Um dos maiores acidentes ecológicos da história do planeta deixou treze pessoas mortas nos Estados Unidos. Cinco meses após a explosão de uma plataforma de prospecção de petróleo da empresa British Petroleum no Golfo do México, surge uma nova vítima. Mas não se trata de alguém que tenha ficado ferido no acidente. A bola da vez foi um jornalista da rede ABC em Washington: o veterano Doug McKelway, de 56 anos. Depois de dois meses suspenso por conta de uma reportagem ao vivo onde criticou o presidente Barack Obama e o Partido Democrata por supostas ligações com a empresa BP, McKelway foi desligado da emissora na última semana.
A polêmica teve início no dia 20 de junho, quando o jornalista fazia uma cobertura ao vivo de um protesto em frente ao Capitólio, a sede do Congresso dos Estados Unidos. A manifestação fazia parte de uma frente nacional que organizou atos em diversas cidades norte-americanas exigindo uma postura mais pró-ativa da BP para solucionar o vazamento. Em Washington, os manifestantes foram além. Também criticaram a influência histórica das empresas petrolíferas no governo norte-americano e as doações de campanha feitas por elas a diversos congressistas democratas.
Durante a intervenção ao vivo, um aparentemente contrariado e cético McKelway não poupou palavras para minimizar o impacto dos manifestantes. Ele abriu sua participação corrigindo o apresentador do telejornal, alegando que o ultraje dos manifestantes era ‘apenas moderado’ e que ‘eles estavam posicionados atrás de árvores, bem poucos, numa indicação de para onde o movimento ecologista estava indo’. Prosseguindo, o jornalista disse que se tratava exclusivamente de movimentos de ‘extrema-esquerda, como Greenpeace’.
Acusações e insinuações
Mas a parte mais controversa da reportagem estava por vir. Doug McKelway disse que ‘a estratégia de apontar quais congressistas democratas tinham `dinheiro sujo de petróleo´ nas mãos era arriscada, pois o homem que mais recebeu doações da British Petroleum na história estava sentado na Sala Oval’ – referindo-se, evidentemente, ao presidente Obama e ao possível insucesso da exigência mais pontual dos manifestantes: a de que o governo norte-americano tomasse a dianteira nos esforços de limpeza no Golfo.
Depois de uma pequena matéria mostrando os avanços em neutralizar o vazamento na costa do estado da Louisiana, McKelway encerrou dizendo que ‘era improvável que o Senado norte-americano viesse a aprovar leis para oferecer incentivo econômico à BP para que a empresa pudesse ampliar seus esforços de recuperação no Golfo, já que as eleições para governador, para o Senado e para o Congresso estão chegando e a última coisa que os democratas querem é onerar ainda mais as contas do contribuinte, na medida em que já estão antevendo várias derrotas do jeito que as coisas estão’, insinuando que uma medida mais contundente em relação ao desastre no Golfo do México só viria a acontecer após o pleito em novembro próximo.
Ameaça de agressão a entrevistado
Depois da polêmica causada por McKelway no telejornal, o jornalista foi chamado para uma reunião a portas fechadas com o diretor regional da ABC em Washington, Bill Lord. Segundo o jornal The Washington Post, o que se sucedeu foi uma briga digna de cinema entre os dois homens, com gritos e xingamentos por toda a redação. McKelway foi suspenso indefinidamente em função do conteúdo da sua reportagem – considerado duplamente tendencioso: contra os manifestantes e contra os democratas – e na semana passada, acabou sendo demitido.
Apesar de toda controvérsia levantada pelo conteúdo jornalístico de McKelway, a razão alegada para a sua dispensa foi insubordinação, por ter se engajado em uma briga com seu chefe. Circulam pela imprensa norte-americana diversas interpretações para a demissão do jornalista. Muitos acreditam que um bate-boca não poderia motivar o desligamento de um jornalista com nove anos de ABC, mas sim as implicações políticas detonadas por McKelway.
Polêmicas não são novidades na carreira de Doug McKelway. Acostumado a fazer o estilo ‘digo o que quero’, o jornalista ganhou a antipatia dos movimentos em defesa da causa homossexual em 2009. Durante um programa que apresenta em um canal a cabo de Washington, McKelway recebeu um cineasta responsável por um documentário onde políticos norte-americanos que fizeram oposição a leis de união civil de mesmo sexo eram apontados como homossexuais ‘de armário’. Alegando que o filme era uma invasão de privacidade, o jornalista classificou o trabalho do entrevistado como abusivo e covarde. No meio da entrevista, o apresentador ameaçou levar o convidado para fora do estúdio e dar-lhe um soco, depois de um duelo de argumentos. No programa seguinte, após uma reação ferrenha dos telespectadores, disse ao público que não se arrependia da sua atitude e negou-se a pedir desculpas.
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Jornalista