O Roda Viva da segunda-feira (8/4), que teve no centro o ministro do Esporte, Aldo Rebelo, foi uma aula de bom jornalismo. Os entrevistadores fizeram o que deveria ser praxe na imprensa: botar o político – o representante do povo eleito por este, aquele que define o uso do bem público – contra a parede. Prensá-lo, não só para se ter ideia do que o governo faz, fará ou deixou de fazer, mas especialmente para que o detentor de cargo público se perceba vigiado, fiscalizado. Alguém ciente de que a sociedade está nos calcanhares pensa duas ou mais vezes antes de descambar à corrupção.
Não que o jornalismo deva ter um lado político, fazendo oposição a uma agremiação, enquanto defende outra. A imprensa joga com a sociedade e eis aí o único compromisso da notícia. A função de quem informa é olhar para o representante municipal, estadual ou federal sempre com desconfiança, independente do partido que ocupe. Lembre-se: lá no início não falamos em jornalismo panfletário. Falamos, sim, em seriedade e comprometimento apenas com o público, mesmo porque a política é especialista em cometer deslizes, razão pela qual qualquer ideologia está propensa a titubear. Seja PT ou PSDB no trono, é mais prudente olhar para o poder com certa cautela, com o infalível distanciamento partidário.
O substituto de Orlando Silva, também do PCdoB – porque o esporte brasileiro é dos comunas há algum tempo –, dentre tantas respostas, falou sobre as obras nos estádios, o dinheiro utilizado, em geral, nos preparativos para a Copa, além do controverso presidente da CBF, José Maria Marin, e de questões financeiras dos clubes brasileiros, no que tange à dívida que têm com o governo. Rebelo deve ter jurado a si mesmo nunca mais voltar ao centro do principal programa da TV Cultura. Um dia antes, no Mesa Redonda da Gazeta, o ministro pintou e bordou diante de jornalistas mal preparados. A exceção foi Wanderley Nogueira, que visou a pressionar o político e não se contentou com as respostas evasivas do dito cujo.
Cada um no seu lugar
E é isso que os políticos precisam entender: o bom jornalismo não vai ser condescendente com as ilegalidades, com os acontecimentos sob suspeita. Ele não vai observar de longe os desmandos, a atuação negligente ou corrupta. Ele simplesmente não vai acompanhar a história transcorrer sem questionar. A consequência disso é a política olhar, com certa revolta, para a imprensa empenhada em cumprir o seu papel, alegando que “esses jornalistas só sabem falar mal, não conseguem ver o lado bom das coisas”. Quando isso ocorrer, ponto para o jornalismo.
Partindo do princípio de que não é obrigação da imprensa jogar flores no que o político faz de bom, mas sim, apontar o que errado está ou o que requer ação premente, cabe à política fazer a sua promoção. E não é por falta de alternativas que o representante da sociedade vai padecer de pouca ou nenhuma visibilidade. Além de possuir uma equipe de assessoria – e todos os cargos oferecem verbas para que se contrate esse tipo de serviço –, o próprio detentor de cargo político pode tornar públicas as suas realizações, participando de redes sociais, abrindo blogs, postando vídeos, fotos, depoimentos do que tem feito de melhor. Essa parte não cabe ao jornalismo, a não ser o de “chapa branca”.
Talvez pelo fato da imprensa ter surgido, no Brasil, vinculada à política, além de haver a tendência, por parte do representante, de permanecer no poder por conta de todos os privilégios com que conta, tem-se a dificuldade de convivência entre o jornalismo mais sério e a classe política. Não aceitar a pluralidade de opiniões e as vozes divergentes é típico das mentalidades mais atrasadas e, tristemente, acatado pelo jornalismo de compadres. A democracia passa pelo livre trabalho jornalístico, aquele que busca informar o público do que lhe é relevante e de interesse. É política lá e jornalismo cá. Se o engravatado não compreende tal dinâmica, cabe ao profissional da notícia botar cada um no seu devido lugar.
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Thiago Cury Luiz é jornalista e professor, Getulina, SP