"28/09/06
A quatro dias da eleição presidencial, três linhas de manchetes: pesquisas, dossiê e o suspense em torno da presença de Lula hoje à noite no debate da Globo.
Pesquisas
Folha – ‘Vantagem diminui, mas Lula mantém vitória no 1º turno’.
‘Estado’ – ‘A 4 dias da eleição, Lula mantém vitória no 1º turno’.
‘Valor’ – ‘Pesquisas dão vitória a Lula’.
‘Gazeta Mercantil’ – ‘Lula perto de vencer no 1º turno, dizem pesquisas’.
‘O Dia’ (RJ) – ‘Vantagem vai a 7,5 milhões de votos e dá vitória a Lula’.
Dossiê
‘Globo’ – ‘Justiça quebra sigilo de seis petistas do dossiê’.
‘JB’ – ‘Governo esconde origem do dinheiro’.
‘Correio Braziliense’ – ‘Banco terá de dizer quem sacou dólares’.
‘Estado de Minas’ – ‘PF tem lista de 10 suspeitos de sacar dólares do dossiê’.
Debate na TV
‘Zero Hora’ – ‘Polêmica sobre presença de Lula na TV antecipa o debate de hoje à noite’.
‘Jornal do Commercio’ (PE) – ‘Lula faz mistério sobre participação em debate’.
Sob o ponto de vista jornalístico, a imagem eleitoral de ontem foi a Maré, no Rio, com a carreata da candidata Heloísa Helena acompanhada por traficantes armados de fuzis. O ‘Globo’ e o ‘Estado’ exploraram melhor o flagrante. Às vésperas da eleição, são imagens mais fortes, e como mais carga informativa, do que a foto publicada pela Folha, Geraldo Alckmin falando num celular dentro de um helicóptero.
Eleições 2006/Crise do Dossiê
Está boa a página A6 com as duas reportagens com informações a respeito das estratégias e preparativos de Lula e Alckmin para o debate de hoje à noite na Globo. Faltou, no entanto, uma reportagem com informações sobre a preparação e a estratégia da candidata Heloísa Helena. Como as duas reportagens deixam claro, ela pode ser o elemento perturbador do debate, a grande preocupação dos dois candidatos. Há uma expectativa de que ela seja a estrela do debate.
O ‘outro lado’ de Alckmin, negando que tenha deixado rombo nas contas do Estado de São Paulo, deveria vir com título próprio, e não perdido no meio da reportagem ‘Venda de ação de estatal desagrada serristas’ (pág. A13 da Edição Nacional).
Caderno especial
Achei que faltou ao caderno especial ‘Congresso’ o espaço para análises de especialistas no Legislativo. Artigos e entrevistas com cientistas políticos e outros observadores do Congresso teriam ajudado o leitor a entender melhor os fenômenos e problemas que estão por trás das informações levantadas pelo jornal para o caderno. Ali estão, e bem feitos, os principais dados e balanços do Congresso e um enfoque correto em serviço, mas faltou aprofundamento. Tanto das causas que marcaram esta legislatura que acaba como dos problemas estruturais históricos do nosso Legislativo. Mesmo a reportagem sobre a reforma política – que aponta para o futuro – pedia textos analíticos complementares.
27/09/06
Folha e ‘Estado’ mudaram suas Primeiras Páginas no correr da impressão em função das notícias que esquentaram a campanha eleitoral.
A Folha manteve a manchete – ‘Dólares do dossiê vieram de Miami legalmente, diz PF’ -, mas acrescentou, na Edição SP, a cobertura do debate entre os candidatos ao governo de São Paulo – ‘Rivais de Serra atacam segurança em debate’ – e a notícia de que a ‘Justiça manda prender Freud e mais 5 ligados ao escândalo’. Embora a decisão da Justiça tenha sido de segunda à noite, a imprensa só tomou conhecimento tarde, pelo que parece. O ‘Estado’ começou a rodar, como a Folha, com o resultado parcial das investigações sobre o dossiê, mas com uma manchete que questiona a Polícia Federal – ‘PF já sabe tudo sobre os dólares do PT, e não conta’. Depois, mudou a manchete para os mandados de prisão: ‘Justiça manda prender 6 petistas ligados a dossiê’. O jornal manteve o título sobre os dólares e não deu destaque para o debate, exceto por uma foto de Mercadante e Serra (‘Debate: Jogo de duplas’). Em relação aos dólares do dossiê, vale lembrar que o ‘Estado’ já tinha dado, tendo como fonte a mesma Polícia Federal, que ‘Parte do dinheiro entrou ilegalmente no País’.
