Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Canal France 24, a visão francesa do mundo

Foi o assunto principal da mídia francesa na segunda-feira (12/3). A possibilidade de uma candidatura Jacques Chirac era quase nula, mas não impossível. E o presidente francês manteve o suspense até domingo (11), quando fez um emocionado discurso, transmitido ao vivo pela televisão e visto por mais de 22 milhões de franceses (um terço da população).


Ao fazer o balanço de seus 12 anos de governo, Chirac deixou claro que não seria candidato à sua própria sucessão – o que todos os analistas políticos estavam cansados de saber. Mas foi preciso esperar a fala presidencial para que sua ausência da disputa fosse oficial.


Pela lei, o presidente francês só pode exercer dois mandatos consecutivos, mas como o segundo mandato de Chirac foi subseqüente à lei que o encurtou de sete para cinco anos, este segundo é o primeiro sob a nova lei. Daí a possibilidade de uma nova candidatura Chirac. Mas o presidente está velho e desgastado por 40 anos de política e 12 anos no palácio do Eliseu. E seu ministro Nicolas Sarkozy, presidente do partido de ambos, tem sede de poder e pressa de chegar lá.


Trunfo importante


Como nenhum governante faz um balanço para se autoflagelar, Chirac tentou convencer os franceses de que foi um excelente presidente. Os erros foram, obviamente, omitidos. Quanto aos acertos, ele os citou em profusão – como, por exemplo, a decisão de se opor à invasão do Iraque numa coalizão ocidental. Este foi o grande trunfo da diplomacia francesa em seu governo.


E enquanto a Europa não encontra o caminho de uma política externa unificada, a França figura entre os países europeus que querem pesar nas decisões mundiais.


Mas, para isso, é essencial ganhar a batalha diária para influir corações e mentes. Chirac sabia que tinha uma grande desvantagem: a falta de um poderoso veículo audiovisual para mostrar ao mundo os ‘valores franceses’. Por isso, se empenhou de corpo e alma na criação do canal de informação 24 horas batizado France 24, fruto de uma associação de capitais públicos e privados cujos principais acionistas são a rede privada TF1 e a rede pública France Télévision [ver ‘O mundo visto pela ótica francesa‘, neste Observatório].


Esse é, sem dúvida, o mais importante trunfo que Jacques Chirac deixa a seu sucessor (ou sucessora). Inaugurado dia 6 de dezembro de 2006, o objetivo principal do France 24 é contrapor os valores da França aos do mundo anglo-saxão, cujos porta-vozes são os influentes CNN, Fox News e BBC News.


Olhar multilateral


Chirac não falou no seu discurso dessa nova e poderosa mídia, mas Gérard Saint-Paul, diretor-geral da emissora, deu poucos dias antes uma entrevista coletiva em que fez um balanço dos resultados alcançados em três meses de atividade – segundo ele, ‘muito acima do esperado’.


Com apenas três meses de funcionamento, France 24 já é o primeiro canal mais visto na França, o primeiro no Japão, o terceiro na Inglaterra (depois da BBC e CNN), o terceiro na Alemanha (depois de Eurosport e CNN e antes da BBC), o quarto nos Estados Unidos (depois da CNN, BBC e Al-Jazira). Numa pesquisa de opinião, entre as qualidades do canal foram apontadas sua abertura para o mundo, o fato que transmite bem os valores da França, seu respeito pelas diferenças e sua imparcialidade.


Na busca de ser o mais aberto ao mundo possível, France 24 produz 90% das notícias, reportagens e análises em torno de fatos internacionais e apenas 10% sobre assuntos da França e da política interna.


‘Nossa cultura é a abertura para outras culturas através de um olhar panorâmico e multilateral’, justifica Gérard Sain-Paul. Segundo ele, os estudos feitos antes da criação do canal mostraram que ‘existia uma grande expectativa de um olhar europeu sobre o mundo’. De passagem, uma agulhada na BBC, que por ser pró-americana fica excluída desse ‘olhar europeu’.


Francês, inglês, árabe e espanhol


A redação do novo canal é uma verdadeira torre de Babel: são 170 jornalistas de 28 nacionalidades trabalhando em três línguas : árabe, inglês e francês.


Os jornalistas de France 24 foram selecionados principalmente no curso de ciências políticas do Instituto de Ciências Políticas de Paris – o famoso Sciences Po. Todos os repórteres são bilíngües e trabalham fazendo a mesma reportagem em inglês e em francês para os diferentes jornais do canal.


France 24 mantém uma rede de 30 correspondentes nas principais cidades do mundo, além de contar com fotos, vídeos e reportagens da agência France Presse e da Radio France Internationale.


O canal pode ser visto na Europa, na África, no Oriente Médio, em Washington e em Nova York. Por enquanto, apenas os canais que emitem em inglês e em francês estão no ar, mas em abril deste ano o canal em língua árabe estará emitindo 24 horas, globalização oblige. E no ano que vem será a vez de France 24 funcionar em língua espanhola.


O olhar francês já começa a contar no panorama audiovisual mundial.

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Jornalista