Quando a Band afastou Rafinha Bastos por uma piada, abriu a porta para o desconhecido. Na entrada do ano, o comediante fechou com o Netflix -serviço de vídeo por demanda, recém-chegado ao país- e estreou três especiais de “stand-up”.
A contratação deve ser anunciada hoje pela programadora de TV paga Fox, que investe em conteúdo nacional para ser concorrente de fato da Globosat. “Ainda não posso comentar”, diz Marcelo Cataldi, vice-presidente da Fox Brasil.
Rafinha é parte de um movimento maior da TV por assinatura em 2012, cujos motores são a nova lei da TV paga, a maior competição tanto entre programadoras como operadoras e o avanço do vídeo por demanda, via web.
Momento nacional
A Fox estreia o Fox Sports no dia 5 e enfrenta resistência de operadoras que controlam a TV paga, Sky (satélite) e Net (cabo), que pertencem a grupos associados à Globo. Anunciou que seu canal Speed dará lugar ao de esportes -que tem exclusividade da Libertadores na TV paga.
Na última sexta [20/1], o Meio & Mensagem noticiou que a Fox deu novo passo ao comprar o BandSports, que tem direitos de transmissão dos Jogos Olímpicos de Londres com SporTV, da Globosat, e ESPN, da Disney. A concorrência fez o SporTV escalar Galvão Bueno para os jogos.
A aposta no Fox Sports “por si só já sinaliza que a perspectiva é muito boa para a TV paga”, diz Cataldi.
A Fox investe no país em resposta ao aumento de demanda por TV paga, que credita “em boa parte” à classe C, que agora tem “condições de experimentar [a TV por assinatura] e está gostando”.
O novo canal “está alinhado com o momento da TV por assinatura”, diz Cataldi. Em 2011, a Fox já lançou o Bem Simples, “100% produção local”, e fez as séries “9 MM” e “Bicho Papão”, o documentário “Across the Amazon” e programas como “O Guia”, de gastronomia, “sucessos” de outros canais seus.
Mas esporte é o foco em 2012. “Os anos pares tendem a ser anos em que a TV paga tem ganhos de participação no bolo publicitário, em função de grandes eventos como os Jogos Olímpicos”, diz Alberto Pecegueiro, presidente da Globosat. “A perspectiva é manter em 2012 um crescimento do faturamento acima da média do mercado.”
Ele diz que a nova lei da TV paga (12.485), que entra em vigor neste ano e estabelece cotas de conteúdo nacional, “vai acelerar o processo, principalmente nos canais internacionais”, de maior atenção à produção brasileira.
Pecegueiro critica o que avalia como “benefício” ao programador internacional de TV paga: normas fiscais estipulam que, “do imposto sobre a remessa de dinheiro, parte pode ser usada para produzir conteúdo no país”, o que favoreceria Fox, HBO e Turner. “O programador brasileiro fica em desvantagem. Toda a nossa produção é feita com dinheiro de verdade.”
Neste ano de mais concorrência, o grande lançamento da Globosat é o canal infantil Gloob. A nova programação só entra no ar depois do Carnaval.
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Televisão na internet investe na produção de conteúdo nacional
Um produtor de São Paulo, que pede anonimato, relata que seus negócios estão sendo alavancados não pela TV paga, mas por um novo ator: o vídeo por demanda, via internet. Serviços como o Netflix passaram a investir em produção nacional.
Criado há quatro anos nos EUA e instalado há quatro meses no Brasil, o Netflix cobra R$ 14,99 por mês para permitir o acesso, de início, a 1.300 títulos, entre filmes e séries. O acesso pelo televisor é feito hoje com consoles de games (PS3, Wii, Xbox) e outros aparelhos, além das novas “smarTVs”, televisores com navegação on-line.
Jonathan Friedland, vice-presidente global de comunicação e marketing do Netflix, diz que o avanço inicial no Brasil, “nosso primeiro serviço em língua estrangeira”, foi lento, melhorando perto do Natal com a viabilização do acesso por mais consoles.
