O Fantástico, programa jornalístico da Rede Globo, na busca por resgatar sua audiência perdida convocou uma estrela do futebol brasileiro, Ronaldo Fenômeno, para participar de um dos seus quadros e assim tentar alavancar sua audiência. E qual quadro foi este? Um denominado “Medida Certa”, que tempos atrás foi protagonizado pelos âncoras do programa. Este quadro consiste em propor um esquema de acompanhamento médico e fisiológico na busca por perda de peso. Assim, o “paciente” acompanhado por profissionais adequados, médico, nutricionista, educador físico, tentará perder massa corpórea e “entrar em forma”.
Mas o Fantástico não é o primeiro jornal televiso a adotar esse tipo de proposta. Programas como Jornal Hoje, Jornal da Record, entre outros, já adotavam a fórmula há algum tempo. E em que consiste esse processo? Expor rotineiramente dicas de como perder peso, como mudar a sua dieta alimentar, como praticar exercícios físicos corretamente etc. Aliás, o sistema parece ter dado certo, pois o conceito ganhou vida própria e daí nasceram os programas Aí, doutor, da Record, e Bem estar, da Globo.
Aparentemente esse tipo de reportagem (ou de programa) tem uma boa intenção: ajudar o brasileiro a preservar a saúde do corpo. E num país onde o índice de pessoas obesas cresce exponencialmente, isso parece ter uma função importante. Mas não nos deixemos enganar pela face de “bom moço”. Essas notícias são perigosas e perniciosas, talvez até mais do que as mal afamadas gordurinhas. E onde está o problema? Ao meu ver, no excesso. Em todo jornal da TV, a qualquer hora do dia ou da noite, há um jornalista “ensinando” como ter uma vida “saudável”. E isso, além de chato, é opressivo. Pense numa pessoa de mais peso ouvindo a todo momento alguém tentando convencê-la que é fácil realizar algo que ela, gordinha, a vida inteira tentou realizar e não conseguiu. Ou talvez aquela pessoa que não gosta de exercícios físicos e vê a toda hora alguém dizendo que se ele continuar sedentário irá morrer logo.
Controle do corpo pelo discurso de poder
Não conheço bem a técnica médica, mas sei que isso não é uma condição definitiva. Há pessoas que não praticam esportes, tem uma dieta desequilibrada e tem uma vida longa. Os hábitos alimentares são livre definições das pessoas. Cada um tem o direito de escolher o que comer ou o que fazer com o seu corpo.
Os jornalistas tentam se apoderar da autoridade médica e repassar, utilizando-se desse poder, uma opção política. E quando insistem em fazer isso rotineiramente, erram na dose. E como se sabe desde os gregos, o que separa o remédio do veneno é a sua boa utilização. Filosoficamente, isto que esses profissionais estão fazendo tem o nome de “biopolítica”, conceito este que foi formulado pelo filósofo francês Michael Foucault. E qual o mote da biopolítica? O controle dos corpos pelos discursos de poder. E é exatamente isto que este jornalismo médico anda fazendo. Não se engane, quem deve decidir como cuidar de sua vida é a própria pessoa. Estes discursos podem até funcionar se repassados pelos médicos ou outros profissionais da saúde pública, mas isso dentro de um contexto específico e fechado pelas paredes do consultório. Quando algo sai do ambiente hospitalar e perde controle, isso só pode se tornar um vírus.
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[Pedro Henrique Corrêa Guimarães é estudante, Goiânia, GO]