Thursday, 26 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

A sociedade do telejornalismo

Os brasileiros acreditam mais na mídia que no governo. A informação, resultado de uma pesquisa da agência de notícias Reuters, da rede britânica BBC e dos Media Centre Poll da Globescan realizada em 2006 em dez países, mostra a centralidade e importância da televisão na sociedade brasileira [ver, neste Observatório, ‘Pesquisa mostra divisão da opinião pública mundial sobre a liberdade de imprensa e a informação‘ e ‘Noção de liberdade de imprensa é relativa‘]. Os telejornais funcionam como uma janela para a realidade, mostrando que o mundo circundante existe, está lá e tudo não se transformou num caos, a vida segue a sua normalidade. É um lugar de referência.

Ao se sentarem-se nos sofás de suas casas ao final de um dia de trabalho, as pessoas procuram, além de informar-se sobre o entorno, ter a segurança de que o mundo lá fora, apesar dos conflitos, das tensões, da falta de emprego e da insegurança, é um mundo no qual é possível de se viver. O noticiário televisivo desempenharia o papel de um desses lugares de segurança.

Lugar de referência

Entendemos que a confiança, a crença e a segurança são centrais para a sobrevivência do homem. Por isso, no cotidiano não passamos o tempo todo questionando o mundo que nos cerca. No dia-a-dia adotamos uma postura de suspensão da dúvida em relação ao mundo em que vivemos. Ou seja, cremos que as coisas são como estão evidenciadas na realidade. Os homens, as mulheres, as ruas, as casas, as praças ou o lugar em que trabalhamos são reais, não precisamos ficar nos questionando se existem e nem como devemos proceder em cada um desses momentos. Isso já é dado. É um pressuposto.

O mundo que vemos é o mundo real, o mundo do nosso dia-a-dia. Isso também não nos pode levar ao raciocínio contrário, de que as pessoas não têm dúvidas com relação ao que observam e percebem no dia-a-dia. Como uma forma de sobrevivência, elas suspendem a dúvida.

Vejamos um exemplo para deixar isso mais claro. De manhã, pego meu carro e vou para o trabalho. Ora, quando estou dirigindo, não coloco em dúvida o tempo todo se alguém que vem com outro carro na minha direção vai bater em mim, se um pedestre que está na calçada está com a intenção de se jogar na minha frente etc. Ou seja, tenho confiança de que as coisas são como são. Isso me dá segurança. Dentro desse contexto, minha atitude em relação aos telejornais não é diferente: a forma como ele é organizado, as notícias que se sucedem, o final com uma mensagem de esperança, ou com uma matéria para cima, para levantar o ânimo, deixam-me mais confiante no mundo, mais informado sobre ele. Funciona como um lugar de referência.

É o que, de certa forma, ocorre no país nas transmissões dos grandes eventos midiáticos, como a Copa do mundo e as eleições. Os milhões de brasileiros e brasileiras que acompanham a cobertura pela televisão estabelecem, de certa forma, uma relação de pertencimento a uma comunidade, a uma nação chamada Brasil. Eles sabem que naquele instante, em outras cidades e em outros estados, cidadãos que eles provavelmente nunca encontrarão são brasileiros que nem eles. Não estamos sós. Temos um lugar de referência.

Estratégias dos noticiários

Nesse sentido, o telejornal é hoje a grande praça pública do Brasil. Consideramos que a reflexão sobre o campo do telejornalismo como um lugar de construções simbólicas é de fundamental importância para a compreensão da produção, circulação e consumo de sentidos na sociedade. Consideramos ainda que a reflexão sobre o campo do telejornalismo – seus processos, métodos e estratégias – é de fundamental importância quanto à sua relevância, significado e eficácia para a compreensão da experiência nas sociedades democráticas.

São questões como essa, que tratamos de uma forma breve neste artigo, que estão bem mais trabalhadas no livro que organizamos com a participação de outros colegas pesquisadores e que será lançado no começo deste ano pela Editora Vozes, com o mesmo título que damos a este texto: A Sociedade do Telejornalismo. É um livro que se dirige não só àqueles que se interessam pela Comunicação, pelo telejornalismo, mas que querem conhecer mais as estratégias dos noticiários televisivos que contribuem diariamente de uma forma central para a construção social do Brasil.

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Jornalista, vice-coordenador do programa de Pós-Graduação em Comunicação da UFPE