Não dá números, mas em carta aos acionistas o Netflix disse estar “servindo centenas de milhares de latino-americanos”, 40% brasileiros.
Segundo seu presidente, Reed Hastings, “é cedo para dizer se vamos chegar ao equilíbrio entre receita e despesa [break even] em dois anos, como gostaríamos”. Ele e Friedland preferem destacar que é hora de “aprender”.
No Brasil, o Netflix já aprendeu que, embora a classe C queira filmes e séries dubladas, a maioria dos assinantes iniciais tem renda maior, é jovem e quer legendas.
E quer conteúdo nacional, mas “alternativo, diferente”, daí o investimento em produções como os especiais de Rafinha e do UFC. “Estamos falando com produtores e também com redes. Licenciamos conteúdo da Globo para o resto da América Latina. Rafinha está na América Latina, nos EUA e no Canadá.”
Friedland avisa que vai às compras em fevereiro no Rio Content, feira criada em 2011 pelos produtores independentes que acabou atraindo 2.000 pessoas. Neste ano, a palestra central será de Jack Bender, diretor de “Lost”.
“A gente pensa sobre isso o tempo inteiro, acompanha de perto”, diz Alberto Pecegueiro, da Globosat, sobre a chegada do vídeo sob demanda.
No início de 2011, nos EUA, as operadoras de cabo sofreram sua primeira queda na base de assinantes. “Pela primeira vez, a conexão do domicílio poderia estar sendo abalada pela oferta de conteúdo da internet”, diz ele. “Mas o ano fechou, e a conclusão foi que a queda se deu mais em função da recessão.”
Pecegueiro diz que “é claro que se constata, nas pesquisas, aumento no consumo de vídeos”, daí a resposta de operadoras e programadoras, nos EUA e agora no Brasil, com a “TV everywhere”, permitindo acesso aos programas via internet, em qualquer tela. “Até aqui não há nenhuma 'disrupção' no negócio de TV paga.”
Friedland diz que “todos se movem nessa direção. Em dez anos, todos vão estar lá, até a Globo”. (Nelson de Sá)
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Nova lei incentiva parcerias com independentes
A TV paga cresceu 30,5% em 2011, mas o avanço se concentrou no serviço por satélite, não a cabo. Para este ano, com a lei 12.485, que abre o cabo às teles, “você tem injeção maior de recursos e competição maior”, comemora Marco Altberg, presidente da ABPI-TV, associação das produtoras independentes.
Alexandre Annenberg, da ABTA, associação que reúne operadoras e programadoras, saúda a lei pelo impulso que vai dar ao cabo, que atravessou uma década paralisado: “O DTH [satélite] cresceu expressivamente, mas porque o cabo ficou estagnado”.
Hoje, “de modo geral, só uma empresa oferece o serviço por cabos, a Net”, diz Alex Galvão, que cuida da regulamentação na Agência Nacional do Cinema. “As outras, Telefônica, Oi, estavam impedidas. Com a nova lei, elas poderão e certamente farão [o serviço por cabo].”
A lei, cuja regulamentação entrou em consulta pública na semana passada, também diz que “no mínimo 3h30min semanais dos conteúdos no horário nobre deverão ser brasileiros”, tanto por cabo como satélite, com “metade de produtora independente”.
“Houve um impulso pela lei, mas já estávamos tendendo para isso, para nos aproximarmos mais do consumidor, culturalmente falando”, diz Marcelo Cataldi, vice-presidente da Fox. Para este ano, ele anuncia “vários produtos já a caminho, em parceria com produtoras locais”.
Annenberg avalia que a cota “sem dúvida está estimulando o setor, sobretudo a produção independente”, porém “quem tem potencial para alavancar a indústria do audiovisual” no país não é a TV paga, e sim a TV aberta. “Mas ela está toda blindada, de forma a resguardar seu modelo de negócios.” (NS)
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[Nelson de Sá é articulista da Folha de S.Paulo]