Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Admitir os erros é melhor do que fingir que não existem

No dia 13/1, The New York Times publicou matéria dizendo que soldados americanos haviam aberto fogo contra o carro de uma família em Bagdá, matando dois de seus ocupantes. Alguns dias depois, o coronel do exército dos EUA, Pete Mansoor, mandou uma mensagem para cerca de 50 parentes e amigos, afirmando que o jornal havia reportado o fato de forma incorreta: as mortes seriam resultado de estilhaços de uma bomba detonada por terroristas. ‘Apesar de vocês poderem ler as duas versões nesse e-mail, o povo americano só conhece a história original publicada pelo Times, que nunca fez uma retratação ou esclarecimento’ escreveu.

A mensagem do coronel chegou às mãos do editor público do jornal, Daniel Okrent, que a comenta em sua coluna de 14/3/04. De fato, aponta, as mortes foram causadas por estilhaços de bomba. As testemunhas entrevistadas pelo repórter Edward Wong em Bagdá, no dia do ocorrido, fizeram relatos incorretos, o que resultou na falha.

Okrent explica que, ao contrário do que afirma o coronel, o Times publicou a versão correta dos fatos no dia seguinte à matéria original. No entanto, incorreu no que os antigos jornalistas americanos chamavam de rowback. A correção foi feita no meio de uma outra matéria, sobre a derrubada de um helicóptero americano. O ombudsman cita o professor de jornalismo Melvin Mencher para definir com mais precisão o que é rowback: ‘É uma matéria que pretende corrigir outra anterior, sem indicar que esta estava errada, ou sem assumir a responsabilidade pelo erro’. Em outras palavras, ‘um modo de o jornal cobrir seu traseiro sem admitir que estava descoberto’, brinca Okrent.

O editor público encontrou outra história recente em que aconteceu coisa semelhante. Um homem cujo filho estuda no Colégio Dalton, tradicional escola privada de Manhattan, teria se enfurecido com insultos anti-semitas gritados por alunos do Colégio Trinity, também de elite, durante um jogo de basquete entre as duas instituições. Pressionada pela falta de tempo, a repórter Jane Gross só falou com um representante da Trinity, que admitiu que havia sido instaurada uma investigação interna do caso. Havia rumores de que uma TV local iria cobrir o caso, e, por isso, o Times deu a história sem maior apuração. Uma semana mais tarde, nova matéria sobre o caso explicou que os tais insultos teriam sido inofensivos, infantis, e que um dos alunos acusados de proferi-los também era judeu. Além disso, pais do Trinity disseram que o homem que se exaltou chegou a ter ‘embate físico’ com esses estudantes. Mais uma vez, não houve referência à matéria anterior, incompleta. Okrent acredita que isso precisa ser corrigido: ‘O jornal que admite seus erros manterá a confiança de seus leitores por mais tempo que aquele que finge que eles nunca aconteceram’.