Thursday, 26 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Quando a dublagem se impôs no Brasil

Durante muitos anos, os que adquiriam pacotes de TV por assinatura no Brasil encontravam as seguintes opções de canais: esportivos; voltados ao público infantil; filmes e séries; noticiosos; algumas poucas opções de canais de compra e religiosos. Durante o período em que essa realidade perdurou poucas eram as reclamações dos assinantes que não fossem de quando o sinal caía.

Para os viciados em filmes e seriados, haviam opções de canais com áudio dublado ou original dos programas, com a exibição de legendas. No entanto, nos últimos dois anos, a chamada classe C ganhou aumento em seu poder aquisitivo e passou a usufruir desse “capricho”. Nada mais justo para aqueles que eram limitados à programação sem criatividade ou inovação da TV aberta. Com o passar do tempo, a situação na TV a cabo passou a mudar com a dublagem parcial dos conteúdos exibidos.

Da mesma maneira, no cinema, havia opções de sobra para ambos os públicos sem que ninguém saísse perdendo. Nos cinemas maiores, as salas exibiam os dois tipos de filmes e o público tinha liberdade de escolha. Para minha surpresa, fui ao cinema e deparei com três dos quatro filmes em exibição dublados, não importando o horário. Meses atrás, era para este cinema que me dirigia para assistir a filmes legendados.

Seria uma postura correta?

Canais 100% dublados foram criados, voltados para o nicho de pessoas que preferem ver filmes dessa maneira. Porém, atitudes mais drásticas foram tomadas pelos responsáveis pelos canais. Ignorando completamente aqueles que apreciavam o áudio original de seus programas e filmes, vários canais, outrora exibidores ferrenhos de filmes e séries legendados, passaram a dublar o conteúdo de forma indiscriminada e excluindo a possibilidade de colocar legendas facultativas em sua programação.

Atualmente, contam-se nos dedos os canais que ainda utilizam essa forma de exibição de conteúdo. A busca desvairada por audiência é tamanha, que na edição de 8 de junho de 2012, a revista Época publicou uma reportagem com o título: “A Dublagem Venceu as Legendas”. Ironicamente, ela foi vinculada na seção “Mente Aberta”. Com a matéria, a revista apresenta e defende fatos da imposição (sim, essa é a palavra, pois a opinião dos antigos telespectadores tampouco foi levada em consideração) da dublagem nos cinemas e nas televisões.

Em vários trechos da reportagem, é perceptível o favorecimento dos filmes dublados aos legendados, estes tendo um espaço ínfimo para “defesa”. Chega-se a afirmar que ler 30 páginas de legendas em duas horas pode ser um exagero para quem não está acostumado a ler. Agora, os questionamentos: a revista devia se orgulhar de produzir uma matéria que explicita o quão pouco lê o brasileiro de forma positiva? Não seriam os filmes e séries legendados uma maneira de aperfeiçoar e conhecer uma língua estrangeira importante, como o inglês? Por mais que a dublagem seja mais atraente para os que não possuem o hábito da leitura, deixar de incentivar algo tão importante para a formação do ser humano é uma postura correta a ser adotada por uma publicação que atinge todas as camadas sociais?

Respeito assegurado

Ao final da matéria, o declínio das legendas é comparado ao preto e branco dos filmes da década de 20. Seria então o gosto pela voz e interpretação natural dos atores obsoleto? Não. Os espectadores deveriam ter seu gosto levado em consideração novamente, não sendo oprimidos pelos desejos de duas classes: os que preferem comodidade e os que só se empenham em obter lucro.

Sobra para os órfãos das legendas a compra e aluguel de DVDs, a assinatura de serviços via streaming (os quais considero bastante democráticos e são acessíveis da classe A à D) e a boa vontade de alguns canais a cabo que ainda disponibilizam legendas facultativas ou nativas em poucos programas.

Alguns movimentos a favor das legendas estão acontecendo na internet, gerando alguma repercussão nos diretores dos canais a cabo. A disponibilização de legendas para escolha utilizando opções no controle remoto está mais acessível, porém aquém do resultado esperado. Resta aos fãs se adequarem ao formato imposto de maneira egoísta pelas emissoras e cinemas, ou continuar sua luta para ter seu respeito assegurado novamente.

***

[Hamlet Ribeiro é estudante de Jornalismo, Fortaleza, CE]