Em 2008, quando do início do programa Custe o Que Custar (CQC), a Rede Bandeirantes apostava num formato que era sucesso em outros países. O conteúdo investigativo, salpicado de bom-humor e focado no serviço à população, fez do CQC um sucesso em seus primeiros anos. Dali brotaram alguns talentos até então desconhecidos do público brasileiro. Destaque-se Monica Iozzi, atualmente na Globo, e Danilo Gentili, que comanda seu próprio programa de talk show no SBT.
À época, o programa surgiu como uma alternativa ao baixíssimo nível – em conceito e conteúdo – do humor na televisão brasileira. Sem apelação, não havia esquete que se destacasse na telinha. Nesse sentido, o CQC promoveu uma reformulação, sob a premissa de “humor inteligente”. Incapaz de lidar com o formato, o Senado Federal proibiu o acesso de repórteres do programa. Prefeituras e empresas privadas também sofreram nas mãos da postura incisiva e investigativa de Marcelo Tas e companhia.
De 2008 a 2015, o mundo mudou. Os gostos da audiência se adaptaram. E a crise dos veículos de comunicação se agravou. Em vista disso, a Band anunciou a exclusão do CQC em sua grade de programação para 2016. Em comunicado, a emissora declarou que o programa passará por um “ano sabático”, para retornar somente em 2017. Difícil de acreditar. A bem da verdade, o formato se esgotou. A adição e remoção de produtos faz parte do contexto de todas as empresas que ambicionem permanecer competitivas.
Do sucesso à derrocada
Enquanto sustentado pela proposta de investigação, o CQC teve êxito. Revelou mazelas gravíssimas, especialmente as relacionadas ao poder público. Nos últimos anos, todavia, a despeito da reforma que tirou Marcelo Tas da bancada e colocou o ator Dan Stulbach no lugar, o programa caiu demais em qualidade. Passou a apostar exclusivamente na polêmica como forma de conquistar o público. Além disso, as edições começaram a ditar o ritmo das reportagens.
Em inúmeros casos, as matérias não tiveram pudor de cortar depoimentos que favorecessem a voz das pessoas ou empresas que o programa acusava. Isso é o que de mais nocivo há na imprensa. Mas o início da queda do programa é anterior. Um dos principais pilares do CQC era o polêmico Rafinha Bastos, que indiscutivelmente se destacava sobre os demais. O problema de Rafinha? Ausência de freio. Ele não sabia medir suas palavras. Num comentário isolado, disse que “comeria Wanessa Camargo e o bebê”. A declaração foi espetacularizada pela mídia. A indignação de Wanessa virou a indignação de todas as mães do Brasil. Rafinha foi afastado, mas depois retornaria à Band. Retornaria para sair novamente do extinto Agora é Tarde. O CQC ficaria à deriva, com mais do mesmo. Matérias sem sal, repetitivas, que apostavam menos na informação e mais na polêmica. O humor também se tornou apelativo, com excesso de palavrões. Apesar de um começo promissor, nem Stulbach foi capaz de levantar um formato falido.
O CQC foi vitimado por um mal que assola a TV brasileira. O desespero pelo ibope – em constante queda com a competição da internet – está levando as emissoras a fazer programas que garantam números, não importando os meios. Enquanto produzia jornalismo, o CQC funcionou. Se, de fato, voltar em 2017, a Band deverá trazer de volta o que deu certo. De outro modo, a memória da televisão brasileira ganha um novo capítulo.
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Gabriel Bocorny Guidotti é jornalista e escritor