Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Emissora pública, dinheiro estatal

Há poucas semanas o Roda Vida comemorou seus 18 anos, destacando-se como um dos melhores programas da televisão brasileira e um marco de qualidade na TV Cultura. Sempre que penso na Cultura, que se autodefine como emissora pública, e assim é reconhecida, pergunto-me quão pública ela realmente é.

As sucessivas crises financeiras da emissora apontam para a falta de recursos. Deveriam ser esses recursos oriundos do estado de São Paulo? Se essa for a resposta, então a Cultura é mais estatal do que pública, pois sua sobrevivência dependeria de recursos governamentais. Há muito tempo sabemos que as ‘televisões educativas’ funcionam como braço de propaganda governamental. Logo, como ser independente, ter liberdade jornalística e senso crítico quando a sobrevivência depende do mesmo governo que poderá ser questionado e atacado? Sem o amparo financeiro da sociedade civil não há televisão livre, muito menos pública.

Um abelheiro

As televisões públicas e educativas têm seus conselhos consultivos e deliberativos, mas vivem do dinheiro estatal. Manda quem paga a conta, quase sempre retirando verbas da educação. Ou seja, os conselhos pouco podem decidir, porque sem dinheiro não existe projeto televisivo que resista.

Uma TV pública, como bem argumenta Laurindo Leal Filho, espelhando-se no modelo da BBC numa visão de serviço público, realiza um serviço que empresas comerciais ou órgãos estatais não estariam habilitados a fazer: atendem às necessidades do público. Ainda, desperta o público para idéias e gostos culturais menos familiares, ampliando os horizontes, enriquecendo intelectualmente a vida do telespectador. Sob esse ponto de vista, a TV Cultura é pública. Mas não seria essa também a função de toda e qualquer emissora comercial, visto que recebe uma concessão pública?

Para atender a essa demanda de forma independente e criativa, a TV pública precisa de autonomia financeira. Estaria a solução no apoio cultural? Mas qual a diferença entre vender a imagem ou o produto de um ‘apoiador-patrocinador’? Parece apenas um eufemismo bobo. Eis o problema maior da televisão pública: quem paga a conta? Taxar a televisão comercial e o anunciante não seria uma solução? Ou, quem sabe, seguir o modelo inglês, que mantém as emissoras públicas com verba proveniente de uma licença anual paga por todas as pessoas que têm um aparelho receptor?

A primeira opção parece ser a mais viável. Mas quem vai querer mexer nesse abelheiro?

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Jornalista, mestre em Comunicação pela PUC-RS