O ‘Globo’ também saiu com a ordem de prisão: ‘Justiça decreta prisão de envolvidos com dossiê’.
Nenhum dos grandes jornais deu destaque na Primeira Página para a pesquisa eleitoral da CNT/Sensus, a mais recente (feita depois da do Ibope e do Datafolha) e a que dá a maior diferença entre Lula e a soma de seus adversários.
A Folha traz, enfim, uma notícia relevante sobre a gestão do ex-governador Geraldo Alckmin em São Paulo: ‘Alckmin deixou R$ 1,2 bilhão de rombo para Lembo em SP’. A chamada teve mais destaque na Edição Nacional.
Eleições 2006/Crise do Dossiê
Desapareceu, na Edição SP, a meia página de noticiário sobre o suposto envolvimento do ex-ministro Barjas Negri (PSDB) no escândalo dos sanguessugas publicada na Edição Nacional.
Os títulos das reportagens da Edição Nacional que caíram: ‘Presidente de CPI vê prova contra tucano’, ‘Empresário daria à Justiça papéis contra tucano’ e ‘Abel agora diz que foi duas vezes à Saúde’ (página A7).
Para abrigar o noticiário dos debates que terminaram tarde, a Edição SP teve de excluir algumas reportagens publicadas da Edição Nacional. Precisavam ser exatamente as referentes ao noticiário sobre o suposto envolvimento dos tucanos?
Justiça
Ficou muito reduzida e quase sem visibilidade, na Edição SP, a notícia de que foi extinta a ação penal contra o juiz federal Ali Mazloum (‘STF extingue ação penal contra juiz’, pág. A13).
Coronel Ubiratan
Segundo a Folha, nenhuma prova material ligando Carla [Cepollina] à morte do coronel Ubiratan havia sido apresentada oficialmente até ontem. Mesmo assim, a polícia disse que a namorada matou o coronel e o jornal publicou a notícia (é o título da Primeira Página da Folha de hoje e de vários jornais).
Acho que temos aí um bom caso para a reflexão da Redação. O jornal se baseia na palavra da polícia (e na iminência do indiciamento da namorada, anunciado há dois dias), mesmo sem as provas materiais apresentadas. A polícia tem fé pública, e é provável que seja esta a justificativa do jornal para publicar a notícia que incrimina a namorada mesmo sem as provas.
A Folha e os outros jornais agem corretamente ao noticiar o caso desta forma antes do indiciamento? Lembro de dois outros casos famosos em que a dinâmica do noticiário foi a mesma – a polícia tinha suspeitos, incriminou-os publicamente sem provas, a imprensa publicou as acusações e depois a própria imprensa teve de fazer a sua mea culpa por precipitação e irresponsabilidade. Foram os casos da Escola Base – e ali havia, desde o início, pelo menos um laudo pericial que parecia sustentar as suspeitas – e no crime da Rua Cuba.
Como disse, é um caso para reflexão.
25/09/06
A imagem mais impressionante do domingo está na capa de todos os jornais de hoje: a dor da juíza de atletismo que teve o pé transpassado por um dardo. A foto da Folha é a que deixa menos nítida a ponta da lança, confundida com a meia. Mas é forte, de qualquer maneira.
As manchetes reproduzem as frases do discurso de Lula ontem em Sorocaba:
Folha – ‘Lula diz que ´mata´ eleição no 1º turno – Presidente se compara a Jesus Cristo e Tiradentes ao falar de traição no caso do dossiê contra tucanos’. O jornal editou, sob o título ‘Cristo e Tiradentes’, um quadro que destaca as principais frases do candidato.
‘Estado’ – ‘Lula: ´Podem denunciar, mas ganho no 1º turno – Presidente critica ´elite´ e diz que Cristo e Tiradentes também foram traídos’.
‘Globo’ – ‘Lula se compara a Cristo e diz que ganha no 1º turno – Presidente afirma que abandonou a modéstia e vencerá de ´cara limpa´‘.
A Polícia Federal e os jornais não avançaram nada em relação ao escândalo do dossiê e o noticiário entrou na fase de cobranças e intenções.
