Fim de ano é um período chato para os amantes das notícias esportivas. Com o término dos campeonatos nacionais, começam as rodadas de especulações: fulano está deixando o time A, sicrano tem propostas de clubes do exterior, beltrano não deve ser mais técnico do time C… E assim por diante. Haja assunto (ou falta de) para encher os 30 ou 40 minutos diários dos programas esportivos na TV aberta, ou as quatro ou cinco horas dos canais especializados. É “achismo” em cima de “achismo”, num show de especulação que não tem fim. E o torcedor? Fica sofrendo e torcendo por aquele reforço que o jornalista ou comentarista “cravou” em seu time de coração. Haja paciência.
Um dos motivos para isso ocorrer talvez seja a limitação do jornalismo esportivo nacional. Mudam os jornalistas, as emissoras e os fatos, mas as reportagens parecem ser sempre as mesmas. Alguns podem dizer que isso é culpa dos clubes, que impuseram normas para as entrevistas com dirigentes, comissão técnica e jogadores, o que faria com que todos os repórteres tivessem acesso às mesmas falas. Mas isso é minimizar muito a questão. Acredito que uma das grandes causas do marasmo é o olhar de repórteres, editores e emissoras, que pecam por não ousar.
Recentemente pudemos assistir a excelentes reportagens diferenciadas em relação às demais. Um exemplo é o que o jornalista Élton Novais vem fazendo na TV Globo Minas. Saindo do comum, ele conseguiu emocionar milhões de brasileiros com a reportagem sobre o torcedor atleticano cego Cláudio Riquetti, que faz questão de assistir aos jogos do Galo no Estádio Independência, para sentir a festa e a vibração da torcida.
Segundo o próprio jornalista, quando se propõe coisas do gênero, parece que o universo conspira a favor. Não estava planejado, mas o abraço recebido por Cláudio Riquetti pelo goleiro Victor foi, de fato, emocionante. Creio que não somente para atleticanos, mas para toda e qualquer pessoa que tenha a capacidade de compreender o tamanho da emoção que pode estar envolvida nessa paixão por um time, que supera até mesmo obstáculos físicos.
A troca da especulação na TV pela das redes sociais
Outro exemplo recente de ótimo conteúdo jornalístico relacionado ao esporte vem do jornalista e escritor Pedro Blank. Após lançar este ano a biografia de um dos maiores craques da história do Cruzeiro, O Príncipe – A Real História de Dirceu Lopes, Blank publicou excelente artigo no site do Observatório da Imprensa. Intitulado “Jogadores evangélicos apontam vitória divina“, o jornalista faz uma análise do excesso de referência ao sagrado nos discursos de grande parte dos jogadores de futebol brasileiros na atualidade. E pondera sobre o quão isso influencia na relação entre clubes e torcida. Vale muito a leitura.
Ainda existem outros bons trabalhos na imprensa nacional e regional, mas o espaço aqui não me permite estender os exemplos. De qualquer forma, o que vale é a reflexão de que é possível sair do “mais do mesmo” e praticar o jornalismo esportivo de qualidade. Mesmo na época da entressafra de campeonatos (e talvez até mais nesse período) é possível contar boas histórias que fogem do lugar-comum. E isso, como já se sabe bem, tem grande aceitação por parte do público consumidor de informações.
Vale lembrar ainda que jornalismo esportivo não se resume a futebol. Que futebol não se resume a campeonato brasileiro e que campeonatos nacionais não são somente os que o time de coração de cada um disputa. Ou seja, há uma infinidade de assuntos bons e prontos para serem pesquisados e trabalhados. Portanto, o maior erro que um jornalista pode cometer – independente se da área esportiva ou não – é dizer que não tem pauta ou assunto para desenvolver uma boa reportagem. Ora, as boas histórias estão todas aí, esperando somente alguém com um olhar diferenciado para contá-las ao grande público. E é justamente esse o papel do profissional de jornalismo: enxergar o diferente dentro do óbvio. Buscar as melhores histórias e ter a capacidade de contá-las de forma interessante para as pessoas. Simples assim.
No entanto, como já dito, não se sabe ao certo o(s) motivo(s) que leva(m) a cobertura esportiva a ser praticamente a mesma em todas as emissoras de TV, rádio, impressos e internet. Creio que o medo de arriscar conte muito. Certa vez li que grande parte dos jornalistas prefere errar em conjunto a se arriscar e acertar sozinho. Talvez seja um defeito da classe, uma imposição das chefias, o comodismo… Só sei que se não houver mudanças e novas iniciativas como as descritas, as pessoas vão trocar a especulação noticiosa da TV pela das redes sociais. Afinal, lá elas podem, pelo menos, ser especuladoras também.
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Ricardo Nogueira é jornalista, mestre em Educação, Cultura e Organizações Sociais e professor