Se você, caro leitor, não entendeu nada do que o título acima tentou expressar, saiba que esta situação é vivida diariamente por milhões de pessoas que recorrem à chama tecla SAP disponível em alguns modelos de televisão para ler em legendas o que é transmitido em atrações televisivas em forma de som.
O título reproduz uma das incríveis frases que são mostradas naquelas legendas dessa famosa e moderníssima invenção da tecnologia para ‘facilitar’ a vida dos telespectadores, especialmente a dos deficientes auditivos. Ela nos dá uma vaga idéia do que os deficientes sofrem para entender uma simples reportagem ou filme, já que os responsáveis pelas legendas se mostram totalmente insensíveis com quem as lê.
Insônia indignada
Os erros são tão escabrosos que podem deixar o telespectador sem entender patavinas do que está sendo mostrado. A frase acima é apenas um exemplo do problema. O que na verdade deveria estar na legenda, numa fiel reprodução, seria: ‘A Alemanha, que é a pátria de Martinho Lutero…’. Foi dita pelo repórter do programa Fantástico na edição do domingo (21/8), em reportagem sobre a viagem do papa Bento 16 à Alemanha, onde nasceu o revolucionário padre criador do protestantismo. Não se sabe ao certo se a absurda falha é causada por erro tecnológico dos computadores, que não conseguem traduzir em letras o que é dito em sons, ou se é mero descaso com o telespectador, mas é obvio que deveria ser sanada imediatamente, porque é serviço prestado de forma incorreta e, portanto, pode ser classificado como engodo.
A frase na legenda não tinha qualquer ligação com a realidade, mas isso parece ser o menos importante para os profissionais responsáveis pelo serviço anunciado em claro e bom som pelos locutores das emissoras – que, aliás, esquecem que o público-alvo desse serviço não pode ouvir tal anuncio. A tal tecla SAP, criada para prestar um serviço aos deficientes auditivos, proporciona frases desconexas, sem sentido e mutiladas de trechos importantes para o entendimento do texto.
Apesar de não sofrer problema de audição, posso imaginar a enorme dificuldade que um surdo tem para entender algumas matérias que são veiculadas no Fantástico, no Programa do Jô, no Jornal Nacional ou nas falas dos galãs e vilões de praticamente todos os filmes exibidos pela Rede Globo.
Devido aos meus hábitos noturnos, sou usuário freqüente do serviço, que pode ser útil para os que não querem incomodar os vizinhos já entregues a Morpheu, mas muitas vezes prefiro outra opção para que a minha indignação não me tire o sono.
Pobre Martinho
Poderia encher páginas e páginas com exemplos até mais risíveis do que a ambição alemã sobre a pata do pobre padre Martinho, que deve ter se revirado no túmulo, mas prefiro sugerir que você, caro leitor, experimente por si só essa nova modalidade de comédia. Garanto que se você não for deficiente auditivo, e possuir um despreocupado senso de humor, vai ter garantido um hilariante programa humorístico – contanto que mantenha o som do televisor ligado para comparar a fala e o que dela resultar quando for transcrita.
Mas se você tiver problemas para captar os sons de forma natural, sugiro que, quando possível, tente ler os lábios dos personagens ou procure um bom livro. Ou tente demonstrar seu protesto contra mais esse inacreditável descaso com os deficientes e o consumidor em geral.
Por via das dúvidas, espero que a integridade física do padre Martinho, perseguido e injustiçado em vida, esteja bem garantida na morte.
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Radialista em Jales, SP