Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

O PSDB foi inapetente, o governo parece esfaimado

A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) que o Democratas apresentou na segunda-feira (3/12) no Supremo Tribunal Federal para impugnar a Medida Provisória que criou a TV Brasil teve o mérito de esclarecer pelo menos duas questões fundamentais:


** O DEM, ex-PFL, não se meteria sozinho nesta aventura caso não contasse com o apoio de importantes grupos privados de comunicação (eletrônicos e impressos) inconformados com a aparição de uma alternativa pública (ou semi-pública) destinada a atender ao segmento dos telespectadores insatisfeitos com os padrões da TV comercial.


** O DEM aceita a Rede Cultura, uma TV Pública (ou semi-pública) sustentada pelo governo do estado de São Paulo (PSDB), constituída em moldes exatamente iguais aos da TV Brasil e com uma audiência que esta dificilmente conquistará nos seus primeiros anos de vida.


O Democratas, portanto, não está preocupado com a qualidade da nossa TV, está preocupado com a presença deste governo nas telinhas e, evidentemente, em ganhar apoio do setor conservador da mídia. Jamais abriu o bico contra a TV Educativa ou contra a Radiobrás, os sustentáculos da primeira fase da TV Brasil. Joga-se agora contra a TV Brasil porque esta nasceu equívoca, impulsionada por cronogramas visivelmente eleitorais.


Oportunidade perdida


A montagem da TV Brasil passou ao largo de todas as discussões, de todos os seminários e de todos os fóruns sobre TV Pública nos últimos dez ou onze anos que recomendavam expressamente um entrosamento entre as emissoras e redes existentes, públicas, culturais ou educativas. O bom senso e a experiência não recomendam a tábula rasa. Na gênese da TV Brasil não deveriam ser desconsideradas a força, a penetração e a experiência da TV Cultura. Tê-la como aliada/parceira/associada/camarada evitaria ataques da ala delirante dos conservadores e criaria condições para uma robusta rede não-comercial e, sobretudo, não-partidarizada, a salvo de eventuais investidas antioficialistas.


O governo está apostando todas as suas fichas no próximo pleito presidencial, esquecido de que depois de 2010 poderá ser obrigado a rever a complicada engenharia para integrar a TV Educativa e a Radiobrás acrescidas eventualmente da Rede Cultura. Portanto, o governo age como grupo político com visões de curtíssimo prazo, sem qualquer estratégia de Estado. Isso é péssimo e foi exatamente o que levou o DEM a entrar com a ADIN.


Quando em 1996 o governo federal era virtual detentor das três redes de TV, o embaixador Sérgio Amaral, na qualidade de Secretário de Comunicação da Presidência da República, organizou um seminário na Rede Cultura para discutir a criação de uma rede pública de TV. O país vivia a euforia do Real e do fim da inflação, as circunstâncias eram extremamente favoráveis. Os tucanos não se animaram, talvez temerosos de uma possível reação do PFL então comandado pelo truculento senador Antonio Carlos Magalhães, ele próprio um dos coronéis eletrônicos, acionista de um grupo de comunicação regional e afiliado da poderosa Rede Globo.


Aliança que não houve


Se o PSDB foi inapetente há onze anos, o PT e a base aliada agora parecem esfaimados. Foram com muita sede ao pote, faltou-lhes uma certa nonchalance, displicência superior. Franklin Martins, Teresa Cruvinel, Orlando Senna, Helena Chagas e Arnaldo Cesar Jacob são profissionais de altíssimo nível, receberam uma tarefa, vão cumpri-la. Mas a estratégia palaciana foi simplista, pedestre. A prova é o Conselho Curador da TV Brasil com as impressões digitais do presidente Lula facilmente identificáveis.


Apesar de apoiada pelo governo federal, a TV Brasil parece frágil, solitária, conseguiu ser ameaçada por duas ex-diretoras da TV Educativa (Acerp) que deveriam ter sido dispensadas no início do processo, quando começou a fusão. Agora são exaltadas pela mídia privatista apenas para criar confusão (ver ‘Festas sem sal, sem açúcar‘).


O DEM não ousaria contestar o governo de São Paulo, o logotipo da TV Brasil deveria estar presente hoje em alguns programas da TV Cultura como co-produção formal ou associação. Segundo os manuais, as grandes revoluções devem começar com alianças. Foi um erro esquecer-se de São Paulo.