Para o leitor que não está familiarizado com o assunto, esclareço que PLC 116 é a designação do projeto de lei da Câmara, em fase final de debate e aprovação pelo Senado, e que trata basicamente da TV por assinatura.
Depois de se arrastar por mais de três anos na Câmara dos Deputados (com o nome de PL 29), ele foi aprovado em 2010 e enviado ao Senado. Talvez na próxima semana, os senadores encerrem o debate iniciado há mais de quatro anos e aprovem a primeira lei de comunicação de massa moderna do País.
O projeto nasceu em 2007 com dois objetivos bem claros e definidos: unificar a legislação da TV por assinatura e abrir o mercado às empresas operadoras de telecomunicações (as teles). Mas, como acontece com a grande maioria dos projetos de lei, o PL 29 (hoje PLC 116) foi ganhando emendas e penduricalhos de todos os grupos oportunistas que sempre querem pegar carona em qualquer lei e acabam dificultando cada dia mais o consenso sobre as questões realmente relevantes da legislação.
Os avanços
O PLC 116 traz, inegavelmente, alguns avanços em matéria de comunicação eletrônica. Poderá ampliar a competição, abrir espaço para novos provedores de serviços, multiplicar as oportunidades para novos investidores, expandir o mercado para os produtores e distribuidores nacionais, aumentar as opções de conteúdo audiovisual de qualidade e até reduzir os preços.
Traz também mais competição e amplia a participação do capital estrangeiro nessa área. Para o usuário, quanto maior a competição, melhor. E não apenas na TV a cabo, mas também via satélite, TV sob demanda (VoD, de Video on Demand), TV sobre protocolo IP ou via internet (IPTV) e outras. E, com maior número de provedores, teremos melhor atendimento, mais qualidade e, seguramente, menores preços.
Com a expansão do mercado, é possível que a maioria dos domicílios brasileiros venha a ter acesso não apenas às diversas modalidades de televisão paga, mas à banda larga e aos demais benefícios proporcionados pela digitalização, pela fibra óptica, pelos satélites de nova geração e, de forma geral, pelas redes de banda larga.
O Brasil tem hoje três modalidades de TV paga: TV a cabo, DTH (TV via satélite Direct-to-Home) e TV distribuída por micro-ondas (MMDS-Microwave Multipoint Distribution Services).
Cada uma delas é regida por legislações ou regulamentos diferentes e, em diversos pontos, conflitantes. Nesse sentido, o PLC 116 será um avanço, pois trará a unificação da legislação para todos os tipos de comunicação eletrônica.
Mais uma cota
Um dos aspectos mais negativos do PLC 116 é a introdução de cotas de proteção ao produtor nacional. É claro que ninguém poderia, em sã consciência, ser contra nenhum apoio legítimo aos produtores nacionais de conteúdo, seja por meio de incentivos, financiamento, desoneração fiscal e patrocínios públicos e privados aos projetos de maior relevância.
O PLC 116, entretanto, propõe o pior caminho para proteger o produtor nacional: o da fixação de cotas, que torna obrigatório o enxerto de produções nacionais nas grades dos diversos canais.
Não se trata premiar a qualidade ou o mérito, mas de garantir espaço e mercado, a qualquer custo, ao produto nacional. Como usuário, recuso-me a engolir mais essas cotas.
Não bastasse a experiência dolorosa da reserva de mercado de informática, que nós, usuários, sofremos durante quase 20 anos, ainda corremos o risco de ter que suportar essa intromissão do Estado na comunicação eletrônica.
Aliás, nos últimos anos, o Brasil se transformou no paraíso das cotas e do paternalismo, a ponto de ter criado até cotas raciais na educação.
Intromissão
Outra distorção do PLC 116 é a intromissão da Agência Nacional de Cinema (Ancine) na definição de conteúdos e na programação dos diversos canais de TV por assinatura.
O grande risco que agora nos ameaça é essa agência, criada essencialmente para o fomento da atividade audiovisual, assumir o papel de órgão regulador de conteúdos da comunicação eletrônica, que não é, a rigor, um serviço público sujeito ao regime jurídico de outorga ou concessão.
Se aprovada essa distorção, a nova lei poderá conferir à Ancine o poder de definir o que é o horário nobre para uma emissora de TV por assinatura. E até de punir os canais que não seguirem suas determinações.
Vale lembrar que, em sua origem, o projeto tinha apenas dois objetivos centrais: unificar a legislação de TV por assinatura e regular a entrada das empresas de telecomunicações nesse mercado.
Mas o Congresso acrescentou ao PLC 116 dezenas de penduricalhos e emendas oportunistas que o transformaram nessa espécie de monstro jurídico.
Expansão
O número de domicílios que dispõem de TV paga no Brasil é hoje de apenas 11,1 milhões de um total de 60 milhões de residências – o que significa que ela ainda não alcança sequer 18% das residências do País.
Mas, para que se tenha uma ideia clara do espaço que esse segmento ainda tem para crescer entre nós, é bom lembrar que a penetração da TV paga na Argentina chega hoje a mais de 50%.
Os senadores ainda podem aprimorar o PLC 116 e ampliar os horizontes da comunicação eletrônica no Brasil.
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[Ethevaldo Siqueira é jornalista e colunista do Estado de S.Paulo]