O “Zorra” sacrificou o “Total”, os bordões e os cenários para se renovar. Conseguiu, escorado em fenômenos da internet –dos filtros de Instagram ao “Porta dos Fundos”.
Vítima da queda progressiva de audiência, como quase toda a grade noturna da Globo, e do desgaste de 15 anos no ar, o programa foi colocado nas mãos de Marcius Melhem e Maurício Farias, que com Marcelo Adnet criaram o “Tá no Ar”. Humorístico mais original do canal desde “TV Pirata”, ele aparece diluído no novo “Zorra”.
Mais que um chazinho de “Tá no Ar” com internet, o “Zorra” é “um programa sobre a vida real”, como se apresentou já no primeiro episódio. Nas locações e nas roupas comuns, sim, mas sobretudo no que há de mais irritante e dramático na rotina.
Refina, assim, riquezas naturais da burocracia brasileira: a “piada pronta”, a ideia de um lugar “que não é para principiantes” e onde “contra argumentos não há fatos”.
No país em que se discutem os assaltos a faca, a ficção do “Zorra” entrega um “aplicativo do assalto”. Em quadro com Luís Miranda e Débora Lamm, a ideia é usar o aplicativo, à moda dos de táxi, para pedir e avaliar os roubos com uma paradoxal margem de segurança.
No sábado (23), a violência ficou a cargo dos caixas eletrônicos. Não as explosões empreendidas por bandidos para amealhar cédulas, mas a gincana humilhante que os correntistas precisam vencer para sacar dinheiro no país do estelionato.
A oferta cara de pau da “garantia estendida”, o mau atendimento das operadoras de TV paga e outros itens da tragicomédia nacional servem de combustível à atração, nas mãos de bons comediantes.
O “Zorra” livra veteranos como Paulo Silvino e Agildo Ribeiro de frases repetidas e trocadilhos sexuais. Em contrapartida, Dani Calabresa, um dos nomes da renovação, faz uma dona de cantina que reedita Nair Bello, ícone do velho “Zorra Total”.
Assim como na vida real, nem tudo é novidade.
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Alexandra Moraes, da Folha de S.Paulo