Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Boa parte do que foi produzido merece preservação e aplauso

A MTV Brasil está morta! Viva a MTV Brasil! O clima não é especialmente de comemoração –especialmente para as pessoas que começaram a ser desligadas agora do canal.

Descontando os poucos que estão lá desde o início (e lá se vão quase 23 anos!), esta já deve ser a quarta ou quinta geração de jovens que entraram lá acreditando no sonho de fazer uma televisão diferente, dedicada exclusivamente a um público: eles mesmos.

Eu, que fiz parte da primeira dessas gerações, sei bem o que significa isso. E consigo talvez entender a decepção e a frustração de ver uma janela de oportunidades criativas como essa se fechar.

Mas às vésperas de o canal se transformar em apenas um grande arquivo musical –na melhor das hipóteses– é interessante notar que boa parte do que a MTV Brasil criou esses anos todos merece, sim, ser revista e preservada. Até mesmo aplaudida.

Com a “distância histórica” de quem saiu de lá há 19 anos, posso reconhecer essa relevância sem nostalgia nem desdém. Porque mais de uma ideia plantada pela MTV Brasil germina até hoje num programa aqui ou noutro acolá.

A tal ponto que esse encerramento das atividades me faz achar que o canal é, de certa forma, vítima do próprio sucesso: você não precisa hoje ligar na MTV hoje para ver MTV –ela está no meio de nós.

Legado da diferença

Com a relevância do próprio videoclipe em xeque pela acessibilidade da música hoje em dia –que faz a própria ideia de um programa de estreia de vídeo (um dos carros-chefes da programação inaugural da MTV do meu tempo) parecer não só romântica, como obsoleta–, a saída, tanto aqui quanto em outras MTV pelo mundo, foi apostar em formatos alternativos.

A própria MTV americana hoje é mais conhecida por seus reality shows do que por sua exuberância musical –onde sua premiação anual, o Video Music Awards, ainda é uma feliz exceção.

Sempre inquieta, nossa versão do canal, desde um bom tempo, vinha apostando no humor e, curiosamente, na dramaturgia (o bom seriado “A Menina sem Qualidades” representando o último suspiro dessa vertente). Mas, aparentemente, até mesmo essa fonte se esgotou.

O que fica então é o legado da diferença –este sim, imortal. Pois, por longos e longos anos, cada criador que ousar um pouco mais na concepção de um novo programa vai estar fazendo uma pequena homenagem à MTV Brasil. Mesmo sem se dar conta disso… 

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Zeca Camargo é jornalista e apresentador da atração dominical “Fantástico” (Globo)