Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

O grotesco impera na programação

Bastasse o pacote de entretenimento de qualidade duvidosa, imposto pelas ‘grandes’ redes de TV a suas afiliadas, eis que a programação local de nossos canais abertos e fechados se volta à produção e à exposição do ridículo como forma de espetáculo.

Alguns críticos de televisão, não confundir com colunistas de TV, acreditavam que, com o advento dos canais fechados, a programação tenderia a melhorar sua qualidade, uma vez que o público assinante da programação por satélite ou cabo, por ter um diferencial na formação da educação, poderia representar na divisão do bolo uma classe com poder de compra, portando de ‘alienação’, o que obrigaria no mínimo a uma programação de qualidade superior à dos canais abertos.

Independentemente de qual satélite o cidadão esteja assinando, a proliferação dos ‘reality shows’ vai além-mar; um bombardeio visual a um público cansado do óbvio, carente de uma programação nova e que traga emoção a uma vida entediada e estressada, imposta pela competitividade num mundo globalizado. Mas não são democratizados valores como educação, saúde, trabalho, que fazem parte de uma sociedade de privilégios, não de direitos.

Os grandes conglomerados midiáticos impõem ao mundo uma programação sem diversificação, sem criação, sem valores culturais, na qual a imitação barata é a nova ordem, em que nos limitamos a zapear de canal em canal em busca de algo que nos entretenha, para descobrirmos alguns meses depois que entre 150 canais não assistimos a pouco mais de cinco, ou seja, o universo prometido de variedade se resume a sucessiva repetição de programas.

Baixaria

Mesmo assim essa pequena elite dos ‘com-cabo’ representa um número de incluídos na grande mídia, expondo uma grande massa dos ‘sem-cabo’, a quem chamamos de excluídos das duas grandes redes de satélite que operam entretenimento televisivo no Brasil, embora o proprietário seja o mesmo Murdock [o magnata de mídia Rupert Murdock, que tem participação nas operadoras Sky e Direct TV]. Na programação nacional de muito tempo, a concorrência vem sendo uma ‘guerra’ não pela qualidade, mas pelos números de audiência.

Não há limites, seja no horário de exibição, seja no desrespeito às pessoas expostas como fantoches, com a falsa promessa de se tornarem celebridades, de ganharem fama e dinheiro, como num conto de fadas, que não tarda em virar pesadelo. Tal exposição do ser humano dá muito dinheiro às grandes redes, seja através dos assinantes, dos comerciais ou daquilo que passou a se chamar de forma errônea de ‘merchandising’, os comerciais de produtos ‘fabulosos’, milagrosos e mentirosos, tal qual a próxima atração a ser exibida.

Eis que a televisão de ‘Sergipe Del Rey’ não poderia ficar de fora. Passando pela programação esportiva, informativa e de entretenimento, o que temos visto é a exposição do grotesco como opção de programação local; a baixaria começa na teatralização de seus apresentadores caricatos, de criatividade, cultura e ética duvidosas, não importando aí os valores humanos e esquecendo o alvo básico do jornalismo e também do entretenimento, que vem a ser o cidadão.

Marionetes

A idéia é confundir cada vez mais jornalismo e entretenimento, criando na cabeça das pessoas a falsa idéia de que o mundo se resume num desfile de bobagens. O problema se agrava no momento em que um pseudo-repórter, ao entrevistar um suspeito de crime, por exemplo, age como policial, ou quando determinado apresentador de um programa esportivo ou de variedades se expõe como palhaço de feira, ou achando que nós é que somos os palhaços.

A ‘verdade’, esta palavra tão mentirosa, é que estamos reféns de uma programação que beira os abismos da ignorância, que não respeita a diversidade cultural e não respeita porque não entende; para o ignorante, diante de todo o universo que ele não compreende fica mais fácil ignorar do que pensar para entender, saindo deste mundo escuro e confortável que chamamos de ignorância compulsiva.

Nossa intenção é que as pessoas saiam da confortável posição da ignorância, saiam do torpor, da demência, da comodidade, deixem de ser marionetes de uma mídia dominada pela graça gratuita, pela preguiça mental, e parem de se expor ao grotesco na televisão.

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Jornalista, pós-graduado em Jornalismo Político e Econômico, mestre em Comunicação e Cultura pela ECO/UFRJ