Folha – ‘CPI critica a demora para revelar origem de dinheiro’ e ‘PF vai pedir a quebra do sigilo telefônico de cinco petistas’.
‘Estado’ – O assunto sumiu da Primeira Página.
‘Globo’ – ‘PF quer sigilo de bancos’ e ‘Dinheiro seria levado de avião’.
Eleições 2006
A importância dada pela Folha e pelos demais jornais ao discurso de Lula em Sorocaba justificava a publicação da sua íntegra ou a remissão para a leitura da íntegra na internet – no caso da Folha, no Folha Online.
Há trechos importantes do discurso que a Folha não menciona. Por exemplo, a referência à ‘elite aristocrática’ (a campanha não é de um candidato contra outro, ‘mas do povo trabalhador contra uma elite aristocrática que manda neste país desde que Cabral chegou aqui’). A publicação da íntegra ou a remissão para a internet permite que o leitor tome conhecimento de todo o discurso e o avalie por seus próprios critérios.
A mesma observação vale para os discursos de Alckmin na Paraíba.
Como a campanha tende a ficar cada vez mais acirrada (vide discursos de sábado) e a cobertura acaba sempre valorizando os discursos mais do que qualquer outro ato de campanha (exceto as pesquisas), seria uma boa medida pensar em publicá-los ou remeter para a internet.
As reportagens ‘Setores da oposição já propõem negociar agenda mínima de votações para 2007’ (pág. A5 da Ed. SP) e ‘Presidente acena à oposição para evitar crise de governabilidade’ (pág. A10 da mesma edição) se completam. O esforço do jornal de buscar informações de bastidores além do cenário conturbado de véspera da eleição teria tido mais força se elas tivessem sido editadas juntas.
Muito boa a iniciativa do ‘Folhateen’ de encaminhar perguntas sobre alguns dos problemas que interessam ou afetam os jovens para respostas dos principais candidatos à Presidência da República. Achei, no entanto, que a edição ficaria melhor com comentários de especialistas e/ou uma análise das repostas. As respostas que Lula e Alckmin deram, por exemplo, para a questão de cotas mereciam uma intervenção do jornal indicando as divergências que estão em jogo e que foram disfarçadas pelos dois candidatos.
Dossiê
Está boa a reportagem da Folha que reconstitui a rotina de Luiz Antonio Vedoin na prisão em Cuiabá (‘Vedoin tem direito a TV e visita diária de sua mulher’, pág. A9). Mas a reportagem do ‘Estado’ ficou mais forte porque flagrou, inclusive com foto, a visita ontem, domingo, de toda a família à prisão. O que na Folha está reconstituído com testemunhas, no ‘Estado’ está documentado. Há inclusive o registro de um policial saudando a mulher de Vedoin com um beijo.
Quem passa o dia com cela aberta é Luiz Antônio Vedoin, e não a sua mulher, que não está presa. Esta mal redigida, portanto, a ‘lupa’ da página A9: ‘Mulher de Vedoin, que passa dia com cela aberta, usa fato de ser advogada …’.
Resposta
Recebi da editora de ‘Mundo’, Claudia Antunes, via Secretaria de Redação, a seguinte mensagem a respeito dos comentários que fiz na Crítica Interna de sexta-feira:
‘Acredito que está correta a sua avaliação sobre a entrevista do ditador do Paquistão, mas não a avaliação sobre a visita de Hugo Chávez ao Harlem. Ao abrirmos com o aumento das vendas do livro ‘Hegemonia ou Sobrevivência’, que nem é o último lançamento do Noam Chomsky, dimensionamos melhor o impacto do discurso do presidente venezuelano na ONU e de sua passagem por Nova York. Demos dois parágrafos sobre a visita ao Harlem na edição nacional e três na São Paulo’.
Embora a venda do livro tenha sido um enfoque criativo e pertinente, o incidente no Harlem foi mais uma evidência da deterioração das relações entre os dois países, que acabou tendo mais um ato no sábado, com a retenção do ministro das Relações Exteriores da Venezuela no aeroporto de Nova York (‘Venezuela pede retratação por detenção de ministro’, pág. A14 de hoje). Acho que a edição poderia ter dado visibilidade para as duas notícias – a da venda do livro e a do atrito no Harlem.
Aviso
Viajo amanhã para São Paulo para participar da comissão julgadora do Prêmio Folha. Não haverá, por esta razão, a Crítica Interna."