflix é consciente do desafio representado pelas preferências locais. A empresa disse que 20% dos seus títulos na França serão franceses, entre eles um seriado original chamado “Marseille”, um drama político ambientado na cidade portuária francesa de Marselha. O programa pode disputar a audiência com “Plus Belle la Vie”, uma novela ambientada na mesma cidade, que é transmitida há dez anos e bateu um recorde em junho, quando 21% do público sintonizaram no canal aberto France 3.
A empresa não anunciou seu próprio programa para os países que falam alemão e o porta-voz Joris Evers, em Amsterdã, não quis comentar. Em vez disso, a Netflix adquiriu os direitos dos favoritos locais, como “Stromberg”, um seriado parecido com o antigo “The Office”, e o programa “Der Tatortreiniger”, uma série de comédia sobre um homem que limpa as cenas do crimes.
Embora a Netflix tenha que competir com outros serviços pagos, como os oferecidos por ProSiebenSat.1, Amazon.com e Sky Deutschland, é possível que seu maior desafio sejam as emissoras abertas. Esses canais, financiados com impostos ou publicidade, são responsáveis pela maioria da audiência televisiva.
Terreno inexplorado
O potencial de crescimento da região foi o que atraiu a Netflix, com sede em Los Gatos, Califórnia, para a região. Na França, oito de cada dez usuários de internet dizem ter assistido a vídeos on-line no último mês, mas apenas 3% dizem ter assinado em algum momento um serviço pago de streaming de vídeo, de acordo com o serviço de medição de audiência Médiamétrie.
A Netflix disse que busca gerar até 80% das vendas fora dos Estados Unidos. No ano passado, a receita internacional deu um salto de 85%. Mesmo assim, quase três quartos dos 50 milhões de usuários da Netflix estão nos EUA.
Com sua expansão global, a Netflix também visa dar o primeiro passo em mercados estrangeiros antes que as rivais americanas, entre elas a Amazon.com e a HBO, da Time Warner.