A televisão na Itália começou relativamente tarde, somente em 1954, quando o país ainda não tinha se levantado da derrota moral e material da Segunda Guerra Mundial – no início, era somente estatal.
Como a maioria dos italianos não tinha condições de comprar um aparelho, os primeiros, especialmente nas pequenas cidades, foram adquiridos pelos donos de bar e vieram a mudar o ritmo de vida da população. Antes, depois do jantar as crianças eram mandadas a dormir e os adultos ouviam rádio; depois os homens passaram a ir aos bares assistir à televisão e na volta contavam o que viram.
O primeiro grande sucesso da TV foi um programa de perguntas e respostas com prêmios em dinheiro, conduzido pelo ainda ativo Mike Bongiorno. O programa chamava-se Lascia o raddoppia (Deixa ou dobra), algo como o Céu é o limite brasileiro.
Hoje há três canais estatais e alguns particulares, com grande destaque para o Mediaset, que pertence ao presidente do Conselho de Ministros, Silvio Berlusconi. Todavia, para quem chega do Brasil, como é o meu caso, a primeira coisa que chama a atenção é a baixa qualidade da maioria dos programas. Há muitos telejornais, todos os canais exibem no mínimo quatro por dia, fora os regionais, contudo as imagens não se sincronizam bem com as notícias e repetem-se por dias, não acompanhando a evolução dos fatos; os apresentadores não utilizam o teleprompter, e com bastante freqüência dizem uma coisa e a direção apresenta outra.
Mas existe um programa de perguntas e respostas com excelente nível, especialmente por parte dos candidatos. Depois um número incontável de reality-shows, um grupo de pessoas famosas que passa semanas numa ilha deserta botando para fora o que tem de pior, outro grupo faz o mesmo numa fazenda, pessoas de uma certa idade tentando viver em grupo numa casa. Depois, os chamados programas ‘spazzatura’ (lixo), casais que se encontram para tentar uma reconciliação, que sempre termina com o problema agravado. Filhos de pais separados que passaram anos sem ver um dos dois e se encontram entre lágrimas e beijos, vizinhos que levam suas questões a um falso juiz que emite sentença e assim vai.
Por mais liberal…
No horário nobre, a mesma coisa: quem quer assistir a algo diferente deve limitar-se a seriados e filmes, na grande maioria estadunidenses. Alguns bons documentários e talk shows acontecem depois das 11 da noite ou de madrugada. Esporadicamente aparecem alguns programas brasileiros: há algum tempo foi ao ar a minissérie sobre a maestrina Chiquinha Gonzaga, mas começava às 7 da manhã. Essa, em resumo, é a televisão italiana, que tem grande penetração no Leste europeu e no Norte da África.
Mas nem tudo está perdido, essa semana, por coincidência, o presidente da República, Carlo Azegli Ciampi, e o presidente da Câmara, Pier Ferdianando Casini, fizeram duras críticas à televisão italiana.
O presidente Ciampi surpreendeu a todos com um ataque frontal ao mundo televisivo e ao crescimento dos programas trash levados ao ar à tarde, que jogam com as emoções juvenis, ao declarar:
‘Muitos irresponsáveis guiam o mundo da televisão; a família não pode delegar a estes a educação dos filhos. Temos a obrigação de não ficar indiferentes por mais tempo. A mass media amplifica e exalta cada ação e, muitas vezes, parece desconhecer suas responsabilidades ao divulgar o que servirá de modelo para formação da juventude.’
Casini não deixou por menos:
‘São os adultos os responsáveis pela forma como a televisão exercita seu poder sobre os jovens e os meninos. (…) A televisão pública não pode ceder aos requisitos do mercado, mas deve orientá-lo. (…) As TVs privadas tem que estar atentas à qualidade dos programas, evitar as contínuas violações do bom gosto, às mensagens negativas que transmite aos nosso filhos. Mensagens que talvez não violem as leis, mas são gravemente deseducativas. Há o risco que a má televisão trabalhe na consciência de nossos filhos até superar a educação dada pelos pais. Temos portanto o dever de não ser indiferentes.’
Este é o pensamento de dois importantes homens públicos sobre a qualidade da televisão italiana e, por mais liberal que se seja, temos de reconhecer que em alguns pontos estão certos.
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Jornalista