É inegável a importância da televisão para a consolidação da unidade nacional brasileira. Fazia parte de um projeto de poder dos militares que governavam o país. Para Mattelart, “a televisão assume papel de vanguarda enquanto agente unificador da sociedade brasileira”, principalmente a partir dos anos 1960, quando o governo militar, o capital estrangeiro e os grupos de comunicação se unem para dar início ao desenvolvimento de um sistema de comunicação nacional no Brasil.
A formação de redes nacionais, financiadas pelo dinheiro público, foi estimulada para que se atingisse a meta de integrar o Brasil de norte a sul e se alcançassem os ideais nacionalistas, desenvolvimentistas e de oposição ao comunismo do governo militar. Segundo Herz, “a interiorização da televisão será incentivada pelo uso extensivo da infraestrutura do sistema nacional de comunicações”. Dessa forma, a Rede Globo passou a alcançar 99% dos domicílios pela TV, 88% dos municípios brasileiros e 93% de toda a população.
As novelas, as transmissões de jogos de futebol e o Jornal Nacional são elementos que alimentaram a construção dessa “pretensa” unidade do Brasil, onde o ribeirinho do Amazonas e o gaúcho do Rio Grande do Sul podiam se enxergar como brasileiros, apesar das diferenças regionais, econômicas e culturais – quase sempre minimizadas pelo “padrão Globo de qualidade”. “O modelo integrativo da Globo, seu padrão de modernidade do consumo, foi o ponto de convergência de um consenso oficial e de um deslumbramento eletrônico partilhado por toda a população. A novela foi uma das peças mestras dessa unanimidade com uma sociedade onde se acentuava, ao correr dos anos, o regime de dupla velocidade que fazia com que uns vivessem efetivamente no ritmo da modernização e outros estagnassem num horizonte cada vez mais limitado social e financeiramente.”
O que se percebe, no entanto, talvez devido à artificialidade da sua construção mediada pelos veículos de comunicação, é que essa noção de unidade nacional brasileira é um conceito fácil de ser questionado. Isso aconteceu nas eleições presidenciais do ano passado. O que mais se viu na internet, na mídia e nas ruas foram manifestações de descontentamento com determinadas regiões do país por não se identificarem eleitoralmente com outras regiões. A solução apresentada: a divisão do Brasil entre norte e sul; ricos e pobres; esquerda e direita.
Referências bibliográficas
HERZ, Daniel Koslowsky: A história secreta da Rede Globo. Porto Alegre, Editora Tchê!, 1987.
MATTELART, Michele & Armand: O Carnaval das Imagens – a ficção na TV. São Paulo, Brasiliense, 1989.
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Maria Neblina Orrico Rocha é jornalista